Quem fica protegido com a nacionalização do Novo Banco? A banca

  • Margarida Peixoto
  • 11 Janeiro 2017

Há pelo menos uma parte que fica mais protegida com a nacionalização do Novo Banco: o sistema financeiro. Já os contribuintes, ficam na incerteza.

Pensava que a nacionalização do Novo Banco era uma forma de proteger os contribuintes? Guess what: quem fica, de certeza, protegido são os bancos.

Perante os contornos daquela que tem vindo a ser considerada como a melhor proposta para a compra do Novo Banco — a da Lone Star –, surgiu em Portugal um novo debate: e se o Governo optasse por nacionalizar a instituição financeira?

Os argumentos têm sido debatidos no espaço público com uma organização que nem sempre é a habitual. Embora haja uma tendência para os agentes do espetro político da esquerda se posicionarem a favor da nacionalização, enquanto os da direita têm contestado esta opção, a divisão não tem sido assim tão clara. Manuela Ferreira Leite, por exemplo, já defendeu que é melhor escolher a menos má de duas más opções, defendendo que as propostas de venda atuais são más.

Para avaliar os impactos de uma nacionalização, e a quem é que ela protege, com diversos graus de certeza, é primeiro necessário clarificar o ponto de situação atual do Novo Banco.

De quem é o Novo Banco?

O Novo Banco é detido pelo Fundo de Resolução, que faz parte da esfera das administrações públicas — é uma entidade que, para efeitos contabilísticos, entra para o défice. Contudo, o Fundo de Resolução é uma entidade exclusivamente financiada por um tipo de contribuintes: os bancos. São eles quem têm a obrigação de fazer entregas periódicas de contribuições para sustentar o Fundo.

É verdade que o Fundo também tem dinheiro público: pediu um empréstimo ao Estado de 3,9 mil milhões de euros para comprar o Novo Banco. Mas, por enquanto, não deixa de ser um empréstimo que, em última instância, quem tem de pagar são os contribuintes do Fundo (os bancos), ao longo do tempo.

Quanto oferece a Lone Star?

O que diz a Lone Star — o comprador com a melhor proposta, de acordo com o Banco de Portugal — sobre o valor do Novo Banco? Diz que vale 750 milhões de euros, assumindo outros 750 milhões de euros de aumento de capital, mas exigindo uma garantia pública em torno de 2,5 mil milhões de euros para cobrir o risco dos ativos do side bank (que reúne os ativos não ligados à atividade core do banco, avaliados no balanço por nove mil milhões de euros).

Se o Governo aceitasse esta proposta — o que não parece que vá acontecer, a julgar pelas últimas declarações do ministro das Finanças, Mário Centeno, que recusa assumir riscos para as contas públicas — os bancos viam o Fundo de Resolução registar a depreciação de um ativo. O Novo Banco, pelo qual o Fundo pagou os tais 4,9 mil milhões de euros, teria agora um encaixe de apenas 750 milhões de euros. Ao que o ECO apurou, embora não seja uma indicação definitiva, em princípio esta venda não teria impactos no défice.

Mas os bancos teriam de continuar a fazer entregas de contribuições ao Fundo, para pagar o empréstimo pedido ao Estado, durante mais tempo. É como se tivessem tido um acidente com o carro que compraram a crédito: têm de pagar o crédito, mesmo que o carro já não tenha arranjo e por isso só o tenham conseguido vender como salvado.

Nesta hipótese, o Fundo de Resolução e, por consequência, os bancos, liberta-se da maior parte do risco dos ativos do side bank. Quem gere este pacote é a Lone Star e quem entra como fiador é o Estado — os custos que resultarem daqui são distribuídos por todos os contribuintes (bancos incluídos), e não apenas pelos contribuintes do sistema financeiro.

Caso o Governo encontre um comprador que não exija garantias públicas, os bancos ficam prejudicados: o valor obtido com a venda será, à partida, mais baixo — é o comprador quem assume o risco sozinho. O Estado consegue a defesa dos contribuintes como um todo, já o Fundo de Resolução vê o seu ativo desvalorizar ainda mais. Como os bancos são os contribuintes únicos do Fundo de Resolução, são eles que assumem esta perda, prolongando no tempo as entregas de contribuições que têm de continuar a fazer para saldar o empréstimo ao Estado.

E se o Governo nacionalizar o banco?

Nesta hipótese, que está por certificar que é viável, tendo em conta os acordos assumidos com a Comissão Europeia, os bancos ganham de duas formas:

  1. Recebem um valor pela venda do Novo Banco ao acionista Estado. Se a oferta dos 750 milhões de euros for considerada insuficiente pelo Governo, politicamente será difícil sustentar uma venda por um valor mais baixo do que este. O Estado também pode perdoar parte do empréstimo que fez ao Novo Banco, mas o efeito prático é o mesmo.
  2. Libertam-se do risco do side bank. É o Estado quem assume esse risco, neste momento avaliado pela Lone Star em 2,5 mil milhões de euros.

Ou seja, com a opção da nacionalização, os bancos ficam com a garantia de estarem mais protegidos. O risco é diluído por todos os contribuintes e o valor da venda será, pelo menos, equivalente ao da melhor proposta.

Já para os contribuintes, as perdas não são certas, mas os ganhos também não. Nacionalizar o Novo Banco é manter a incerteza. É apostar que o Estado consegue fazer melhor do que a Lone Star. Consegue reestruturar a instituição financeira de modo a não ter de investir capital periodicamente, consegue colocá-la a dar lucros e consegue retirar mais valor do side bank do que a Apollo diz que é possível.

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