Governo pode recorrer à requisição civil na greve geral? Sete respostas para perceber o que está em causa
- Isabel Patrício
- 10 Dezembro 2025
Requisição civil está na lei desde 1974. Caso os serviços mínimos fixados para esta greve não sejam cumpridos, Governo pode recorrer a esta figura. O ECO explica tudo.
Governo pode recorrer à requisição civil na greve geral? Sete respostas para perceber o que está em causa
- Isabel Patrício
- 10 Dezembro 2025
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O que é a requisição civil?
Prevista desde 1974, a requisição civil é uma figura a que os governos podem recorrer para assegurar “o regular funcionamento de serviços essenciais de interesse público ou de setores vitais da economia nacional”, cuja “paralisação momentânea ou contínua acarretaria perturbações graves da vida social, económica e até política em parte do território num setor da vida nacional ou numa fração da população”, de acordo com o decreto-lei que a criou.
Esse diploma deixa claro também que a requisição civil tem um caráter excecional e só pode ser aplicada em “circunstâncias particularmente graves”.
A requisição civil pode ter por objeto a prestação de serviços (individual ou coletiva), a cedência de bens móveis ou semoventes, a utilização temporária de quaisquer bens, os serviços públicos e as empresas públicas de economia mista ou privadas.
No caso da greve geral desta quinta-feira, a aplicar-se a requisição civil, o Governo poderia exigir, por exemplo, a prestação de serviço pelos trabalhadores para garantir a satisfação das necessidades consideradas impreteríveis.
Proxima Pergunta: Como é que a requisição civil é aplicada?
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Como é que a requisição civil é aplicada?
Para recorrer à requisição civil, o Governo tem de aprovar em Conselho de Ministros o reconhecimento da sua necessidade, sustentando a decisão com o incumprimento dos serviços mínimos já fixados para o dia de greve, de acordo com os advogados ouvidos pelo ECO.
Por exemplo, o advogado Gonçalo Pinto Ferreira, sócio da Telles, entende que, enquanto não houver incumprimento desses mínimos, não há fundamento para a requisição civil.
Além disso, tem de se demonstrar que há um risco grave para a segurança, saúde e necessidades impreteríveis da população, e que não há alternativas para que esta figura seja acionada.
Começando a greve geral desta quinta-feira às 00:00, se se concluir que os serviços mínimos, por exemplo, nos hospitais não estão a ser cumpridos, o Governo pode aprovar, nas primeiras horas do dia, a requisição civil, emitindo uma portaria nesse sentido com efeitos ainda durante o dia 11 de dezembro.
Nessa portaria, o Governo deve indicar o objeto da requisição civil e a sua duração, a autoridade responsável pela execução da requisição, a modalidade de intervenção das forças armadas (quando tenha lugar), o regime de prestação de trabalho dos requisitados, e o comando militar a que fica afeto o pessoal (quando sujeito a foro militar).
O decreto de 1974 esclarece também que a decisão de requisição produz efeitos imediatos.
Proxima Pergunta: Quem pode ser requisitado?
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Quem pode ser requisitado?
Qualquer trabalhador que seja indicado pelo sindicato ou pela empresa. “A requisição civil de pessoas pode abranger todos os indivíduos maiores de 18 anos, mesmo os não abrangidos pelas leis de recrutamento ou isentos do serviço militar”, lê-se no decreto-lei de 1974.
“A afetação dos requisitados terá em consideração, quando possível, as respetivas profissões, aptidões físicas e intelectuais, a idade, o sexo e a situação familiar”, acrescenta ainda o diploma.
A decisão é dada a conhecer através dos meios de comunicação social ou, nos casos individuais, através de “documento escrito autenticados pelos ministros interessados ou pela entidade em que tenham delegado”.
Proxima Pergunta: Quanto recebem os trabalhadores requisitados?
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Quanto recebem os trabalhadores requisitados?
Só o salário correspondente, isto é, não está prevista qualquer indemnização extra.
“A requisição civil das pessoas não concede direito a outra indemnização que não seja o vencimento ou salário decorrente do respetivo contrato de trabalho ou categoria profissional, beneficiando, contudo, dos direitos e regalias correspondentes ao exercício do seu cargo e que não sejam incompatíveis com a situação de requisitados”, explica o decreto-lei já mencionado.
Proxima Pergunta: Quantas vezes já se recorreu a esta figura?
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Quantas vezes já se recorreu a esta figura?
A requisição civil já foi aplicada mais de 30 vezes em Portugal, em 51 anos de existência desta figura.
Uma das utilizações mais recentes aconteceu em 2019, durante a polémica greve dos motoristas de matérias perigosas, em reação ao incumprimento dos serviços mínimos.
A primeira vez que esta figura foi utilizada foi em 1976, tendo sido decretada com o foco numa greve de enfermeiros.
Proxima Pergunta: Desta vez, o Governo já admitiu recorrer à requisição civil?
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Desta vez, o Governo já admitiu recorrer à requisição civil?
Para já, esse cenário não parece estar em cima da mesa. Ao invés, a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, já avisou que espera que os serviços mínimos sejam cumpridos na greve geral.
“Não podemos prever, a priori, não é possível no nosso ordenamento jurídico. Esperamos que o cumprimento dos serviços mínimos torne absolutamente desnecessária qualquer requisição civil”, sublinhou a governante, em declarações aos jornalistas.
Proxima Pergunta: Afinal, o que explica a greve desta quinta-feira?
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Afinal, o que explica a greve desta quinta-feira?
A reforma da lei do trabalho que o Governo quer levar a cabo, e que prevê, por exemplo, o alargamento dos limites da contratação a prazo, o regresso do banco de horas individual e o fim do travão ao outsourcing após despedimentos coletivos ou por extinção do posto de trabalho.
O Governo tem insistido que esta greve não faz sentido, porque a negociação na Concertação Social continua. Mas tanto a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, como o primeiro-ministro, Luís Montenegro, não têm dado sinais de recuar nas matérias consideradas mais críticas pelos sindicatos.
De notar que, ainda que o direito à greve esteja estabelecido na Constituição, a lei do trabalho define que, nas empresas e os estabelecimentos que se destinam à “satisfação de necessidades sociais impreteríveis”, os sindicatos devem assegurar a “prestação de serviços mínimos indispensáveis” para salvaguardar essas necessidades.
Por isso, o Tribunal Arbitral já definiu serviços mínimos, por exemplo, para os hospitais, os aeroportos, a Comboios de Portugal e para a Carris, conforme escreveu o ECO. Ou seja, neste últimos casos, haverá circulação, ainda que reduzida.
Já o Metropolitano de Lisboa ficou de fora, o que significa que este serviço poderá ficar mesmo parado esta quinta-feira, em função da adesão à greve. A empresa já anunciou que irá recorrer.