Livro de Cavaco Silva é “ajuste de contas”, diz José Sócrates
O ex-primeiro-ministro já reagiu ao novo livro de memórias do antigo Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva. É um "vulgar exercício de mesquinhez disfarçado de relato histórico", acusa.
José Sócrates já reagiu ao livro Quinta-feira e outros dias, apresentado na passada quinta-feira por Aníbal Cavaco Silva e que relata, do ponto de vista do antigo Presidente da República, algumas das reuniões que teve com o então primeiro-ministro socialista. Num artigo de opinião no Diário de Notícias, o também arguido da Operação Marquês começa por dizer que “nunca um presidente ou primeiro-ministro relatou as conversas tidas entre ambos enquanto exerceram funções” pois “há boas razões para isso”.
O ex-primeiro-ministro diz que o livro de memórias de Cavaco Silva “é um autorretrato perfeito das consequências que o ressentimento pode ter no caráter de um político” e que nunca lhe ocorreu “seguir caminho tão indigno”. Segundo José Sócrates, a “maioria” das conversas relatadas pelo ex-Presidente são “distorcidas e falsas” e “não passam de vulgar exercício de mesquinhez disfarçado de relato histórico”.
"O livro não é uma prestação de contas, mas um ajuste de contas.”
Mas de todos relatos das tais reuniões entre os líderes do Estado e do Governo, que por norma ocorriam às quintas-feiras, há um que José Sócrates não deixa passar em branco: o episódio das escutas. Corria o ano de 2009 quando veio a público o episódio das alegadas escutas a Belém a mando do Governo. No livro, Cavaco Silva recorda uma das reuniões sobre o caso em que Sócrates “se exaltou ao ponto de subir o tom de voz”.
No entanto, o ex-primeiro-ministro José Sócrates relata agora a mesma reunião do dia 16 de setembro desse ano, que diz recordar “muito bem”: “Nessa reunião exprimi ao então Presidente o meu protesto por não ter visto desmentida uma grave acusação de escutas que o meu gabinete teria feito ao Palácio de Belém e que o Presidente sabia ser falsa”, escreve Sócrates.
E acrescenta: “O Presidente respondeu-me, como aliás faria noutras ocasiões, que não interromperia as suas férias para responder aos deputados do meu partido que tinham criticado a participação de membros da casa civil do Presidente na elaboração do programa de governo do PSD.” Sócrates diz não ter entendido a ligação entre os dois assuntos e que insistiu.
“A notícia das escutas era pessoalmente ofensiva e, estando o país em campanha eleitoral, tinha provocado sérios prejuízos ao Partido Socialista, podendo ter sido evitados se o Sr. Presidente da República a tivesse desmentido”, garante. “Uns dias mais tarde soube-se a verdade. A publicação de um e-mail permitiu saber que tais notícias tinham sido transmitidas a um jornalista pelo principal assessor de imprensa do Sr. Presidente da República. Estava identificado o executante”, aponta.
Sobre a obra, José Sócrates refere ainda que “o que se passou foi, tão simplesmente, isto: pela primeira vez na história democrática do país ficou provado que um Presidente concebeu e executou uma conjura baseada numa história falsa, por forma a deitar abaixo um governo legítimo em funções”. “O Presidente da República de então não tem moral para dar lições de lealdade institucional”, remata.
E termina com uma nota, em post-scriptum, sobre a parte em que Cavaco Silva refere que “as reuniões com [Mário] Soares eram sonolentas”. “Nunca tinha visto uma transmutação de personagens tão estrambólica. O livro não é uma prestação de contas, mas um ajuste de contas”, conclui José Sócrates.
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