As novas Centrais Elétricas Virtuais e o Nobel da Economia
As Centrais Elétricas Virtuais são a próxima revolução no setor elétrico e terão de suportar a descarbonização da sociedade. E os leilões passarão a determinar os preços.
Quando pensamos no futuro, quando pensamos em todas as variáveis que estão em transformação para garantir a neutralidade carbónica, quando pensamos numa rede global elétrica, composta de centenas de milhar de centros produtores renováveis, geridos por empresas, agentes e famílias, só podemos pensar que o sistema de leilões de energia elétrica se está a aproximar do consumidor final. Com a expansão do sistema de leilões, a importância dos preços tarifados diminuirá para parte crescente da sociedade.
Falamos de leilões para atribuição de licenças de instalação de parques fotovoltaicos. É isso, com certeza que sim, mas também imensamente mais do que isso. É a lógica onde se inserem esses parques leiloados e os muitos outros pontos de produção, são as Centrais Elétricas Virtuais.
Porque as Centrais Elétricas Virtuais são a revolução no “management” do sistema tecnológico que vai suportar a descarbonização da sociedade e ligar a bateria do automóvel, o painel e o parque entre si, e garantir que temos luz à noite, e conforto quando faz frio. Se queremos descarbonizar, temos de desenvolver Centrais Elétricas Virtuais. Nós temos de antecipar essa futura configuração, absolutamente radical, do que vai ser a importância das centrais Virtuais. Nessa configuração já não há meia dúzia de centrais âncora que satisfazem 90% da produção! Nem vai ser uma centena de operadores. Ao contrário, ninguém domina a produção. Ou melhor, o vento e sol dominam a produção e nós, cidadãos e empresas, dominaremos a captura dessa energia e o seu consumo, na exata medida do engenho que tivermos e das Centrais Virtuais que montarmos.
O sol e o vento têm tanta energia que nós, se tivermos ciência, engenharia e boas regras, podemos produzir muito mais do que aquilo que precisamos para o nosso consumo. O excedente da produção será lucro. Lucro de rendimentos, para toda a sociedade, lucro climático, para todos. (embora também nos exponha a um grande risco ambiental e visual que deve ser intransigentemente acautelado). Mas lucro, sim, que podemos reinvestir.
Porém a pega não é de caras. Se as nossas necessidades de consumo são diferentes dos humores do sol e do vento, e se quisermos enriquecer explorando todos os filões, temos um sofisticado problema para resolver. Quando mais precisamos de energia, é quando o sol e o vento escasseiam. O estado, as empresas e toda a sociedade devem definir com rapidez, e unicidade, quais são as regras para resolver o problema dos humores do sol e do vento.
É necessário aplicar a regra da inovação a todos os aspetos da descarbonização. O estado, as empresas, os cidadãos devem concordar em inovar no hidrogénio verde, no hidrogénio azul, no sistema de preços, nos impostos, no desenho do mercado, nos leilões, na contribuição obrigatória para o aumento da biodiversidade, nas compensações sociais, tudo o que tenha a ver com neutralidade carbónica e bem-estar.
Insisto que precisamos de inovar no sistema de preços e no propósito social que determina as regras de mercado. Porque de facto, no novo mercado, em que vizinhos, grandes e pequenos, trocam energia entre si, em que o consumidor escolhe a hora a que consome em função, certamente, de um preço de troca variável, que sistema de preços pode vigorar? Alguém imagina que seja o sistema antigo?
Que sistema de preços vai estimular a descarbonização? Sim, esta questão é de extrema importância porque se o sistema de preços funcionar mal, o nosso caminho ambicioso para a neutralidade carbónica complica-se, emperra e retira-nos vantagem competitiva. Sem regras claras, não se fazem boas contas ao investimento.
Felizmente, o prémio Nobel da Economia foi atribuído à teoria dos leilões e à otimização de preços através de diferentes métodos de negociação. Até se poderia pensar que o júri do Nobel decidiu estando a pensar na transformação energética global. Pode bem ser que tenha sido esse o caso. Porque um dos principais eixos de investigação e teste da teoria dos leilões, elaborada por Milgrom e Wilson, é a formação de preços através de leilões nos mercados da eletricidade. Qual é o pano de fundo? A geração elétrica distribuída, organizada em agrupamentos dinâmicos, digitalmente ligada. Em linguagem de eletricista: o assunto das Centrais Elétricas Virtuais.
Sobre Centrais Elétricas Virtuais
https://en.wikipedia.org/wiki/Virtual_power_plant
Sobre o Nobel da Economia 2020
https://www.nobelprize.org/prizes/economic-sciences/2020/press-release/
Nota do autor:
O autor exerce a sua atividade profissional na EDP na direção corporativa de sustentabilidade. Importa evidenciar esta circunstância para que o leitor esteja permanentemente ciente dela quando interpreta a opinião manifestada. No entanto, os artigos do autor não podem ser interpretados como representativos da opinião da EDP e, muito menos, como sendo a opinião da EDP.
Na elaboração dos seus artigos, o autor:
1 – Visa contribuir para o debate e a reflexão sobre os temas da Sustentabilidade, nas suas três dimensões (governação, ambiental e social), dando prioridade à perspetiva global e à abordagem estratégica.
2 – Inibe-se de manifestar opinião sobre temas energéticos e organizacionais que sejam específicos da EDP, isto é, que não sejam notoriamente comuns às empresas do setor energético. Incluindo qualquer matéria reservada a que, pela natureza das suas funções profissionais, tenha acesso.”
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