Marcelo e a regra dos 4 segundos no futsal
A bazuca europeia já está no terreno, mas o Presidente da República continua a discutir onde é que deve ser colocado o dinheiro.
Marcelo Rebelo de Sousa escolhe alturas e ocasiões, no mínimo estranhas, para falar sobre os fundos comunitários e sobre a bazuca europeia.
Há pouco mais de uma semana, precisamente no dia de reflexão antes das eleições legislativas, o Presidente da República fez um discurso a pedir mudanças de fundo na economia, para não corrermos o risco de “encharcar com milhões as areias de um deserto”. Ou seja, o risco de desperdiçar os milhões de euros que virão de Bruxelas.
Convenhamos que não é propriamente o discurso mais isento para se ter no dia de reflexão, véspera de eleições.
Passou uma semana e o Presidente da República volta a falar sobre o assunto. A ocasião escolhida, também convenhamos, não foi a mais ortodoxa. Marcelo Rebelo de Sousa recebeu ontem, no Palácio de Belém, a Seleção Nacional de Futsal que se sagrou bicampeã da Europa nos Países Baixos (um parêntesis para dar os parabéns à seleção).
Foi a falar para o Pany, para o Bebé, para o Zicky e para os outros jogadores da seleção de Futsal que Marcelo Rebelo de Sousa resolveu falar de… fundos comunitários.
O Presidente da República fez a seguinte analogia com o futsal: “Estamos a entrar numa fase em que temos à nossa disposição, não propriamente aquilo que se tem dito que é o paraíso ao virar da esquina, mas temos muitos fundos europeus. É verdade, é fundamental que sejam muito bem utilizados, com rigor, com transparência, com profissionalismo, eficiência, eficácia. Também aqui, para além do apito final do termo de utilização dos fundos, não temos mais fundos. Ou ganhamos ou perdemos”.
Se nos abstrairmos dos dias e dos locais escolhidos para falar sobre os fundos comunitários, Marcelo Rebelo de Sousa tem razão na mensagem, ou pelo menos em parte da mensagem. Tem razão sobre a necessidade de apressar o passo, mas não tem razão ao querer reabrir a discussão sobre onde investir o dinheiro.
Estar a discutir, nesta altura, se os fundos devem ser usados mais ali ou acolá, mais à esquerda ou mais à direita, mais para Estado ou para as empresas, creio ser uma discussão estéril e ultrapassada. O PRR já foi discutido, já foi debatido no Parlamento, já esteve em consulta pública, já teve milhares de contributos, já foi aprovado e elogiado pela Comissão Europeia, já começaram a chegar os cheques, já há dinheiro contratado, aprovado e pago e já há obras no terreno.
Sabemos que Marcelo Rebelo de Sousa não morre de amores pelo PPR. No ano passado, segundo o Expresso, Marcelo terá tido um encontro com empresários onde terá criticado, à porta fechada, as escolhas do Governo para o PRR. Na altura, confrontado pelos jornalistas com a notícia, o Presidente da República encolheu os ombros, dizendo que “não é o plano ideal, mas é o que temos”.
O Presidente tem razão. Bem ou mal é o que temos. E não se pode reprogramar. Já passou o tempo de nos questionarmos se estamos a “encharcar com milhões as areias de um deserto”. O PRR pode não ser a última Coca-Cola do deserto, mas não existe lá nenhum investimento que possamos dizer que seja um desperdício de dinheiro.
A prioridade agora é executar. Não podemos estar sempre a reabrir as discussões. Passámos 50 anos a discutir e ainda não sabemos onde vamos construir o novo aeroporto de Lisboa. A construção da barragem do Pisão, no Alto Alentejo, já foi anunciada por quadro primeiros-ministros e nunca saiu do papel: Mário Soares, António Guterres, Durão Barroso e António Costa. E agora, finalmente, há dinheiro do PRR para fazer a obra.
No futsal existe uma regra chamada regra dos quatro segundos para evitar perdas desnecessárias de tempo. Na reposição de bola em jogo, marcação de livres e nos cantos, o jogador na posse da bola tem apenas quatro segundos para reiniciar o jogo, uma contagem feita pelo árbitro com os dedos no ar. Se não o fizer, é atribuído um livre indireto à equipa adversária. Daí no futsal não haver perdas de tempo.
Nos fundos comunitários, depois de tanto tempo a debater e a discutir, creio que já passaram os quatro segundos. Agora é bola para a frente.
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