BCE sobe taxas em 50 pontos base e acaba com juros negativos na Zona Euro

Banco central decidiu na reunião desta quinta-feira subir os juros diretores em 50 pontos base, o primeiro aumento em mais de dez anos para tentar controlar a inflação. Acabaram os juros negativos.

O conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE) decidiu esta quinta-feira aumentar as taxas de juro diretoras em 50 pontos base, acima do que tinha antecipado na reunião de junho. Foi também aprovada uma ferramenta para prevenir a repetição de uma crise de dívida soberana na Zona Euro, apelidada de Instrumento de Proteção da Transmissão (IPT).

Com este aumento, a taxa de juro aplicável às operações principais de refinanciamento fixa-se em 0,50%, a taxa aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez aumenta para 0,75% e a taxa aplicável à facilidade permanente de depósito evolui de -0,5% para 0%, anunciou o BCE.

O momento é histórico, sendo a primeira vez que decide subir as taxas de juro em mais de uma década, acabando com os juros negativos na Zona Euro. Não vai ser uma decisão isolada. Num comunicado, o BCE escreve que, “nas próximas reuniões do Conselho do BCE, será apropriada uma nova normalização das taxas de juro”.

A decisão desta quinta-feira representa o início de um ciclo de subida dos juros na Zona Euro, com os quais o BCE espera domar a subida generalizada dos preços. Em junho, a taxa de inflação média dos países da região cifrou-se em 8,6%, um máximo histórico desde a criação da moeda única, e já se sabe que a reunião de setembro trará nova subida dos juros, admitindo-se um aumento de 50 pontos.

Na prática, ao apertar a política monetária, o BCE está a aumentar o preço do dinheiro. O acesso a crédito e capital torna-se mais limitado e as famílias com crédito à habitação exposto à flutuação dos juros no mercado veem subir a prestação mensal da casa, o que deixa menos rendimento disponível. A dinâmica real é bem mais complexa, mas o resultado final, espera o BCE, é a descida da inflação na Zona Euro.

Numa conferência de imprensa após o anúncio da subida dos juros, Christine Lagarde, presidente do BCE, alertou que a inflação vai continuar “indesejavelmente alta durante algum tempo”. Mas, apesar da conjuntura desafiante, o banco central não espera, para já, uma recessão em 2022 nem em 2023, disse.

“Em consonância com o seu forte compromisso de cumprimento do seu mandato de manutenção da estabilidade de preços, o Conselho do BCE tomou hoje novas medidas fundamentais para assegurar o regresso da inflação ao seu objetivo de 2% a médio prazo”, lê-se no comunicado do BCE. Os responsáveis pela política monetária consideraram “apropriado dar um primeiro passo maior, na sua trajetória de normalização das taxas de juro diretoras, do que o sinalizado na reunião anterior”, que tinha sido na ordem dos 25 pontos base, acrescenta.

O BCE vai mais além e justifica que a decisão de aumentar as taxas em 50 pontos base resulta de uma “avaliação atualizada relativamente aos riscos de inflação”. O banco central refere também que as próximas decisões de subida de juros passarão a uma “abordagem reunião a reunião” e dependentes da observação dos dados e indicadores que forem sendo publicados.

Quanto ao IPT, a ferramenta anticrise, o BCE entendeu ser uma medida “necessária para apoiar a transmissão eficaz da política monetária”. O objetivo é evitar a chamada “fragmentação”, isto é, o agravar dos spreads entre a dívida soberana dos países da periferia e as bunds alemãs.

“À medida que o Conselho do BCE continua a normalizar a política monetária, o IPT assegurará que a orientação da política monetária é transmitida uniformemente em todos os países da área do Euro”, remata o banco central.

Na conferência de imprensa, que antecedeu a divulgação de um comunicado a explicar o mecanismo com maior detalhe, Christine Lagarde disse que todos os países do Euro, em teoria, podem aceder a esta ferramenta, desde que cumpram uma série de requisitos específicos, como, por exemplo, respeitarem as regras de endividamento da União Europeia (UE). A decisão final, contudo, pertence aos governadores do banco central.

A responsável disse ainda que o conselho de governadores “prefere” não ter de usar esta ferramenta. Porém, assegurou que não “hesitará” em o fazer se tal for necessário.

(Notícia atualizada pela última vez às 16h08)

O comunicado do BCE na íntegra

Em consonância com o seu forte compromisso de cumprimento do seu mandato de manutenção da estabilidade de preços, o Conselho do Banco Central Europeu (BCE) tomou hoje novas medidas fundamentais para assegurar o regresso da inflação ao seu objetivo de 2% a médio prazo. O Conselho do BCE decidiu proceder a um aumento de 50 pontos base das três taxas de juro diretoras do BCE e aprovou o Instrumento de Proteção da Transmissão (IPT).

O Conselho do BCE considerou apropriado dar um primeiro passo maior, na sua trajetória de normalização das taxas de juro diretoras, do que o sinalizado na reunião anterior. Esta decisão assenta na avaliação atualizada do Conselho do BCE relativamente aos riscos de inflação e no apoio reforçado proporcionado pelo IPT para a transmissão eficaz da política monetária. Apoiará o regresso da inflação ao objetivo de médio prazo do Conselho do BCE, ao ancorar mais firmemente as expectativas de inflação e ao garantir o ajustamento das condições da procura para a consecução do objetivo de inflação a médio prazo.

Nas próximas reuniões do Conselho do BCE, será apropriada uma nova normalização das taxas de juro. A antecipação, hoje decidida, da saída de taxas de juro negativas permite ao Conselho do BCE efetuar a transição para uma abordagem reunião a reunião nas decisões sobre as taxas de juro. A futura trajetória das taxas de juro diretoras definida pelo Conselho do BCE continuará a depender dos dados e ajudará a cumprir o objetivo de inflação de 2% a médio prazo. No contexto da normalização da sua política monetária, o Conselho do BCE analisará as opções de remuneração das reservas excedentárias.

O Conselho do BCE considerou que a criação do IPT é necessária para apoiar a transmissão eficaz da política monetária. Em especial, à medida que o Conselho do BCE continua a normalizar a política monetária, o IPT assegurará que a orientação da política monetária é transmitida uniformemente em todos os países da área do euro. A unicidade da política monetária do Conselho do BCE constitui uma condição prévia para que o BCE possa cumprir o seu mandato de manutenção da estabilidade de preços.

O IPT será uma adição ao conjunto de instrumentos do Conselho do BCE e pode ser ativado a fim de contrariar dinâmicas de mercado desordenadas, injustificadas e passíveis de representar uma ameaça grave para a transmissão da política monetária na área do euro. O volume das aquisições de ativos ao abrigo do IPT depende da gravidade dos riscos para a transmissão da política monetária. As aquisições não estão sujeitas a restrições prévias. Ao salvaguardar o mecanismo de transmissão, o IPT permitirá ao Conselho do BCE cumprir mais eficazmente o seu mandato de manutenção da estabilidade de preços.

Em todo o caso, a flexibilidade nos reinvestimentos dos reembolsos previstos no âmbito da carteira do programa de compra de ativos devido a emergência pandémica (pandemic emergency purchase programme ‒ PEPP) permanece a primeira linha de defesa contra riscos para o mecanismo de transmissão relacionados com a pandemia.

Os pormenores do IPT são descritos num comunicado separado a publicar às 15h45 (hora da Europa Central).

Taxas de juro diretoras do BCE

O Conselho do BCE decidiu aumentar as três taxas de juro diretoras do BCE em 50 pontos base. Nessa conformidade, a taxa de juro aplicável às operações principais de refinanciamento e as taxas de juro aplicáveis à facilidade permanente de cedência de liquidez e à facilidade permanente de depósito serão aumentadas para 0,50%, 0,75% e 0,00%, respetivamente, com efeitos a partir de 27 de julho de 2022.

Nas próximas reuniões do Conselho do BCE, será apropriada uma nova normalização das taxas de juro. A antecipação, hoje decidida, da saída de taxas de juro negativas permite ao Conselho do BCE efetuar a transição para uma abordagem reunião a reunião nas decisões sobre as taxas de juro. A futura trajetória das taxas de juro diretoras definida pelo Conselho do BCE continuará a depender dos dados e ajudará a cumprir o objetivo de inflação de 2% a médio prazo.

Programa de compra de ativos e programa de compra de ativos devido a emergência pandémica

O Conselho do BCE pretende continuar a reinvestir, na totalidade, os pagamentos de capital dos títulos vincendos adquiridos no âmbito do programa de compra de ativos (asset purchase programme – APP) durante um período prolongado após a data em que comece a aumentar as taxas de juro diretoras do BCE e, em qualquer caso, enquanto for necessário para manter condições de liquidez amplas e uma orientação de política monetária adequada.

No que respeita ao PEPP, o Conselho do BCE tenciona reinvestir os pagamentos de capital dos títulos vincendos adquiridos no contexto do programa até, pelo menos, ao final de 2024. De qualquer forma, a futura descontinuação gradual da carteira do PEPP será gerida de modo a evitar interferências com a orientação de política monetária apropriada.

Os reembolsos no contexto da carteira do PEPP estão a ser reinvestidos de forma flexível, a fim de contrariar os riscos para o mecanismo de transmissão relacionados com a pandemia.

Operações de refinanciamento

O Conselho do BCE continuará a acompanhar as condições de financiamento bancário e a assegurar que o vencimento dos fundos cedidos no âmbito da terceira série de operações de refinanciamento de prazo alargado direcionadas (ORPA direcionadas III) não dificulta a transmissão regular da política monetária. Avaliará também com regularidade o modo como as operações de refinanciamento direcionadas estão a contribuir para a orientação da política monetária.

O Conselho do BCE está preparado para ajustar todos os seus instrumentos, no âmbito do seu mandato, a fim de assegurar que a inflação estabiliza no objetivo de 2% a médio prazo. O novo IPT criado pelo Conselho do BCE irá salvaguardar a transmissão uniforme da orientação da política monetária no conjunto da área do euro.

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