Vítor Palmela Fidalgo, diretor jurídico na Inventa, assegura que a “parca” inovação em Portugal não se relaciona com a regulamentação aplicável que considera ser “bastante robusta”.
Vítor Palmela Fidalgo, diretor jurídico na Inventa, é novo representante português para atuar como perito no Centro de Mediação e Arbitragem do Tribunal Unificado de Patentes. À Advocatus, assume que é um mandato de seis anos com “elevada responsabilidade” e que o objetivo é “realizar o melhor trabalho possível”.
Assegura ainda que a “parca” inovação em Portugal não se relaciona com a regulamentação aplicável que considera ser “bastante robusta”. “De acordo com o Global Innovation Index, Portugal tem vindo a melhorar em matéria de inovação. Porém, estamos ainda muito aquém do lugar que podemos ocupar”, sublinha.
Foi nomeado pelo Tribunal Unificado de Patentes como representante português para atuar como perito no Centro de Mediação e Arbitragem daquele tribunal. Em que consiste este novo desafio?
Trata-se de dar execução ao previsto no Acordo Relativo ao Tribunal Unificado de Patentes. Conforme é conhecido, o Tribunal Unificado de Patentes entrou em funcionamento no dia 1 de junho de 2023. Nos termos do Acordo, é também prevista a criação de um Centro de Mediação e Arbitragem de Patentes, que terá sede em Lisboa e em Liubliana (Eslovénia).
Uma vez que o Centro ainda não se encontra criado, o Tribunal Unificado de Patentes nomeou 11 peritos europeus, para, em conjunto com o Presidente do Centro, promover a sua instalação.
Qual vai ser o seu papel?
Em termos gerais, será auxiliar na elaboração das regras sobre mediação e arbitragem, escolher a lista de árbitros e de mediadores para apoiarem as partes nos litígios, promover quaisquer procedimentos burocráticos que sejam necessários para a instalação do Centro, bem como emitir parecer sobre as matérias pertinentes ao Centro.
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Como foi receber esta nomeação?
O convite foi formalizado em setembro de 2024 e oficializado em novembro do mesmo ano, sendo para mim uma grande honra. Afinal, o convite foi avalizado tanto pelas autoridades portuguesas quanto pelo Tribunal Unificado de Patentes.
Mas, ao mesmo tempo, com espírito de missão e compromisso. É um mandato de seis anos, com elevada responsabilidade. O objetivo é realizar o melhor trabalho possível.
Quais são as suas expectativas para este novo desafio?
As expectativas são elevadas. Existe um objetivo comum entre todos os peritos nomeados: tornar o Centro de Mediação e Arbitragem de Patentes do Tribunal Unificado o mais prestigiado centro em litígios de patentes a nível mundial. Só dessa forma será possível fazer jus ao prestígio de uma corte como o Tribunal Unificado de Patentes.
Para isso, é necessário realizar um estudo profundo de Direito comparado e verificar o estado da arte respeitante à atual regulamentação dos maiores centros de arbitragem e mediação em matéria de direitos de propriedade intelectual.
Haverá, ainda, que ter uma abordagem mais lata da competência do Centro, abrindo a possibilidade de submeter litígios não relacionado diretamente com direito de patentes, mas com matéria relacionadas e que apresentam algum tipo de conexão com uma patente unitária ou patente europeia, por exemplo, em matéria de software, segredos de negócios ou desenhos ou modelos.
Deve-se ainda permitir que o Centro possa intervir em questões parciais dentro de um determinado processo, por exemplo, no âmbito das denominadas FRAND, que visam garantir que o licenciamento de patentes essenciais seja conduzido de maneira justa, razoável e não discriminatória. Dada a natureza do litígio, penso que o Centro terá um papel significativo.
A parca inovação em Portugal não se relacionará com a regulamentação aplicável, que, não obstante necessitar sempre de melhorias, é bastante robusta.
Quais são os principais desafios da área de propriedade industrial em Portugal?
O principal desafio é, desde logo, que os nossos empresários entendam a importância da sua proteção para o sucesso de determinado negócio. Não podemos continuar a promover uma economia de baixo valor acrescentado. Temos de investir em mais inovação qualitativa, que possa ser exportada. Só assim conseguiremos subir o salário médio e alavancar a economia. Para um país como Portugal, com poucos recursos naturais disponíveis e de pequena escala, investir na economia do conhecimento é uma questão de “sobrevivência”. Mas, para isso, além da consciencialização de todos os interessados – empresários, setor público, justiça e utilizadores – é necessário que o poder político crie as condições necessárias para este ecossistema. E tal não passa apenas por subsidiar a inovação; vai além disso: é investir na formação técnica e na infraestrutura, estruturar o sistema fiscal para atender à economia do conhecimento, facilitar a interação entre universidades, politécnicos e o setor privado, além de melhorar o acesso ao financiamento para a inovação.
O Governo apresentou o Programa Acelerar a Economia e uma das medidas é a “revisão do Código da Propriedade Industrial”. Considera que esta revisão é necessária?
Diria que, de todas as medidas anunciadas pelo Governo, esta apenas se tornou urgente agora, devido à recente aprovação de diretivas europeias sobre a matéria, como aconteceu no caso dos desenhos e modelos.
Porém, é importante referir que o nosso código atual é recente, de 2018. Atento à importância da propriedade industrial, a dianteira legífera tem sido tomada pela União Europeia, havendo pouco espaço de manobra para o legislador português. Diríamos, de resto, que a parca inovação em Portugal não se relacionará com a regulamentação aplicável, que, não obstante necessitar sempre de melhorias, é bastante robusta.
Contudo, havendo a necessidade de transpor legislação europeia, é prudente aproveitar a oportunidade para realizar melhorias. E, de facto, há vários pontos a aperfeiçoar, especialmente em matéria de patentes e marcas.
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Quais são os aspetos essenciais que espera ver alterados?
Em primeiro lugar, é fundamental promover um procedimento de concessão de títulos de direito de propriedade industrial que, embora rigoroso, não se torne excessivamente burocrático a ponto de desmotivar os interessados ou prejudicar a proteção dos seus direitos. Além disso, é necessário reduzir as taxas para categorias estratégicas, como patentes verdes ou inovações tecnológicas de interesse público, e avançar na automação e digitalização dos processos administrativos, utilizando sistemas de inteligência artificial e blockchain.
Contudo, também existem questões substantivas a considerar, cujas regulamentações já estão presentes no Direito comparado, como, por exemplo, um regime jurídico para patentes com interesse na defesa nacional, um enquadramento legal que proteja o património cultural português contra a apropriação indevida por direitos de propriedade industrial, e a necessidade de clarificar algumas regras de direito processual, visando aumentar a eficiência e celeridade na tutela desses direitos.
Considera que esta medida pode de facto ajudar a “acelerar” a economia portuguesa?
Sem dúvida, que poderá contribuir. No entanto, como referi, a falta de inovação em Portugal não está relacionada com a legislação sobre Propriedade Industrial. De acordo com o Global Innovation Index, Portugal tem vindo a melhorar em matéria de inovação. Porém, estamos ainda muito aquém do lugar que podemos ocupar. E o principal culpado não será a legislação, mas sim a falta de um ecossistema que promova a constante inovação. Realizar eventos como a Web Summit tem algum impacto, mas não é, de todo, suficiente.
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Como está a ser o desafio profissional de diretor jurídico da Inventa?
Ser diretor jurídico da Inventa tem sido uma experiência transformadora. É um desafio que exige equilíbrio entre estratégia e execução, onde cada decisão não é apenas jurídica, mas também profundamente conectada aos objetivos de expansão da empresa.
Temos também construído uma empresa moderna, sempre atenta às necessidades técnicas e de gestão mais atuais. Por exemplo, para uma consultora de propriedade intelectual, é imprescindível investir em tecnologias de informação, incluindo ferramentas que incorporam inteligência artificial e tecnologia blockchain. A integração entre a tecnologia e a elevada formação técnica dos nossos colaboradores tem sido a marca distintiva da Inventa.
Que marca pretende deixar na Inventa?
O objetivo tem sido, desde sempre, colocar a Inventa como a consultora que presta melhores serviços de propriedade intelectual nos países onde tem escritório, desde logo, a começar por Portugal. Os objetivos têm sido conseguidos. Em alguns anos tivemos taxas de crescimento de mais 30%, o que é realmente notável para o setor onde atuamos. A Inventa já é uma referência no mercado, mas será ainda mais no futuro.
Em termos pessoais, o meu objetivo é deixar uma marca de excelência, ética, reputação e uma cultura de busca constante pelo conhecimento entre todos os que fazem parte da Inventa. Tenho a sorte de trabalhar ao lado de profissionais excecionais, intelectual inquietos e críticos, que todos os dias buscam melhorar e estar à frente do estado da arte. Este tem sido um dos segredos para o crescimento exponencial da Inventa.
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Qual foi o melhor conselho que lhe deram na sua carreira?
Tenho recebido diversos conselhos ao longo da minha carreira profissional, e gosto especialmente de ouvir. Tenho uma dívida de gratidão para com várias pessoas, seja pessoalmente ou por meio das suas obras, com as quais tenho aprendido. E não apenas de pessoas do Direito, mas de todas as áreas. Afinal, todos nós nos sentamos sobre os “ombros dos gigantes”. É assim para a inovação e, em geral, para todo o conhecimento.
Teria diversos conselhos para partilhar, mas não sou pretensioso a ponto de achar que são os melhores. Direi apenas um, que me parece especialmente relevante e que tenho procurado seguir ao longo da minha vida: a consistência e a disciplina são os pilares para alcançar resultados a longo prazo. No final, o sucesso é a soma de pequenos esforços repetidos dia após dia.
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“Não podemos continuar a promover uma economia de baixo valor acrescentado. Temos de investir em mais inovação qualitativa”
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