Glasgow soube a pouco: houve avanços, mas insuficientes, e o recuo final em relação ao carvão foi desastroso
Três ONG passaram 12 dias (e uma 25a hora em Glasgow) e relatam os bastidores do que por lá se pasou. E rematam. "A COP26 vai assim a prolongamento na Cimeira do Clima no Egito em 2022".
Este texto de opinião foi escrito em conjunto por Francisco Ferreira, da Zero, José Luís Monteiro, da Oikos, e Catarina António, da FEC.
As medidas adequadas no combate à crise climática exigiam uma resposta satisfatória em todos as frentes: mitigação, adaptação, financiamento e justiça climática. Em nenhuma delas, esta COP cumpriu inteiramente.
Ficámos bem aquém de assegurar uma trajetória que garantisse um aquecimento não superior a 1,5°C em relação à era pré-industrial. Trata-se de um status quo iníquo, para a resolução do qual a 26ª Cimeira do Clima não deu os contributos necessários. Contudo, se o texto final não agrada inteiramente a ninguém, não deixa de ser uma base para progressos futuros.
No final, a emenda proposta pela Índia de considerar a redução do uso de carvão ao contrário da sua eliminação é lamentável e mostra a enorme dependência de muitos países deste combustível fóssil em particular que é um elemento fundamental da descarbonização global.
Esta COP não assegurou 1,5°C, mas deixou uma porta entreaberta para tentarmos lá chegar. A COP26 vai assim a prolongamento na Cimeira do Clima no Egito em 2022, tempo extra que temos o dever de usar sabiamente.
12 dias em Glasgow e uma 25ª hora
A ZERO, a Oikos e a Fundação Fé e Cooperação (FEC) estiveram presentes na 26ª Cimeira do Clima, a COP26, que começou com o mundo a caminho de um aumento de temperatura de 2,4°C devido às emissões de gases de efeito de estufa e uma intensificação de eventos climáticos extremos ligados às alterações climáticas – incluindo inundações, furacões e incêndios florestais.
Os países do mundo juntaram-se nesta cimeira organizada pelas Nações Unidas para traçar uma ação coletiva urgente para fazer face à catástrofe climática iminente, fazendo cumprir o Acordo de Paris assinado em 2015, o qual visa manter o aquecimento global “bem abaixo” de 2°C, idealmente 1,5°C.
Nesta COP pedia-se a 196 países e à União Europeia que apresentassem planos de redução de emissões até 2030, com o objetivo de continuar a reduzi-las até se atingir a neutralidade climática global em 2050.
A primeira semana foi marcada pelos discursos dos líderes políticos, quer em presença, quer por videoconferência, com destaque para os discursos dos chefes de Estados e primeiros-ministros dos países mais relevantes, quer em termos do peso das suas economias, quer em termos de responsabilidade histórica nas emissões que contribuem para o aquecimento global.
Houve também discursos marcantes de pequenos países já fortemente afetados pelas alterações climáticas, com o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, a repetir a palavra “basta”, apelando à necessidade de mudarmos um curso que coloca em perigo a humanidade.
A confirmação da ausência na cimeira do presidente Chinês Xi Jinping e a falta de novos compromissos significativos da parte da China na redução das emissões, nomeadamente já a partir de 2025 como a ciência indica ser imprescindível, foi uma desilusão.
Os presidentes da Rússia e do Brasil também decidiram não comparecer, o que não ajudou em termos do sinal que os líderes devem passar sobre a importância deste problema e destas negociações decisivas.
A segunda semana foi marcada pelas negociações técnicas por parte das delegações dos países e pela chegada dos ministros do ambiente, energia e clima e outros membros governamentais para tomarem as rédeas da componente política das negociações.
A presença de Barack Obama na cimeira no início da segunda semana, afirmando que o planeta está fora de rumo e apelando aos jovens para se manterem firmes na luta climática, e o regresso de Boris Johnson na quarta-feira dessa semana com um apelo desesperado aos negociadores para um verdadeiro progresso nas conversações, foram mais um estímulo político para acelerar as negociações.
António Guterres voltaria ainda na quinta-feira, penúltimo dia do calendário da COP, para elogiar os negociadores pelos seus esforços, mas advertindo que o processo estava ainda muito longe do ambicionado, dizendo que o pior seria chegar a um acordo a em que o mínimo denominador comum não respondesse aos enormes desafios enfrentados.
Devido à pandemia da COVID-19, esta foi uma conferência organizada em condições especiais, com dificuldades e constrangimentos logísticos muito acrescidos, e a primeira semana foi marcada por longas filas para os participantes entrarem no recinto, denotando alguma dificuldade de planeamento da organização. Contudo, na segunda semana essas dificuldades já não se fizeram sentir, mesmo com o recinto a atingir a sua capacidade máxima nalguns dias.
Ambição climática: um copo meio vazio
Na frente da ambição, eram precisas medidas de mitigação para conter o aquecimento do planeta em 1,5°C, o limite máximo de segurança para evitar um aumento dramático de fenómenos climáticos extremos.
A Índia apresentou um conjunto de metas, as quais, sem serem particularmente ambiciosas, tal como a da neutralidade climática apenas em 2070 ou a da incorporação de mais energias renováveis até 2030, representaram um sinal importante em termos de comprometimento futuro daquele que é o terceiro maior país em termos de emissões no mundo.
O acordo alcançado de redução até 2030 das emissões de metano, o segundo gás mais importante em termos de emissões e responsável por cerca de 30% do aquecimento global, foi um passo muito significativo, pois este gás é uma peça chave para reduzir as emissões até 2030. O metano é um gás com um potencial de aquecimento mais de 80 vezes superior ao do dióxido de carbono a 20 anos, mas com um tempo de vida média na atmosfera muito mais curto que o dióxido de carbono: só cerca de 12 anos, em comparação com os mais de 100 anos do dióxido de carbono, pelo que só cortando nas emissões de metano se consegue reduzir o efeito de estufa rapidamente.
Contudo, apesar de o acordo do metano ser um bom passo, a verdade é que houve importantes países que ficaram de fora, como a China, a Índia e a Rússia, além de a redução anunciada, de 30%, ser pequena; a ZERO e organizações da sociedade civil entendem que deveria ser de pelo menos 50%, pois o metano é gás natural, e tem portanto um valor económico, pelo que reduzir as suas emissões, por exemplo evitando fugas, é fácil e custo eficaz.
Outro marco foi a adesão ou o assumir de maior ambição de 23 novos países num acordo que assume o fim do uso de carvão na produção de eletricidade. Este acordo inclui a Polónia, um país fortemente dependente do carvão, mas com centrais cujo funcionamento está planeado até 2049. Note-se que, face à dimensão deste país, a eliminação do uso do carvão deveria ter lugar no máximo até 2040.
Há também outros países, como a China, Índia e os Estados Unidos, que lamentavelmente ficaram de fora. Um acordo a merecer especial atenção é o das florestas, em que mais de 100 países, incluindo o Brasil, se comprometem a acabar com a desflorestação até 2030. O conjunto destes países representa cerca de 85% das florestas mundiais. O acordo contempla um financiamento importante, público e privado, de cerca de 20 mil milhões de dólares para pagar a proteção das florestas. Trata-se de um acordo relevante, embora um anterior, também no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, alcançado em 2014, tenha falhado nos seus objetivos.
Houve também nesta COP o anúncio da primeira iniciativa diplomática mundial focada na eliminação da exploração de combustíveis fósseis. Chamada Beyond Oil & Gas Alliance, o esforço reúne países e jurisdições subnacionais que se
comprometeram a encerrar novos licenciamentos para exploração e produção de petróleo e gás, tomando medidas para a prossecução desse objetivo, reconhecendo que a eliminação dos combustíveis fósseis é urgente e crucial para enfrentar a crise climática. Nesta aliança estão a Costa Rica, a Dinamarca, a França, a Gronelândia, a Irlanda, o Quebec, a Suécia e o País de Gales como membros plenos. A Califórnia, Portugal e a Nova Zelândia também farão parte da aliança como membros associados, e a Itália expressou seu apoio.
O texto final inicial contemplava o fim do carvão na produção de energia elétrica sem medidas para redução de emissões (captura e sequestro de carbono), algo que constituía uma novidade positiva nestes textos, mas sem indicação de metas ou da forma de operacionalização. Outra novidade importante no mesmo ponto foi a anunciada aceleração do fim dos subsídios aos combustíveis fósseis. No final, a emenda proposta pela Índia de considerar a redução do uso de carvão ao contrário da sua eliminação é lamentável e mostra a enorme dependência de muitos países deste combustível fóssil em particular que é um elemento fundamental da descarbonização global.
A ZERO assinalou que a adesão de Portugal a aliança BOGA é perfeitamente compatível com a Lei de Bases do Clima portuguesa aprovada há menos de uma semana no Parlamento, e por isso esta adesão, sendo de saudar, era expectável, pois não implica esforços adicionais por parte do país na luta climática. Recorde-se que a lei prevê que a atribuição de novas concessões de prospeção ou exploração de hidrocarbonetos passe a ser proibida em território nacional.
No final da COP, depois de contabilizadas todas as medidas, é provável que o aquecimento global no final do século se mantenha em cerca de 2.0°C, com uma amplitude possível de 1,4 a 2,6°C. Estes números preliminares ainda terão de ser validados através de estudos e simulações por parte dos climatologistas, e é de realçar um grande ‘se’: eles só se materializarão se os compromissos forem cumpridos, sendo que historicamente não têm sido. Esses compromissos têm a ver com a ação climática de curto prazo, até 2030, e com a de longo-prazo, nomeadamente a concretização da neutralidade carbónica nos prazos que os países indicaram.
Este desfecho, o mais importante da cimeira, pode ser entendido como um copo meio cheio ou meio vazio: meio vazio porque o objetivo de 1,5°C não foi atingido – um aquecimento para além disto, de acordo com o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), significa a ultrapassagem dos limites de segurança do clima, levando a um aumento catastrófico de fenómenos extremos; meio cheio porque as expectativas em torno desta cimeira eram baixas, mas ainda assim houve progressos, permitindo uma aproximação do planeta ao limite superior de 2,0°C previsto no Acordo de Paris.
Dada a incerteza no cumprimento deste objetivo, as organizações não-governamentais entendem que a cimeira falhou, mas reconhece que no texto final de Glasgow, ao serem introduzidas condições para já no próximo ano haver progressos adicionais, e não apenas em 2025 como o Acordo de Paris antevia, há margem importante de avanço. Isto porque o texto insta os países a reverem já no final de 2022 as suas Contribuições Nacionalmente Determinadas, ou até noutra qualquer altura se assim o entenderem, algo que a ZERO saúda.
De facto, sendo preciso cortar as emissões em 50% até ao final da década, uma revisão a cada cinco anos não é suficiente – tem de ser anual. Financiamento climático aos países mais vulneráveis não chega, mantendo-se a adaptação como o parente pobre.
O financiamento é de facto a grande questão por parte dos países em desenvolvimento, aquela que verdadeiramente os trouxe à cimeira, dinheiro para tornar as suas economias verdes e resilientes à crise climática. Na frente do financiamento, um ponto de atrito comum nas negociações, eram precisos compromissos sérios e concretos sobre o pagamento do combate às alterações climáticas.
Os países desenvolvidos com responsabilidades históricas nas emissões, numa ótica de justiça ambiental, devem suportar a mitigação e adaptação dos países mais afetados pelas alterações climáticas, normalmente países pobres. Isto não tem acontecido no passado: o financiamento nesta cimeira começou aquém em 20% de cumprir a meta de mobilização de 100 mil milhões de dólares por ano adotada em 2009 em Copenhaga. Embora este objetivo não tenha sido alcançado, falha reconhecida pelos países e presente no texto de Glasgow, a tarefa dos negociadores em Glasgow era chegar a um acordo sobre um novo pacote de financiamento climático a partir de 2025.
Este reconhecimento foi aproveitado por um bloco crescente de países em desenvolvimento, os quais, em troca de propostas de redução de emissões, exigiram compromissos na COP mais claros por parte dos países desenvolvidos em termos de financiamento. Só a Índia requereu um bilião de dólares em fundos públicos internacionais para fazer face ao seu compromisso de neutralidade climática até 2070. Este número é bem significativo da enorme desconexão entre os vários blocos sobre o financiamento, ou, por outras palavras, do quão baixo o financiamento proposto é.
Houve delegados dos países mais pobres e ONGs ambientais, posição respaldada pela ZERO, que acusaram os Estados Unidos e a União Europeia de bloquearem progressos nas negociações, à semelhança, aliás, daquelas que têm sido as suas posições no passado recente, recusando-se, na prática, a assumir as suas responsabilidades históricas nas emissões. Ainda assim, é de assinalar o duplicar da contribuição dos Estados Unidos para 11,4 mil milhões de dólares por ano a partir de 2024, embora ainda seja uma fração do que seria justo e demasiado longínqua no tempo.
Por outro lado, a União Europeia comprometeu-se com mais 100 milhões de dólares por ano até 2025 para o Fundo de Adaptação, uma promessa bem-vinda mas também aquém. Tudo somado, as promessas na COP permitem antever que em 2022 o financiamento poderá aproximar-se mais dos 100 mil milhões de dólares, mas este só serão atingidos, na melhor das hipóteses, em 2023.
Outra questão premente é a da distribuição dos fundos, os quais têm sido dirigidos maioritariamente à mitigação, quando é preciso igualmente pagar a adaptação – cujos custos não são inferiores aos da mitigação, pelo que a distribuição deveria ser 50-50. O acesso a este financiamento tem estado também repleto de entraves, e por norma não se trata de apoios diretos, mas sim de empréstimos, os quais não deviam contar para o fundo, pois são uma forma de endividar países já pobres. Infelizmente, o texto de Glasgow não trouxe avanços significativos neste âmbito.
Em suma, a nota é negativa para o que foi alcançado em Glasgow no capítulo do financiamento climático. No entender destas ONGs, as promessas e apelos para aumentar o nível de financiamento acima dos 100 mil milhões são vãs. Afinal, se a meta inicial de 100 mil milhões de dólares não foi alcançada em mais de uma década, porque haveriam as promessas, novamente sem um caderno de encargos definido, de ser cumpridas desta vez?
Medidas de compensação por perdas e danos sem o impulso necessário
As medidas para indemnizar de forma justa os países vulneráveis pelos danos e perdas já sofridos nos seus territórios decorrentes de fenómenos extremos, cada vez mais causados ou agravados pelas alterações climáticas, foram centrais nesta cimeira – algo que as associações saúdam, pois infelizmente em cimeiras anteriores isso não tinha acontecido. Na última década, os desastres relacionados com o clima em todo o mundo mataram mais de 410.000 pessoas e afetaram muitas mais. Em 2020, havia 30 milhões de deslocados devido a eventos relacionados com o clima. No futuro, até 2030, estima-se que as perdas e danos causados pelas alterações climáticas tenham um custo económico entre 290 e 580 mil milhões de dólares só nos países em desenvolvimento.
Para responder este problema, pedia-se aos países que estabelecessem um mecanismo para concretizar o financiamento para compensar os prejuízos, e que assumissem um compromisso concreto adequado às reais necessidades e baseado nos princípios da equidade e solidariedade global, algo que também não tem acontecido. Em parte, porque as grandes economias, incluindo os EUA e a União Europeia, resistiram durante muito tempo à ideia de um novo fundo que proporcionasse uma compensação por perdas e danos ligados às alterações climáticas, receando abrir uma porta a pedidos de indemnização.
Infelizmente, Glasgow deixou ainda muito trabalho por fazer, apesar de deixar indicados alguns potenciais caminhos para a sua operacionalização. Há a menção de tornar a Rede de Santiago, destinada a coordenar a assistência às vítimas de perdas e danos, uma realidade, embora sem aspetos concretos. A questão mais quente (sobretudo a do financiamento) ficou, mais uma vez, para a próxima.
Não será de estranhar que os países em desenvolvimento saiam desta COP a sentirem-se traídos e a clamarem por justiça climática. Os mais desfavorecidos continuam ano após ano, COP após COP, a ver os países ricos e poluidores a fugirem às suas responsabilidades, e Glasgow não pôs um termo a isso.
Artigo 6 sobre o mercado de carbono: regras ficaram definidas mas há aspetos graves de falha de
integridade
O Artigo 6 do Acordo de Paris, que estabelece as regras para os mercados globais de carbono, precisava de um novo ímpeto. A ideia de um mercado global de carbono é a de, essencialmente, permitir que os países paguem a outros para cortarem as emissões, contando a redução para os objetivos do pagador, e sendo deduzida do recebedor. Os países têm sido incapazes de chegar a um acordo sobre a regulamentação do mercado de carbono, e em Glasgow os focos de desacordo mantiveram-se como obstáculos.
A maioria dos países estava preocupada com a ausência de regras que prevenissem a dupla contagem – onde tanto o pagador como o recebedor contam as reduções para os seus próprios objetivos –, com alguns países com créditos de carbono acumulados do passado a quererem valer-se deles, mas outros a dizerem que a utilização de créditos antigos não proporciona as necessárias novas reduções nas emissões.
Por outro lado, alguns países ricos opõem-se à canalização por parte dos países vulneráveis de uma pequena parte das receitas do mercado de carbono para o financiamento da adaptação.
No entender das ONGs signatárias, o mercado de carbono não é um instrumento imprescindível na mitigação das emissões e financiamento climático. Mas ao fazer parte do Acordo de Paris, importa garantir a sua integridade, transparência e funcionalidade; infelizmente, também aqui Glasgow não cumpriu. Alguns elementos falharam, nomeadamente a possibilidade de transferir créditos de projetos antigos para o novo mecanismo, garantias de salvaguarda dos direitos humanos e o mecanismo para evitar a dupla contagem, apesar de estabelecido, carece do escrutínio necessário. Reconhecendo-se assim que diversos elementos ficaram muito aquém, o livro de regras de Paris ficou encerrado.
Entraves à participação da sociedade civil
A legitimidade da cimeira ficou ainda marcada pelas restrições sem precedentes no acesso às negociações colocadas às organizações da sociedade civil. Estas restrições aos observadores destas organizações às áreas de negociação e à intervenção junto dos negociadores, os quais representavam centenas de organizações ambientais, académicas, de justiça climática, indígenas e de direitos das mulheres, pode, na prática, trazer consequências terríveis para milhões de pessoas.
Recorde-se que estes observadores, em representação do público em geral, atuam como observadores informais para assegurar que os procedimentos são transparentes e refletem as preocupações das comunidades e grupos mais suscetíveis de serem afetados pelas decisões.
Uma cimeira necessária, útil, mas ainda assim ‘poucochinha’
As medidas adequadas no combate à crise climática exigiam uma resposta satisfatória em todas as frentes, na da mitigação, adaptação, financiamento e justiça climática. Em nenhuma delas esta COP cumpriu inteiramente.
Ficámos bem aquém de assegurar uma trajetória que garantisse um aquecimento não superior a 1,5°C em relação à era pré-industrial. Em essência, apesar de vários representantes do norte global (entre os quais a UE e os seus Estados-Membros), avançarem com metas ambiciosas no combate às alterações climáticas, por vezes esta ambição concretiza-se através da exportação dos impactos ambientais negativos para países terceiros, nomeadamente para países africanos e asiáticos, que têm menor capacidade de regulação e fracas capacidades técnicas ou financeiras para responderem da melhor forma a estes desafios.
Estas práticas incoerentes simultaneamente expõem os países em desenvolvimento às consequências de políticas e metas definidas pelos países ricos para a descarbonização das suas economias e enfraquecem a posição dos países ricos como líderes mundiais no combate às alterações climáticas.
No final, a emenda proposta pela Índia de considerar a redução do uso de carvão ao contrário da sua eliminação é lamentável e mostra a enorme dependência de muitos países deste combustível fóssil em particular que é um elemento fundamental da descarbonização global.
Trata-se de um status quo iníquo, para a resolução do qual a 26ª Cimeira do Clima não deu os contributos necessários. Contudo, se o texto final não agrada inteiramente a ninguém, não deixa de ser uma base importante para progressos futuros.
Esta COP não assegurou 1,5°C, mas deixou uma porta entreaberta para tentarmos lá chegar. A COP26 vai assim a prolongamento na Cimeira do Clima no Egito em 2022, tempo extra que temos o dever de usar sabiamente.
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Glasgow soube a pouco: houve avanços, mas insuficientes, e o recuo final em relação ao carvão foi desastroso
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