Marisa Matias: BE fez o que “tinha de ser feito” mas não há corte de relações com PS
Com a garantia de que o BE continuará a falar e a negociar, Marisa Matias ‘atira a bola’ para o lado dos socialistas.
A candidata presidencial Marisa Matias considera que o voto contra do BE no orçamento era o que “tinha de ser feito”, mas recusa um corte de relações com o PS, apontando à continuidade de diálogo entre os partidos.
Em entrevista à agência Lusa, a recandidata apoiada pelo BE às eleições presidenciais de 24 de janeiro foi questionada sobre o voto contra do partido no Orçamento do Estado para 2021 (OE2021) e os efeitos que antecipa nos seus resultados eleitorais, numa altura em que as sondagens indicam uma queda do partido.
Como dirigente do BE e apoiante dessa decisão nos órgãos do partido, Marisa Matias afirma que não foge à questão, explicando que o OE2021 “fica muito aquém” das necessidades, é claramente “um orçamento fora de tempo”, que não foi feito “para tempos de pandemia porque não traz a proteção necessária” e é insuficiente nesta resposta.
“Eu acho que fizemos – e digo fizemos porque fiz parte disso – aquilo que tinha de ser feito no sentido de que, num momento em que as respostas à crise não estão à altura, é preciso lutar e exigir respostas à altura”, assume. No entanto, para a eurodeputada, “isso não significa que haja um corte de relações” com os socialistas e muito menos determina que “o BE deixe de falar ou de negociar com o Partido Socialista”.
“Isto significa é que os termos estão definidos, as cartas estão na mesa e infelizmente creio que a realidade nos vai dar razão mais rápido do que aquilo que seria desejado”, antecipa. Com a garantia de que o BE continuará a falar e a negociar, Marisa Matias ‘atira a bola’ para o lado dos socialistas: “haja vontade também do lado do Partido Socialista para poder acolher algumas dessas propostas”.
“Em relação ao resto acho que as pessoas percebem perfeitamente, sinceramente acho que sim”, responde em relação à compreensão dos portugueses sobre este voto contra. A candidata presidencial recorda que o BE foi “o partido que logo a seguir às eleições legislativas se disponibilizou para que continuasse a haver acordo escrito e para que a geringonça tivesse uma continuidade”, o que na altura foi rejeitado pelo PS. “Quem recusou a existência da geringonça não foi o Bloco de Esquerda, foi o Partido Socialista”, clarifica.
O BE, lembra Marisa Matias, “não falhou à responsabilidade de aprovar o Orçamento Suplementar que foi necessário este ano” devido à pandemia, criticando que o OE2021 aprovado não traduza o investimento necessário no Serviço Nacional de Saúde nem na proteção do emprego.
Seria lamentável maioria de centro-esquerda sem representação nas eleições
A candidata presidencial apoiada pelo BE, Marisa Matias, considera “lamentável” que num país com uma maioria de centro-esquerda esta “não se faça representar” nas eleições para Belém, acusando o PS de se ter demitido desse combate.
“Seria lamentável que um país que tem ainda uma maioria – e espero que ainda por mais tempo – de centro-esquerda na Assembleia da República, [esta] não se faça representar devidamente nas eleições presidenciais”, afirma, em entrevista à agência Lusa, a recandidata apoiada pelo BE às eleições de 24 de janeiro.
“O Partido Socialista demitiu-se de fazer este combate do ponto de vista formal”, declara a eurodeputada, para quem no momento atual não se vislumbra, no campo da esquerda, nenhuma candidatura “que seja capaz de reunir um consenso tão alargado que se justifique a ausência das outras candidaturas”.
Segundo Marisa Matias, “estas candidaturas são importantes do ponto de vista da democracia” e “representam o espaço da esquerda, na sua diversidade”. O país está a viver “um momento muito complicado”, avisa a dirigente do BE, pelo que “faz falta essa resposta de esquerda à crise, também neste espaço, que é o espaço para a Presidência da República”.
Reiterando, neste quadro, a importância de uma candidatura com um “programa claro e um programa de esquerda na defesa dos serviços públicos”, Marisa Matias refere que isso não a impediu de “refletir muito sobre a [sua própria] candidatura”, mas sem “hesitação”. “A decisão foi muito pensada, é óbvio que ninguém se apresenta uma candidatura desta natureza sem refletir muito sobre ela antes. Mas a decisão foi tomada, não pensei voltar atrás”, diz Marisa Matias.
De acordo com a candidata presidencial, a política tornou-se mais exigente devido à crise, “os momentos são difíceis, mas isso não significa que deixou de haver espaço para o debate político, pelo contrário, é mais exigente, mas é necessário e tão necessário como antes”.
Questionada sobre os pontos de contacto com os outros candidatos da esquerda – a socialista Ana Gomes e o comunista João Ferreira – a bloquista afirma que todos têm “margens interessantes de convergência e divergência”. “Nós não estamos numa situação em que se possa falar de que uma candidatura sozinha seria mais forte do que estas candidaturas (…) a soma das partes chega a mais gente e é mais representativa do que do que se fosse apenas uma candidatura eleitoral”, justifica.
Para Marisa Matias, o facto de haver várias candidaturas até é benéfico, porque “mobiliza mais eleitorado de esquerda, do que uma candidatura de alguém” que seja consensual, o que não acontece “nem mesmo a própria Ana Gomes” dentro do PS.
Em relação à socialista, a candidata presidencial refere a amizade e o trabalho conjunto em muitos temas no Parlamento Europeu, como a corrupção, mas também as divergências relativas ao Orçamento do Estado e também ao ‘offshore’ da Madeira. Quanto a João Ferreira, Marisa Matias salienta a diferença em relação à visão do mundo, “nomeadamente no que diz respeito à política internacional”.
Nesta entrevista, a eurodeputada volta a afirmar-se como sendo social-democrata, que trabalha “todos os dias” e defende “as conquistas históricas da social-democracia”, mas admite perceber algumas das razões pelas quais essa sua afirmação pode provocar confusão no eleitorado. “Não nos podemos esquecer que estamos num país, que tem esta coisa única no mundo que é ter um partido de direita que se chama social-democrata”, conclui.
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