Eficiência energética: Reduzir a pegada carbónica é uma exigência dos “próprios clientes”
Quem o garante é a APESE e a Têxteis J.F. Almeida, cujos clientes H&M e Zara exigem certificados com critérios de sustentabilidade. "Temos uma pontuação de 60%, mas no têxtil a média é de 37%".
Se outrora o conceito de eficiência energética para as empresas estava focado na redução da fatura ao final do mês, hoje já não é assim. Trabalhar a vertente energética do ponto de vista da sustentabilidade e da redução da pegada carbónica é hoje uma exigência não só política, como social e dos próprios clientes.
“Diria que pesa tanto na balança como a própria eficiência energética” e “é cada vez mais importante para a competitividade das empresas e indústrias”. É esta a visão de Jorge Borges de Araújo, presidente da APESE – Associação Portuguesa das Empresas de Serviços de Energia, partilhada na 2ª EcoTalk, um ciclo de conversas em torno da sustentabilidade e da economia verde, organizado pelo ECO em parceria com o BBVA, e que juntou também João Almeida, administrador da Têxteis J.F. Almeida.
O tema da eficiência energética é transversal a todos os setores, mas traz outros desafios quando falamos do têxtil. Ao olhar para a eficiência energética e a sustentabilidade neste setor, “há três tópicos a abordar”: os processos e a sua otimização; o produto e a inovação; e o investimento em equipamentos, enumera João Almeida. A empresa da qual faz parte, que abrange desde a fiação, tecelagem, tinturaria, até à logística, tem feito um grande investimento na otimização dos processos. “Há nove anos, criámos uma estratégia e uma equipa para trabalhar só a eficiência energética”, conta. No departamento de tinturaria, criaram um laboratório químico para “repensar todo o processo” e baixar os custos da energia. “De 30/35% passámos para 9%”, ultrapassando, assim o objetivo que tinham para este ano de reduzir 15% nesta área, referiu o administrador.
A revisão da empresa no âmbito da eficiência energética foi feita também ao nível da iluminação, da frota, que é agora 100% elétrica, e da otimização da maquinaria através de parcerias com outras empresas.
Estamos a falar de um setor que consome inúmeros recursos diariamente. “Na J.F. Almeida gastamos 200 metros cúbicos de água por hora” no processo de tinturaria. “Isto representa 15 piscinas olímpicas”, elucida João Almeida. Foi por isso que a empresa decidiu fazer “um grande investimento na parte da separação e descarga de efluentes”, de cerca de dois milhões de euros. Adotaram um novo processo de recuperação e separação de efluentes – água quente, água limpa e água suja – que permitiu à empresa uma poupança de 2500 toneladas de CO2/ano, explicou. Além disso, “toda a água suja que coletamos, voltamos a aproveitá-la em cerca de 50%”. Para lá da economia circular, é a chamada economia azul.
Protocolo de apoio à transição energética
A J.F. Almeida é um dos beneficiários de um novo protocolo lançado pelo BBVA em parceria com a APESE, que inclui apoio no âmbito da transição energética através de assessoria especializada às empresas.
“Este é um protocolo muito importante”, refere Jorge Araújo, presidente da APESE, já que a energia “é um fator cada vez mais crítico para as empresas”, e tem de fazer parte da gestão, “não é só mais um custo”. A APESE, através dos seus membros, é um elemento que “facilita os processos” também na procura de soluções de eficiência energética.
"Já começam a aparecer lógicas associadas à inteligência artificial, inclusive para acompanhar aquilo que vai acontecer nos mercados, por exemplo, saber quando é que a energia vai estar mais cara ou barata.”
De acordo com o responsável, as indústrias têm hoje “mais capacidade de controlar os custos da energia”, graças ao “investimento em unidades de produção para o autoconsumo, por exemplo, no caso das renováveis”. Esta é uma forma alternativa de “reduzir o custo da fatura e contribuir para a estabilização do preço da energia”, explica.
O trabalho da APESE é, pois, estar “muito no terreno” e junto à tutela para identificar e melhorar as peças legislativas relacionadas a energia.
Hoje, uma das principais apostas das empresas de serviço de energia é na inovação e na digitalização, sobretudo ao nível dos “sistemas de monitorização”, explica Jorge Borges de Araújo. “Já começam a aparecer lógicas associadas à inteligência artificial, inclusive para acompanhar aquilo que vai acontecer nos mercados, por exemplo, saber quando é que a energia vai estar mais cara ou barata”.
Têxtil e sustentabilidade: uma aposta contínua
Através da parceria com o BBVA, a J.F. Almeida será auditada no âmbito da energia – ambiente, renováveis e eficiência – para saber em que pé está a pegada ecológica da empresa e o que pode fazer para melhorar.
O caminho está a ser trilhado. “Existe um certificado que os nossos clientes como H&M, Zara nos exigem”, que inclui critérios de sustentabilidade e eficiência energética, no qual “neste momento estamos com uma pontuação de 60%”, refere o administrador da empresa têxtil. E acrescenta: “parece pouco, mas não. No têxtil, a média é de 37%”.
"Ao nível da poupança da energia, se nos últimos 10 anos não tivéssemos feito nada, pagaríamos hoje mais 35/40%”
Jorge Borges Araújo confirma que a sustentabilidade é cada vez mais “um requisito do próprio cliente”, que quer “comprar a quem está a fazer investimentos” nesta área. No caso da energia, “diria que pesa tanto na balança como a própria eficiência energética [do ponto de visto dos custos]” e é “cada vez mais importante para a competitividade das empresas e das indústrias”, refere o presidente da APESE.
Durante a conversa, João Almeida revelou ainda alguns números importantes: “ao nível da poupança da energia, se nos últimos 10 anos não tivéssemos feito nada, pagaríamos hoje mais 35/40%”, e “só no ano passado, reduzimos cerca de 4 mil toneladas” no CO2 libertado para a atmosfera.
Todas as medidas realizadas nos últimos seis anos ao nível da sustentabilidade na J. F. Almeida resultam de um investimento de “cerca de 6 milhões de euros”.
Mas como se combate a fama de que o setor têxtil é um do menos “amigos” do ambiente? Para João Almeida, é uma questão de comunicação. “Tem que se começar a desmistificar esse tipo de comentários. Nós já adotámos muitas medidas, não só pela exigência dos nossos clientes, mas também nossa”, refere. Mas “quando se fala em economia circular e sustentabilidade, temos de saber comunicar. E um dos maiores males do setor têxtil é que nunca comunicou muito o que fazia”, diz.
A contrariar a fast fashion, existem neste momento muitas grandes empresas empenhadas em criar produtos duradouros, também para limitar o autoconsumo. A J.F. Almeida segue a tendência e disponibiliza dois produtos inovadores: a LandColors, uma linha de tingimento com corantes naturais mais duradoura, e o 360, um fio sustentável que é construído a partir de desperdícios têxteis. “Enumerámos todos os desperdícios têxteis que havia desde a parte da fiação até à confeção, os quais representavam cerca de 5/6% do que produzíamos, e neste momento representa cerca de 0,1%”, explica. O desperdício é incorporado, triturado, fiado até nascer um novo produto. “Neste momento, já representa cerca de 10% da faturação da empresa”, esclarece.
Pode assistir à conversa na íntegra aqui:
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