Novo Banco: Comissão Europeia passa a bola a Portugal
Para bom entendedor, meia palavra basta. Perante a hipótese de voltar à mesa das negociações para encontrar alternativas à venda do Novo Banco, a Comissão diz que cabe a Portugal vender a instituição.
Em Portugal, debatem-se cenários alternativos à venda do Novo Banco. Ninguém quer aceitar uma má proposta, o Governo garante que não aceita custos para os contribuintes, várias vozes — da esquerda à direita — pedem a nacionalização do banco, e Centeno garante que nenhuma solução está excluída. Qualquer alternativa a uma venda aberta, concluída até agosto, depende do aval de Bruxelas. Mas a Comissão Europeia passa a bola a Portugal.
“O processo de venda está em curso. Ele é gerido pelas autoridades portuguesas. A Comissão não tem mais comentários a fazer, neste momento”, respondeu Ricardo Cardoso, porta-voz da Comissão para a pasta da Concorrência.
Para bom entendedor, meia palavra basta: perante questões sobre a hipótese de se renegociarem as condições do acordo fechado com Bruxelas, em agosto de 2014, e revisto em dezembro de 2015 com uma extensão de prazo, a Comissão responde que cabe a Portugal vender o banco.
O processo de venda está em curso. Ele é gerido pelas autoridades portuguesas. A Comissão não tem mais comentários a fazer, neste momento.
Contactado, o Banco Central Europeu recusou fazer quaisquer comentários, explicando que não comenta casos concretos.
Quando a resolução do Banco Espírito Santo foi decidida, Portugal firmou um compromisso com a Comissão Europeia que previu a venda dos ativos do banco de transição (o Novo Banco) através de um concurso aberto, não discriminatório e competitivo. Este acordo previa também que, caso essa venda não acontecesse dentro do prazo definido, os ativos seriam progressivamente liquidados.
Nesse verão de 2014, o prazo dado ao Governo — liderado, na altura, por Pedro Passos Coelho e com Maria Luís Albuquerque à frente da pasta das Finanças — foram dois anos. Mas em dezembro de 2015, já com António Costa na liderança do Executivo e Mário Centeno como ministro das Finanças, as autoridades nacionais pediram um alargamento do prazo.
A Comissão cedeu, alargando o prazo por mais um ano, para agosto de 2017 — um deadline entendido como suficiente para arrancar com um novo processo de venda.
O prazo para vender os bancos de transição é definido de forma casuística, e não por uma regra comum a todos os Estados-membros. Ou seja: o facto de serem aprovadas extensões maiores ou menores para bancos de outros países não quer dizer que Portugal beneficie da mesma avaliação. Aliás, o novo prazo pode até nem ser tornado público.
Por exemplo, a 7 de dezembro de 2016 a Comissão autorizou a extensão do prazo de venda para quatro pequenos bancos de transição italianos — Nuova Banca Marche, Nuova Banca Etruria, Nuova Carife e Nuova Carichieti. Mas o novo prazo para a venda não foi revelado: “Para proteger a eficácia do processo de venda, os calendários são confidenciais”, explicou a Comissão, em comunicado.
Regras europeias permitem nacionalização temporária
A questão é levantada por quem se opõe à nacionalização do Novo Banco: o Governo até pode decidir que quer mais um banco público, mas as regras europeias deixam? Ao ECO, Luís Mira Amaral diz que a intenção de nacionalizar o banco é “um disparate completo”, desde logo porque “face à legislação europeia da resolução de bancos, isso não é possível, dado que, se se configura um banco de transição, ele tem de ser vendido ou liquidado”.
A diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu, que estabelece as normas “para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento”, dá razão ao antigo ministro, mas só em parte. Se, por um lado, o documento determina que o objetivo é sempre vender um banco de transição, prevê também a possibilidade de uma nacionalização temporária, sob certas condições.
Quanto àquele que deve ser o destino primeiro de um banco de transição (que é a definição em que se enquadra o Novo Banco), o diploma é claro: serve para assegurar o serviço aos clientes do banco falido e, quando as condições o permitirem, deve ser posto no mercado ou liquidado.
"Na qualidade de instituição total ou parcialmente detida por uma ou mais autoridades públicas ou controlada pela autoridade de resolução, uma instituição de transição terá por principal objetivo garantir a continuidade da prestação dos serviços financeiros essenciais aos clientes da instituição em situação de insolvência e das suas atividades financeiras essenciais. A instituição de transição deverá ser administrada de uma forma que viabilize a continuidade das suas atividades e deverá voltar a ser colocada no mercado quando as condições o permitirem e dentro do prazo previsto na presente diretiva, ou ser liquidada, se não for viável.”
O documento vai mais longe e determina que devem ser os outros bancos, e não o Estado, a garantir a estabilidade de uma instituição de transição.
"Existem circunstâncias em que a eficácia dos instrumentos de resolução aplicados poderá depender da disponibilidade de financiamento de curto prazo para uma instituição ou para uma instituição de transição, do fornecimento de garantias aos potenciais adquirentes ou da provisão de capital para a instituição de transição. Sem prejuízo do papel dos bancos centrais no fornecimento de liquidez ao sistema financeiro, mesmo em períodos de tensão, é importante que os Estados-membros estabeleçam mecanismos de financiamento para evitar que os fundos necessários para esse efeito provenham dos orçamentos nacionais. Deve ser o setor financeiro, no seu conjunto, a financiar a estabilização do sistema financeiro.”
Mas há uma ressalva importante, que poderá ser invocada pelo Governo. É o Artigo 58º, que prevê a possibilidade de um Governo colocar uma instituição de transição sob “propriedade pública temporária”. No fundo, uma nacionalização temporária pode ser uma opção de último recurso, desde que os contribuintes sejam protegidos e recompensados quando o banco voltar ao “equilíbrio financeiro”.
"A resolução de uma instituição que garanta a continuidade das suas atividades pode envolver, em último recurso, instrumentos públicos de estabilização financeira, incluindo o recurso à medida de propriedade pública temporária. Por conseguinte, é essencial estruturar os poderes de resolução e os mecanismos de financiamento da resolução de modo a que os contribuintes sejam os beneficiários dos excedentes que possam resultar da reestruturação de uma instituição recolocada em situação de equilíbrio financeiro pelas autoridades. A responsabilidade e os riscos assumidos deverão ser recompensados.”
Há uma condição para que esta nacionalização seja permitida: tem mesmo de ser temporária.
"Os Estados-membros asseguram que as instituições ou entidades sujeitas ao instrumento da propriedade pública temporária sejam geridas de forma comercial e profissional e sejam transferidas para o setor privado logo que as circunstâncias comerciais e financeiras o permitam.”
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