Como vai funcionar o novo escudo anticrise? Que outras armas tem o BCE para evitar crise da dívida na Zona Euro?
- Alberto Teixeira
- 22 Julho 2022
O BCE criou um novo instrumento para travar uma nova crise na Zona Euro com a subida dos juros. Mas como vai funcionar exatamente? De que outras armas dispõe o banco central?
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- Alberto Teixeira
- 22 Julho 2022
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Porque é que o BCE criou uma ferramenta anticrise?
Chama-se Instrumento de Proteção da Transmissão (IPT) e, como o nome indica, é uma ferramenta com a qual o BCE conta para assegurar que a subida das taxas de juro nos próximos tempos não vai criar desequilíbrios entre os países da Zona Euro naquilo que são os seus custos de financiamento.
Em junho, o banco central anunciou que ia subir as suas taxas nesta reunião, mas provocou uma crise de desconfiança dos investidores em relação aos países mais endividados, nomeadamente a Itália. Os juros da dívida italiana dispararam e ameaçaram arrastar outros estados-membros em situação também débil, como Portugal e Espanha, enquanto países como a Alemanha seguiam sem grandes oscilações.
Esta divergência estava a ameaçar a capacidade de o BCE prosseguir com a subida das taxas de juro para travar a escalada inflação, pois, a cada aumento, Zona Euro dava mais um passo rumo à sua fragmentação – como ia acontecendo na crise das dívidas soberanas da década passada.
Para evitar este cenário, criou este esquema de compra de dívida que visa disciplinar o mercado e evitar movimentos especulativos que ponham em causa a unidade da Zona Euro, ao mesmo tempo que avança com a normalização da sua política monetária.
Proxima Pergunta: Como vai funcionar exatamente o IPT?
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Como vai funcionar exatamente o IPT?
No âmbito do IPT, o BCE vai comprar obrigações dos governos com maturidades entre um e dez anos dos Estados membros que “registarem uma deterioração das condições de financiamento que não são justificam pelos fundamentais específicos de cada país”. Isto é, vai intervir no mercado sempre que os investidores colocarem um país sob pressão, como aconteceu recentemente com Itália.
Adicionalmente, o banco central abriu a porta à compra de obrigações do setor privado, mas só “se for apropriado”.
O banco central diz não ter limites na escala destas compras, assegurando que os montantes irão “depender da severidade dos riscos”, não existindo limites predefinidos.
A presidente do BCE, Christine Lagarde, garantiu ainda que caberá ao conselho de governadores do BCE decidir quando este instrumento vai ser usado e “sem estar dependente de ninguém”.
Proxima Pergunta: Os países têm de cumprir requisitos para beneficiarem do escudo?
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Os países têm de cumprir requisitos para beneficiarem do escudo?
Sim, e isto já vinha sendo admitido há algumas semanas, com os responsáveis do BCE a referirem que não ia haver “almoços grátis” e Christine Lagarde a frisar que os países teriam de manter políticas orçamentais saudáveis e sustentáveis, nomeadamente no controlo do défice e da dívida pública.
Com efeito, o banco central anunciou quatro critérios que determinado país deve cumprir para poder beneficiar da proteção deste escudo:
- Estar em conformidade com o quadro orçamental da UE, nomeadamente não estar sujeito a um procedimento relativo aos défices excessivos (PDE), ou não ser avaliado como não tendo tomado medidas eficazes em resposta a uma recomendação do Conselho da UE;
- Ausência de desequilíbrios macroeconómicos graves;
- Sustentabilidade da dívida pública: ao verificar que a trajetória da dívida pública é sustentável, o conselho do BCE terá em conta, sempre que disponível, as análises de sustentabilidade da dívida da Comissão Europeia, do Mecanismo Europeu de Estabilidade, do Fundo Monetário Internacional e de outras instituições, juntamente com a análise interna do banco central;
- Políticas macroeconómicas sólidas e sustentáveis que cumpram os compromissos apresentados no respetivo PRR.
Antes de ativar a nova ferramenta, o conselho de governadores fará “uma avaliação abrangente dos indicadores de mercado e de transmissão”, como o custo de financiamento para os governos e empresas, no sentido de determinar se as decisões de política monetária estão a ter os impactos desejáveis em toda a região e se as compras de obrigações são “proporcionais” no cumprimento do objetivo de inflação de 2%.
Proxima Pergunta: Houve países contra este escudo?
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Houve países contra este escudo?
Sim e não. Na verdade, todos os 25 membros do conselho de governadores do BCE votaram a favor do IPT, ou seja, a aprovação deste instrumento foi unânime, como sublinhou a presidente francesa.
Porém, houve quem tivesse reservas quanto à criação deste instrumento, com receios de ter um banco central a financiar diretamente os Estados e a promover políticas orçamentais inadequadas por parte de alguns governos.
Para ultrapassar parte destes problemas, o instrumento vem com condicionalismos associados a contas públicas certas. Além disso, também serviu como moeda de troca para os governadores mais conservadores conseguirem agora uma subida das taxas de juros mais agressiva, de 50 pontos base contra os 25 que estavam pré-anunciados.
Proxima Pergunta: O BCE tem outras armas para travar crise?
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O BCE tem outras armas para travar crise?
O banco central criou o IPT, mas tem mais opções naquilo que Christine Lagarde chamou de “caixa de ferramentas”.
Uma dessas ferramentas chama-se PEPP, o programa de compra de ativos devido a emergência pandémica que foi descontinuado em março passado. O BCE diz que vai aplicar flexibilidade nos reinvestimentos dos reembolsos previstos no âmbito da carteira do PEPP, que “permanece a primeira linha de defesa contra riscos para o mecanismo de transmissão relacionados com a pandemia”. Na prática, vai comprar novas obrigações dos governos com o dinheiro das “velhas” obrigações que adquiriu através do PEPP e que forem vencendo.
Adicionalmente, o BCE dispõe do chamado programa Outright Monetary Transactions (OMT), criado em 2012 em plena crise da dívida soberana e através do qual realiza compras de dívida pública nos mercados secundários, mas sob certas condições. Quais? O país tem de ter pedido uma ajuda financeira ao Mecanismo Europeu de Estabilidade ao qual está associado um programa de ajustamento e de reformas exigentes.