Trabalhadores a “comprar” dias de férias? Sete respostas sobre o que o Governo está a planear

- Isabel Patrício
- 7:02
Governo quer deixar clara na lei do trabalho possibilidade de os trabalhadores "comprarem" dias de férias. O ECO explica o que está em causa em sete respostas.
-
A quantos dias têm hoje direito os trabalhadores?
-
Governo abriu a porta a que trabalhadores tenham mais dias de férias?
-
Que limites haverá à "compra" de férias?
-
Mas não há empresas que já dão essa possibilidade aos trabalhadores?
-
Mas, então, o que mudaria com a medida anunciada pelo Governo?
-
Sendo assim, a partir de quanto é possível "comprar" dias de férias?
-
A "compra" de férias é a única alteração à lei do trabalho que está na calha?
Trabalhadores a “comprar” dias de férias? Sete respostas sobre o que o Governo está a planear

- Isabel Patrício
- 7:02
-
A quantos dias têm hoje direito os trabalhadores?
Regra geral, a 22 dias úteis. É esse o período mínimo que está previsto no Código do Trabalho para os trabalhadores que exercem funções no setor privado. Mas o empregador pode “oferecer” dias adicionais, nomeadamente, como benefício para reter o talento. Ou, em alternativa, os instrumentos de regulamentação coletiva podem prever mais dias do que esse período mínimo.
Também no setor público estão previstos 22 dias de férias, mas a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas indica que acresce um dia útil de férias por cada dez anos de serviço prestado. Além disso, a duração do período de férias pode ser aumentada como recompensa pelo desempenho.
Proxima Pergunta: Governo abriu a porta a que trabalhadores tenham mais dias de férias?
-
Governo abriu a porta a que trabalhadores tenham mais dias de férias?
O Governo não tem intenção (a julgar pelo programa apresentado no Parlamento) de mudar o referido período mínimo de férias previsto na lei do trabalho, mas quer introduzir “maior flexibilidade no gozo de férias por iniciativa do trabalhador“.
Em concreto, o Executivo pretende aproveitar uma revisão mais ampla da lei do trabalho para deixar nessa sede a possibilidade de aquisição de dias de férias. Por esta via, o trabalhador poderá, sim, vir a ter mais dias de férias, mas terá de os “comprar”.
Em declarações ao ECO, a advogada Inês Arruda, sócia da Pérez-Lorca, adianta que, “em teoria, uma das formas de aplicar essa ideia seria descontar no salário o valor correspondente aos dias de férias extra“, mas avisa que tal “poderia gerar problemas para quem recebe o salário mínimo nacional, pois não pode ficar abaixo do rendimento mínimo estabelecido por lei.”
“Outra solução possível passaria pela concessão de alguns dias de ‘licença sem retribuição’ a pedido do trabalhador. Neste cenário, faria sentido que esse direito fosse condicionado a certos requisitos, como a apresentação simultânea com o pedido de férias, a inexistência de faltas injustificadas ou a exigência de uma antiguidade mínima — por exemplo, só após o segundo ano de contrato, para evitar o acúmulo excessivo de férias nos primeiros dois anos”, sugere a advogada.
“Atualmente, o Código do Trabalho só garante o acesso automático à licença sem retribuição em situações específicas (geralmente ligadas à formação), e mesmo nesses casos o empregador pode recusar o pedido em determinadas condições legais. Em todos os outros casos, a concessão da licença depende estritamente da anuência da entidade empregadora”, sublinha a mesma.
Proxima Pergunta: Que limites haverá à "compra" de férias?
-
Que limites haverá à "compra" de férias?
O programa eleitoral da AD e o programa do Governo não detalham os limites para a aquisição de dias de férias. Referem, apenas, que o limite será definido contratualmente entre o empregador e o trabalhador.
Proxima Pergunta: Mas não há empresas que já dão essa possibilidade aos trabalhadores?
-
Mas não há empresas que já dão essa possibilidade aos trabalhadores?
Sim, há. No início do ano, a Decathlon, por exemplo, anunciou o reforço dos benefícios garantidos aos trabalhadores, com a introdução, nomeadamente, da possibilidade de estes adquirirem até quatro dias de descanso extra por ano civil.
Na altura, o ECO questionou a empresa sobre esta medida, tendo sido explicado que os dias extra são concedidos “mediante a correspondente dedução no salário, sem qualquer perda de direitos laborais ou impacto nos benefícios associados à assiduidade“.
“Esta medida permite uma maior flexibilidade na gestão do equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, mantendo intactos todos os demais benefícios oferecidos pela empresa”, salientou fonte oficial ao ECO.
Proxima Pergunta: Mas, então, o que mudaria com a medida anunciada pelo Governo?
-
Mas, então, o que mudaria com a medida anunciada pelo Governo?
Hoje já há empresas que permitem aos trabalhadores “comprarem” dias de férias extra, mas existe “um certo vazio legal”, explica ao ECO o advogado Pedro Antunes, sócio da CCA Law.
Neste momento, o Código do Trabalho não detalha como deve ser feita essa aquisição de dias extra de descanso, nem os limites. No limite, não é preciso que essa possibilidade fique num acordo formal.
Como o Governo pretende deixar essa possibilidade na lei do trabalho, a forma como ambas as partes acordam a compra de dias deverá ser agora regulada, salienta o referido advogado.
“Para que esta medida possa ser generalizada com segurança, é essencial que venha acompanhada de regras claras: limites contratuais bem definidos, e neutralidade fiscal (para o trabalhador poderíamos isentar de IRS e Segurança e Social, e para o empregador o custo associado à concessão desses dias adicionais podia ser dedutível como despesa de pessoal)”, assinala Pedro Antunes.
Proxima Pergunta: Sendo assim, a partir de quanto é possível "comprar" dias de férias?
-
Sendo assim, a partir de quanto é possível "comprar" dias de férias?
Se a empresa para a qual trabalha já tiver essa prática, poderá continuar a aderir como até aqui.
Quanto à regulamentação dessa possibilidade na lei do trabalho, ainda vai ter de esperar. O Governo vê aprovado esta quarta-feira o seu programa, seguindo-se ainda um caminho longo até que essa medida possa sair do papel.
Primeiro, o assunto será discutido na Concertação Social (o Governo já disse que quer debater com os parceiros sociais as alterações à lei do trabalho).
Depois, seguirá para o Parlamento, onde o PSD terá de dialogar com os demais partidos para conseguir que a medida seja aprovada, uma vez que não tem maioria absoluta.
Só depois desses processos, esta medida poderá chegar ao terreno, pelo que ainda não é certo a partir de que data será possível aos trabalhadores “comprar” dias de férias, com regras definidas na lei do trabalho.
Proxima Pergunta: A "compra" de férias é a única alteração à lei do trabalho que está na calha?
-
A "compra" de férias é a única alteração à lei do trabalho que está na calha?
Não. Na legislatura anterior, já estava a ser feito trabalho na Concertação Social com vista à revisão da legislação laboral.
Este novo Governo de Luís Montenegro dará, portanto, continuidade a esse processo, sendo que se admitem mexidas nas regras, além das férias, do teletrabalho, do trabalho nas plataformas digitais, da negociação coletiva, da greve e até do lay-off.
A greve é um dos pontos mais polémicos e sensíveis dessa discussão. Os sindicatos já disseram ser contra qualquer medida, mas o Governo insiste que é preciso equilibrar o impacto das paralisações com os direitos dos demais cidadãos.
Não se detalha, porém, para já o que será alterado, sendo que os advogados ouvidos pelo ECO já avisaram que vai ser difícil alterar esse que é um direito fundamental.