Azevedo Pereira desmente Núncio sobre offshores
Núncio afirma que foi a Autoridade Tributária a decidir a não publicação de estatísticas entre 2011 e sobre as transferências para as offshores. Azevedo Pereira desmente o ex-secretário de Estado.
José Azevedo Pereira desmente Paulo Núncio sobre as razões da não divulgação de estatísticas relativas às transferências para as offshores no mandato do governo de coligação. Em nove pontos, o máximo responsável da Autoridade Tributária entre 2007 e julho de 2014 rejeita responsabilidades e atribui ao secretário de Estado a decisão política de manter os dados na gaveta, sem escrutínio público.
“Caso tivesse sido intenção do SEAF, da altura, disponibilizar publicamente a informação produzida, teria tido a possibilidade de, em qualquer momento, ao longo dos quatro anos seguintes (com o ex-Diretor-Geral que escreve estas linhas, ou com qualquer dos que se lhe seguiram) anular o suposto “erro de perceção”, mediante a emissão de uma indicação, formal ou informal, de natureza contrária aquela que na altura foi transmitida à AT”, escreve Azevedo Pereira, em declarações, em primeira mão, ao ECO, e depois passadas para um comunicado.
Quem foi o responsável pela omissão das estatísticas sobre a transferência de contas nacionais para contas em paraísos fiscais entre 2011 e 2015? Paulo Núncio afirmou ao DN que as responsabilidades são da Autoridade Tributária (AT), garantindo que a ordem de publicação dada pelo antecessor, Sérgio Vasques, ainda determinava que a então Direção Geral dos Impostos, atual AT, divulgasse essas informações. “Essa divulgação não estava, assim, dependente de uma aprovação expressa a posteriori do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais [no caso, ele próprio, Paulo Núncio]“. E Núncio conclui: “O despacho de visto não é uma oposição à respetiva divulgação, uma vez que a AT já estava obrigada a publicar a estatística com base no despacho do meu antecessor.”
Não foi o que aconteceu, como se sabe hoje. As estatísticas foram divulgadas pela primeira vez em 2010, e só voltaram a ser públicas já com o atual governo em funções, a primeira vez em abril de 2016 e, depois, no final do ano. Foi entre estas duas divulgações que surgiu a polémica, e as dúvidas, em torno da transferência de dez mil milhões de euros relativa ao período de 2011 a 2014 e, apesar de comunicada pelos bancos ao Fisco, não terá sido tratada para efeitos de controlo e inspeção.
Segundo José Azevedo Pereira, o secretário de Estado recebeu as estatísticas de 2010 e 2011. Os bancos estão obrigados a entregar a declaração 38 sobre as transferências para paraísos fiscais até julho do ano seguinte a que se reportam as operações. O ex-diretor-geral confirma que remeteu para Paulo Núncio os dados de 2010 no final de 2011 e os relativos ao ano de 2011 no final do ano seguinte.
De acordo com o esclarecimento agora conhecido, o secretário de Estado respondeu, com ‘Visto’, às estatísticas de 2010 apenas em 2015 e às de 2011 em meados de 2014. Em ambas as respostas, Núncio terá devolvido à Autoridade Tributária os referidos dados com um ‘Visto’, o que, no entendimento de Azevedo Pereira, não é uma autorização de publicação. “A informação em causa foi preparada de raiz para acomodar a solicitação efetuada pelo SEAF na resposta ao primeiro pedido de publicação, tendo sido remetida à Secretaria de Estado no início de novembro de 2012. No entanto, o SEAF devolveu o processo à AT – em meados de junho de 2014 – apenas com um despacho de “Visto”. Ou seja declarou ter tomado conhecimento dos elementos que lhe foram comunicados mas não autorizou a sua divulgação, tal como lhe foi solicitado”, escreve Azevedo Pereira.
O responsável nota ainda que “um despacho de ‘Visto’, sem qualquer decisão associada, em linguagem corrente da Administração Pública, quer dizer exatamente aquilo que literalmente afirma. Ou seja, a mensagem é, sumariamente, vi e tomei conhecimento daquilo que propõe, mas uma vez que não lhe estou a responder afirmativamente, não o autorizo a proceder como sugere“.
Azevedo Pereira sugere ainda um exercício: “A possibilidade de que a realidade não tivesse sido esta, mas sim a de que a Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais sempre tivesse pretendido que a informação fosse disponibilizada e que apenas um mal-entendido se pudesse encontrar na origem do acontecido”. Ou seja, o ex-director-geral de Impostos, “por redução ao absurdo”, sugere que se admita, “por um momento, a possibilidade de que a ausência de publicação das estatísticas em causa tivesse resultado de um mero “erro de perceção” do Diretor-Geral da AT, à data”.
“Neste caso, o problema seria muito fácil de resolver. Bastaria que, logo que foi detetada a ausência de publicação da lista (facto que, naturalmente, ocorreu de imediato), fosse feita uma comunicação no sentido oposto daquela que foi recebida pela AT – ou seja, no sentido de que a informação fosse publicada”. “Naturalmente, estes erros de perceção podem demorar dias, ou, na pior das hipóteses, meses a sanar. Contudo, nunca demoram quatro anos a resolver – ficando inclusivamente sem solução ao longo de todo o período em causa e transitando para o executivo seguinte”, concluiu o Azevedo Pereira.
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