Corretoras low cost ganham clientes portugueses com fenómeno GameStop
Supervisor dos mercados diz que a supervisão das plataformas eletrónicas de trading cabe às autoridades do país onde estão domiciliadas.
As corretoras low cost internacionais ganharam clientes (não só, mas também) em Portugal graças ao fenómeno GameStop. A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) diz que a responsabilidade de supervisão é das autoridades dos países onde estão domiciliados os intermediários financeiros.
“Assistimos a um aumento de novos utilizadores e da atividade nos últimos dias (tanto em Portugal como a nível Europeu”, explica a DeGiro, ao ECO. A plataforma de trading é — tal como a Robinhood — conhecida pelos baixos custos de comissões, que tem atraído especialmente o público mais jovem. Apesar de não divulgar dados por país, a DeGiro fechou o ano passado com 1,25 milhões de clientes na Europa.
As plataformas low cost e a rede social Reddit estiveram no centro da história dos pequenos investidores vs Wall Street. Na semana passada, num movimento concertado no fórum Wall Street Bets, investidores de retalho levaram a empresa de jogos de vídeos norte-americana a valorizar 1.500%. A vertente “justiceira” do gesto recebeu força adicional quando dois grandes fundos que tinham posições curtas admitiram perdas significativas.
"A Interactive Brokers, que tem sede nos EUA, está a registar neste momento cerca de 80% dos seus novos clientes fora dos EUA. Para responder a este crescimento, abrimos entidades na Hungria, Irlanda (também em parte devido ao Brexit) e Singapura no ano passado.”
Se foi revolta política, uma brincadeira nas redes sociais ou a expectativa de ganhar dinheiro a impulsionar os movimentos não se sabe, mas é consensual o papel das plataformas de trading low cost, como a Robinhood, a Ameritrade ou a Interactive Brokers. A Robinhood não está disponível para clientes em Portugal e a Ameritrade não respondeu às questões do ECO. No entanto, a Interactive Brokers confirma o mesmo que a DeGiro.
“Vimos um acentuado aumento no trading“, explica fonte oficial da Interactive Brokers. Apesar de a empresa não disponibilizar dados por país, indica que registou “um aumento recorde no número de clientes este ano”. A 31 de janeiro, a corretora tinha 1.189 milhões de contas de clientes, mais 69% do que há um ano e 11% que há um mês. Considerando apenas a semana do fenómeno GameStop, a média diária de trades disparou 223% para uma média diária de quase 3,3 milhões de negociações.
“A Interactive Brokers, que tem sede nos EUA, está a registar neste momento cerca de 80% dos seus novos clientes fora dos EUA. Para responder a este crescimento, abrimos entidades na Hungria, Irlanda (também em parte devido ao Brexit) e Singapura no ano passado”, acrescenta. A DeGiro também não está registada em Portugal.
"Tanto a nível nacional como internacional, o impacto foi forte. Embora o crescimento do mercado acionista já venha a verificar há vários meses/anos, tendo em conta que vivemos o maior bull run de todos os tempos, alimentado pelas políticas expansionistas dos bancos centrais a nível mundial para suportar a economia.”
Caso diferente é o da polaca XTB, que está registada e tem escritório em Portugal, mas que considera estas plataformas como concorrentes: no caso da DeGiro concorrente direta já que oferecem ambas apenas de ações, enquanto a Interactive Brokers oferece também outros produtos como futuros, opções, produtos estruturados ou obrigações.
“Tanto a nível nacional como internacional, o impacto foi forte“, explica a XTB sobre a procura de novos clientes pelo trading. “Embora o crescimento do mercado acionista já venha a verificar há vários meses/anos, tendo em conta que vivemos o maior bull run de todos os tempos, alimentado pelas políticas expansionistas dos bancos centrais a nível mundial para suportar a economia”, sublinha.
CMVM não tem elementos para “avaliar a legitimidade da conduta”
Vários supervisores — especialmente nos EUA, mas não só — mostraram preocupação em relação ao fenómeno. Em Portugal, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários garante que “está a acompanhar atentamente” que, “até agora, ocorreu num contexto não sujeito à sua supervisão”. Tendo os factos ocorrido fora da jurisdição portuguesa, “a CMVM não dispõe de elementos suficientes que permitam avaliar a legitimidade da conduta das partes envolvidas”.
Quanto ao facto de plataformas associadas à situação captarem clientes em Portugal, o supervisor liderado por Gabriela Figueiredo Dias diz que “a responsabilidade de supervisão dos intermediários financeiros que gerem plataformas eletrónicas de receção de ordens cabe em primeira linha às autoridades de supervisão do país onde está domiciliado o intermediário financeiro detentor da plataforma”.
"Em resposta aos mais recentes desenvolvimentos, consideramos importante enfatizar que investir não é um jogo. Pode-se perder todo o investimento, mas diversificando e estando bem informado podemos assegurar que o nosso portefólio está alinhado com os ricos que queremos tomar.”
O exercício profissional de qualquer atividade de intermediação financeira em instrumentos financeiros, em Portugal, encontra-se reservado às entidades para tal habilitadas junto da CMVM. Sempre que é detetada a atuação, junto de investidores residentes, de entidades que não estão habilitadas a exercer atividades de intermediação financeira em Portugal, ou outras atividades sujeitas a autorização da CMVM, é emitido um alerta ao mercado.
Em 2020, a CMVM emitiu 45 alertas sobre entidades não autorizadas para a prestação de serviços e atividades de intermediação financeira, mas nenhum sobre a DeGiro ou a Interactive Brokers. “A utilização de plataformas de negociação eletrónica requer que os seus utilizadores tenham conhecimentos sobre o mercado de capitais, o respetivo enquadramento regulatório, e sobre os mecanismos de funcionamento subjacentes aos instrumentos financeiros em que investem – tais como a formação de preços, a aplicabilidade de margens, o nível de comissões e os riscos envolvidos”, sublinha a CMVM.
"Independentemente das condições de mercado, defendemos o investimento responsável. Em condições marcadamente voláteis, temos incitado os nossos utilizadores a manterem-se nos básicos do investimento: diversificar e apenas investir em mercados e instrumentos com os quais se sintam familiarizados.”
A DeGiro e a Revolut (onde também é possível a clientes portugueses negociarem ações), por exemplo, alertaram os investidores para a elevada volatilidade no mercado nos dias de maiores movimentos das ações da GameStop, AMC Entertainment Holdings ou Blackberry, mas — ao contrário do que aconteceu com a Robinhood — a negociação continuou a ser possível.
“Desde a criação da DeGiro que sempre defendemos que os investidores privados devem ter o mesmo acesso rápido ao mercado de investimentos e por isso ter capacidade de investir o seu dinheiro a longo prazo”, diz fonte oficial da plataforma, apontando as opções de informação e edução financeira disponíveis. Garante querer assegurar que os clientes tomam decisões bem informadas e adequadas aos seus conhecimentos e experiência. “Em resposta aos mais recentes desenvolvimentos, consideramos importante enfatizar que investir não é um jogo. Pode-se perder todo o investimento, mas diversificando e estando bem informado podemos assegurar que o nosso portefólio está alinhado com os ricos que queremos tomar”.
A Revolut não respondeu às questões do ECO sobre o crescimento do número de clientes em Portugal. A eToro também não, referindo apenas o foco na segurança. “Independentemente das condições de mercado, defendemos o investimento responsável. Em condições marcadamente voláteis, temos incitado os nossos utilizadores a manterem-se nos básicos do investimento: diversificar e apenas investir em mercados e instrumentos com os quais se sintam familiarizados”, disse a eToro.
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