Editorial

Marcelo deve pressionar Costa, Catarina e Jerónimo (e deixar Rio em paz)

À medida que se aproxima a apresentação do Orçamento do Estado para 2021, Marcelo Rebelo de Sousa exige a sua aprovação, mas está a bater à porta errada.

Marcelo Rebelo de Sousa dramatizou nos últimos dias a aprovação do Orçamento do Estado para 2021, antecipando assim o que se pressente, a dificuldade de António Costa em convencer Catarina Martins a deixar passar a proposta orçamental para o próximo ano (porque o PCP já se auto-excluiu). E de repente, o Presidente que anda há cinco anos a pedir uma oposição e uma alternativa quer agora que seja Rui Rio a salvar o país, afogando o PSD.

Sim, já sabemos qual vai ser a letra desta música: Com a segunda vaga da pandemia a acelerar e a crise social a aprofundar-se, o presidente do PSD tem de ser responsável, e pensar primeiro no país e depois no partido e na sua própria liderança. E o país ficará eternamente agradecido (mas nunca lhe dará a possibilidade de governar) por salvar o país, ou melhor, Costa e Catarina.

Neste fase, a semanas da apresentação do orçamento, marcado para 12 de outubro, e mais ainda da aprovação final global do orçamento, em meados de novembro. Marcelo Rebelo de Sousa pode dramatizar uma eventual crise política, até porque não pode haver eleições nos seis meses seguintes às eleições presidenciais, mas está a bater à porta errada.

Quem tem de ser pressionado a garantir a aprovação do orçamento é António Costa, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa. O primeiro-ministro é o primeiro responsável pela aprovação do orçamento, foi com esta configuração política que Costa decidiu chegar ao Governo em 2015 e, depois, foi Costa que negociou sucessivamente com a esquerda. É legítimo, as últimas eleições reforçaram aliás essa legitimidade, mas se era legítimo quando o contexto era favorável, e Costa, Catarina e Jerónimo tinham o dinheiro e os incentivos para fazerem acordos mais ou menos formais, devem assumir essa responsabilidade agora que o contexto económico é bem diferente.

O que se está a assistir é a mais uma dança de hipocrisia do Bloco de Esquerda e do PCP, que, agora, por razões puramente táticas, medem que tipo de apoio estão disponíveis para dar. Também é legítimo, até porque António Costa teve a oportunidade de renovar a geringonça, pelo menos com o Bloco, e não quis. Achou-se confortável em cima da votação que teve em outubro do ano passado.

O que fica claro é que têm de ser os dois, ou os três, a entenderem-se, ou a assumirem a responsabilidade de que não conseguem governar em situação de crise. E a levarem o país para uma crise política. Haverá uma enorme pressão sobre Rui Rio, como já se percebeu das declarações de Marcelo, que até recuperou o que fez quando foi líder do PSD. Mas os tempos são muito diferentes e o PSD, se quer mesmo ser oposição, e sobretudo alternativa, não pode dar sinais de que estará disponível para ser uma muleta do PS quando Costa não consegue negociar com o BE e o PCP.

Dentro de alguns dias, o PSD vai apresentar a sua própria proposta de Plano de Recuperação e Resiliência, será uma oportunidade para marcar uma diferença face a um plano do Governo que reforça a estatização da economia. Ora, se em simultâneo estiver disponível para dar a mão a Costa, Rui Rio estará a dizer aos eleitores que podem votar no PS à vontade, porque estarão a votar no líder do centrão, que governa como quer e com quem quer, à esquerda e à direita. Pior, o centrão servirá para dar força aos extremos, o BE e o Chega. Depois, queixem-se e digam que o sistema fica em causa por causa de Ventura. Assim, ficará em causa, sim, mas por responsabilidade de Marcelo, Costa e Rio.

É claro que Marcelo teria uma vida mais difícil, seria chamado a tomar decisões difíceis, Portugal tem a presidência portuguesa no primeiro semestre de 2021 e um próximo ano que será de retoma lenta da economia, mas ainda com um agravamento do desemprego, e ficaria com um governo limitado até às eleições. Mas ser Presidente da República não se pode esgotar em beijinhos e selfies.

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