“Jovens vão voltar ao país com muito valor para criar dentro de dez anos”, diz diretor de MBA da Católica

Diretor do MBA executivo da Católica Porto Business School, Luís Marques, avisa que qualidade dos gestores nacionais ainda tem muito a melhorar, especialmente quanto aos recursos humanos.

Luís Marques confessa-se um otimista. Numa altura em que tanto se fala na saída de jovens qualificados do país, o professor universitário e diretor do MBA executivo da Católica Porto Business School prevê que esse talento regressará a Portugal no prazo de dez anos para criar projetos, que irão gerar muito valor à economia nacional.

Em entrevista ao ECO, Luís Marques reconhece, ainda assim, que os gestores nacionais têm ainda muito caminho a fazer, especialmente na área da gestão dos recursos humanos, deixando o aviso de que, sem salário, o líder até pode ser o melhor do mundo, mas a retenção de talento não acontece.

Quanto à formação, o professor reconhece que em Portugal não existe um efeito acelerador do salário ligado ao MBA semelhante ao verificado nos Estados Unidos. Em média, quando se sai destes programas, o salário melhora em 20%, avança o diretor do MBA que está a comemorar agora 20 anos.

Há 20 anos tínhamos um gap na área do planeamento estratégico, da definição de objetivos, das rotinas de gestão. Nos últimos 20 anos, melhoramos nisso, mas na área do capital humano, não melhoramos.

Luís Marques

Diretor do MBA executivo da Católica Porto Business School

Fala-se muito na necessidade de pôr a economia portuguesa e, em concreto, as empresas a crescer. Que avaliação faz da qualidade dos gestores nacionais?

A evidência internacional na área da gestão aponta para uma lacuna muito relevante na qualidade das práticas de gestão em Portugal face àquilo que são as melhores práticas internacionais. Essa evidência tem, sobretudo, focado nas práticas de gestão de recursos humanos, na componente de motivação e incentivo. Há 20 anos tínhamos um gap na área do planeamento estratégico, da definição de objetivos, das rotinas de gestão. Nos últimos 20 anos, melhoramos nisso, mas na área do capital humano, naquilo que são as metodologias de incentivo e motivação, não melhoramos.

Como se explica esse cenário?

Os estudos apontam, sobretudo, para os incentivos. Não somos tão transparentes nos prémios e não somos tão eficazes nas sanções. Sobretudo na Europa do Sul, somos mais tolerantes ao fracasso e, portanto, quando os objetivos não são atingidos, não praticamos sanções nas organizações. Mas, ao mesmo tempo, também não somos tão comemorativos nas vitórias.

É uma questão cultural, essa falta de transparência? Ou será reflexo de alguma falta de formação dos gestores?

São ambos. Deve-se muito, sem dúvida, ao tema da liderança dos nossos gestores. Há muito a desenvolver. Mas deve-se também àquilo que é a resistência à implementação de rotinas dentro das nossas organizações. Aí não tem tanto que ver com os gestores, mas tem mais a ver com as próprias pessoas e a sua resistência à capacidade de implementação dessas rotinas.

É diretor do MBA executivo da Católica Porto Business School. Sente que os gestores já estão suficientemente conscientes da necessidade de irem atualizando as suas competências?

Estão bastante. Os gestores hoje envolvem-se muito na formação executiva. Assistimos a uma proximidade muito forte entre a formação para executivos e aquilo que são as práticas de gestão nas empresas.

O facto de as empresas portuguesas serem, na sua maioria, pequenas trava o investimento em programas de formação, como o MBA executivo que lidera?

Continua a ser um travão. São programas cujo preço é relevante, em termos de euros e em termos de número de horas de envolvimento. Um MBA dura dois anos. O nosso MBA já não tem horário semanal. Está concentrado numa vez por mês, de quarta a sábado. Isto permite uma maior conciliação. No nosso MBA executivo, em 40% dos casos, o custo é suportado pelas empresas, o que revela que as empresas continuam a investir de forma relevante naquilo que é a formação dos seus quadros superiores. Nos outros 60% dos casos, os custos são suportados pelo aluno. Nesse caso, temos um mix de alunos que querem ser empreendedores e querem montar o seu próprio negócio, e de alunos com uma faixa etária superior. A nossa média etária é 46 anos. Nos Estados Unidos, é de 28 anos.

Essa diferença entre Portugal e os Estados Unidos poderá estar relacionada com o facto de em Portugal os salários serem mais baixos?

Uma das explicações é essa. No início da carreira, as pessoas têm menor poder de compra e um MBA é um investimento relevante. Outro fator determinante é que, nos Estados Unidos, o número de alunos por MBA pode atingir facilmente mil alunos. Um MBA é um acelerador muito relevante do package [pacote] salarial. O investimento médio nos Estados Unidos é de 150 mil dólares. O payback [retorno] são 18 meses. Em Portugal, não existe esse efeito acelerador. Em média, quando se sai de um MBA, o salário melhora em 20%, o que significa que o payback [retorno] não são 18 meses, são anos.

Nos Estados Unidos, as pessoas têm acesso a tirar um MBA e, depois, a trabalhar nessas empresas, que oferecem uma expectativa de experiência profissional a quem tira um MBA muito relevante. Em Portugal, não temos muito esses ecossistemas.

Luís Marques

Diretor do MBA executivo da Católica Porto Business School

Ainda em termos de financiamento, em Portugal há suficientes incentivos a este tipo de formação? Os fundos europeus poderiam ter um papel mais relevante?

Sim, poderiam ser redesenhados nesse sentido. Existe um conjunto de fundos europeus que financia a formação. Mas numa perspetiva mais específica, como, por exemplo, um MBA, não existe qualquer tipo de incentivo público. Poderiam existir incentivos públicos. Poderiam existir também mecanismos de financiamento mais abertos, como existe nos Estados Unidos. Nos Estados Unidos, existem também empresas que financiam o MBA, mas com a garantia de que essas pessoas vão trabalhar nessas empresas.

Uma espécie de período de fidelização?

Isso mesmo. Forma-se um ecossistema. As pessoas têm acesso a tirar um MBA e, depois, a trabalhar nessas empresas, que oferecem uma expectativa de experiência profissional a quem tira um MBA muito relevante. Em Portugal, não temos muito esses ecossistemas. Temos empresas que financiam os MBA, mas este tipo de alunos estão já numa trajetória ascendente. São quadros superiores de organizações e as organizações investem neles. Mas no início de carreira, não existe esse ecossistema em Portugal como existe nos Estados Unidos.

Sobre os salários, muito se tem falado na saída dos mais jovens. E quanto aos gestores, temos condições para reter cá os melhores?

Portugal tem capacidade para reter os melhores. Se olharmos, por exemplo, para as empresas cotadas, o gestor português, nas suas necessidades higiénicas — naquilo que tem que ver com os bens materiais — está realizado. Existem muitos gestores em Portugal que estão muito motivados com os seus projetos. Numa perspetiva de futuro, acredito que toda esta geração de jovens, que são extremamente dotados de talento e têm saído de Portugal, regressará ao país para projetos profissionais, para os quais terão uma enorme aptidão, experiência e muito valor para criar. Esse fenómeno vai acontecer nos próximos dez anos. Quando isso acontecer, Portugal irá beneficiar daquilo que já falámos, na melhoria da qualidade de gestão.

Voltando à gestão dos recursos humanos, de que modo é que ter gestores com maior formação pode contribuir para a atração e retenção de profissionais, em vários setores?

Desde logo pelo exemplo da liderança. O líder, pelo seu estilo, pela sua personalidade, pela forma como se envolve com a sua equipa, é o principal fator de retenção e desenvolvimento de talento.

Mas os salários são o que mais pesa.

Sim, há um segundo fator que tem que ver com o package [pacote] remuneratório das pessoas. Dito de outra forma, o líder pode ser o melhor do mundo, mas se a pessoa não tiver… Aí existe um conjunto de práticas que, para além do salário, podem ser utilizadas nas organizações. Por exemplo, as recompensas de grupo. Se o grupo atinge um objetivo, ganham todos. Não atinge, ninguém ganha. Vemos também empresas em Portugal a começar a fazer experiências nesta área. São muito relevantes, sobretudo, para estas novas gerações, que são mais educadas e mais formadas, numa ótica de partilha.

O MBA executivo da Porto Business School está a comemorar 20 anos. O que está a mudar e vai mudar no futuro na formação de executivos em Portugal?

Há hoje uma perspetiva mais integral e holística de olharmos para a formação que discutimos. Temos de formar muito bem na área das finanças, do marketing, da sociologia e da estratégia. Mas há uma perspetiva mais holística. Temos de formar gestores que estejam no mundo e tenham uma perspetiva do mundo. As competências técnicas são muito relevantes, mas as competências humanas também o são. Estamos a formar gestores, mas estamos também a formar pessoas, que vão ter um impacto.

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