Criado nos anos 80 por um magnata grego, o EFG é o quinto maior banco privado da Suiça. Chegou a Portugal em 2019 e quer adicionar 250 milhões de euros por ano aos mil milhões que já tem sob gestão.
Num dia tipicamente chuvoso em Zurique, um CEO italiano que começou a carreira num colosso financeiro alemão fala ao ECO sobre o quinto maior banco privado suíço, que tem como maior acionista uma família cuja fortuna foi criada por um magnata grego do transporte marítimo, e que em Portugal acumulou mais de mil milhões de euros de ativos sob gestão em menos de meia década.
Na Bleichergweg 8, a sede do banco EFG International é um exemplo de decoração minimalista e moderna – luzes brancas, madeira clara, ângulos retos, pouca ornamentação. A intenção é mesmo salientar o contraste entre um banco privado que foi criado nos anos 80 do século XX e os concorrentes históricos, como o gigante UBS (criado em 1912), o Julius Baer (1890) ou o ainda mais antigo Pictet (1805).
Em entrevista, o CEO Giorgio Pradelli sublinha por diversas vezes o espírito “empresarial” e inovador do grupo, explicando inclusive que foi uma das razões pelas quais aceitou o convite para sair do gigante Deutsche Bank em 2003 para ir para a holding dos Latsis, o EFG Bank European Financial Group SA, que detém 45% do EFG International (o resto é detido em 18% pelo brasileiro BTG Pactual e 37% do capital está disperso em bolsa).
Conhecera “a família” em 1998, quando o banco alemão comprou 10% do grego Eurobank e em 2003 entrou no grupo, supervisionando a entrada em bolsa do EFG International, em 2005. Em 2012. foi nomeado CFO, deputy CEO em 2014, subindo ao cargo máximo do banco em 2018.
“Obviamente, tenho estado muito próximo da família, do grupo e diria que a razão pela qual deixei o Deutsche para vir, comparativamente, para um negócio relativamente pequeno, foi porque gostei muito deste espírito empreendedor, desta abordagem empreendedora”, afirma, recordando que na altura do IPO (sigla em inglês para a entrada em bolsa) em 2005 o banco tinha menos de 40 mil milhões de francos suíços (cerca de 43 mil milhões de euros) em ativos sob gestão e agora tem quatro vezes mais, ou seja, 160 mil milhões de francos (172 mil milhões de euros). A atração “foi essa oportunidade de crescer, de desenvolver, de causar impacto”.
Príncipes, presidentes e estrelas de Hollywood
Mas quem é esta família Latsis, que criou em pouco tempo um dos líderes da banca privada suiça? Quando faleceu em 2003, com 93 anos, os obituários nos jornais internacionais contaram a vida de Yiannis Latsis como uma história de “trapos para riqueza”. Nascido em Katakolo, uma vila de pescadores na região de Elis, era o sexto de nove filhos. Quando morreu, a Forbes colocava-o como 101º mais rico do mundo, com uma fortuna avaliada em 6,1 mil milhões de dólares.
Reza a lenda que fez o primeiro negócio quando ofereceu um peru a um professor em troca de uma nota melhor num exame. Frequentou a escola da Marinha e, durante os anos entre as guerras mundiais, passou de marinheiro a capitão, e depois começou a carreira como armador comprando um barco fretado. A partir daí tornou-se, a par de Aristóteles Onassis, um dos magnatas mais poderosos na Grécia, partindo do shipping para investimentos no petróleo, na refinação e na construção. O dinheiro e o poder deram-lhe visibilidade internacional e foi amigo do Príncipe Carlos (agora Rei, e a quem emprestou o seu super-iate Alexander), George Bush Sénior, Colin Powell e de atores de Hollywood, incluindo Marlon Brando.
As gerações seguintes continuaram a diversificar, e fazer crescer o império.
“O que acho fascinante nas famílias abastadas, de forma geral, é que obviamente conseguem, ao longo das gerações, continuar a ter um bom desempenho, a crescer e a diversificar-se”, vinca Pradelli, dando como exemplo o megaprojeto da Lamda Development – gerida por Spiros Latsis, filho do magnata – para reconverter os terrenos do antigo aeroporto Hellenikon de Atenas em apartamentos, escritórios, marinas e casinos, num investimento que ascende aos 8 mil milhões de euros.
Foi Spiros, da segunda geração, que foi chave na entrada para o setor financeiro, segundo Pradelli. A família Latsis mudara a sede da holding para Genebra ainda nos anos 70, um passo importante, e na década seguinte Spiros passara um longo período na área académica da economia e viu o potencial dos serviços financeiros.
A primeira investida foi a compra a Onassis de um pequeno banco em Genebra chamado Banque des Depôts, em 1980, seguindo-se aberturas no Luxemburgo, Londres, Mónaco e Atenas. “A ideia era que os serviços financeiros seriam um setor em crescimento, e para fazer isso é preciso que seja internacional”, diz o CEO.
No início, eram várias “startups”, explica, classificando o período das décadas de 80 e 90 como “great”. Mas o IPO em 2005 “foi o momento em que todos esses negócios de banca se uniram e criamos uma holding, que hoje é a EFG International, que é a entidade cotada em Zurique”.
“O que é particular na nossa forte estrutura é o facto de termos um acionista principal sem funções de gestão, que é uma família, que detém 45%, e uma gestão profissional, e de estarmos cotados em bolsa e isso é bastante interessante porque muitos bancos que são propriedade de uma família não estão cotados em bolsa, são privados.
Pradelli sublinha que até é normal bancos, e especialmente no segmento do private, terem ainda famílias como acionistas, dando os exemplos da família Safra no J.Safra Sarasin, dos Picciotto no UBP, os Rotschild ou os Pictet.
“O que é particular na nossa forte estrutura é o facto de termos um acionista principal sem funções de gestão, que é uma família, que detém 45%, e uma gestão profissional, e de estarmos cotados em bolsa”, sublinha o CEO. “Isso é bastante interessante porque muitos bancos que são propriedade de uma família não estão cotados em bolsa, são privados”.
Os três anos a seguir à entrada em bolsa foram “fantásticos”, incluindo com algumas aquisições, mas a crise financeira que eclodiu em 2008 teve impactos no banco, tal como no resto do setor. Depois de um período de reestruturação pós-crise, o marco seguinte é em 2016 com a assinatura da compra do rival suíço BSI por cerca de 1,07 mil milhões de dólares.
“Tínhamos feito muitas, muitas aquisições menores antes, mas esta foi grande porque era quase do mesmo tamanho e isso permitiu quase dobrar o negócio”, recorda Pradelli.
Após um período natural de integração, o EFG International entrou em ciclos trienais de “crescimento rentável e sustentável”, começando em 2019, ano em que abriu a atividade em Portugal.
Fortunas do Porto, Brazil e desporto
Em Lisboa, no oitavo piso do número 180 da Avenida da Liberdade, Bernardo Meyrelles conta ao ECO a história dos primeiros meses do banco em Portugal. Depois de mais de 14 anos no Deutsche Bank Portugal – dos quais os últimos sete como country manager – o gestor saiu no final de agosto de 2019, quando o negócio do banco alemão no país foi vendido ao espanhol Abanca. Contactado por um headhunter a 16 de setembro, a 20 desse mês estava em Zurique a falar com Pradelli e o resto do board, e a 24 é anunciada a contratação como country manager para Portugal. Porquê tanta pressa? “Porque o banco suíço tinha marcado o lançamento oficial a 26 desse mês, no Ritz de Lisboa”, explica.
Essa ambição de entrar no mercado de forma acelerada – que levou ao rápido crescimento da equipa de oito pessoas para um pico de 21 divididos entre escritórios no Porto e em Lisboa – tinha como meta chegar a mil milhões de ativos sob gestão ao fim de três anos (ou seja, no final de 2022) e 1,5 mil milhões em quatro ou cinco anos.
A vontade esbarrou, contudo, na pandemia de Covid-19 que chegou em março de 2020, provocando um atraso. “Mas chegámos aos mil milhões em quatro anos e não em três, e com oito bankers e não com 16 [como inicialmente previsto], portanto fizemos ligeiramente mais atrasado, um ano depois, mas com metade dos custos”, resume Meyrelles.
Questionado sobre como foi possível lançar um banco de gestão de fortunas, o gestor refere dois fatores determinantes. “Um foi que grande parte da equipa vinha comigo do Deutsche, e segundo, “mesmo à distância, porque não podíamos fazer eventos ou deslocações, tudo muito à base do telefone, conseguimos mesmo assim fazer muita prospeção, porque já tínhamos relações existentes com clientes que conseguimos trazer”. Com uma marca desconhecida e o crescimento do negócio a depender do track record da equipa, Meyrelles obteve autorização da casa-mãe para não exigir o milhão de euros como ponto de entrada para abrir conta dos clientes, “menos do que isso e, nalguns casos, bastante menos”, para poderem experimentar durante um ano a oferta, conhecerem a forma de trabalhar e depois darem um voto de confiança e aumentarem o relacionamento.
“E assim foi, ou seja, tivemos essa ascensão e fizemos muitas entradas de valores que hoje em dia seriam completamente impensáveis, mas era mesmo a forma de darmos entrada no mercado”, recorda.
Meyrelles salienta que a equipa começou desde logo a apostar numa estratégia de diferenciação face à concorrência, apostando em segmentos que estavam menos cobertos. “Por exemplo, entrámos nas fortunas do Norte, a partir do Porto, fomos para o mercado da riqueza que vinha para cá do Brasil, e porque já trazíamos essa experiência também do passado, a área desportiva”, diz, adiantando que mais recentemente acrescentaram a área da migração asiática para Portugal.
A nossa visão é conseguir, e é difícil, manter o nível de crescimento que temos tido nos primeiros quatro anos, ou seja, crescermos a uma média de 250 milhões euros por ano e manter este ritmo doravante.
Quanto ao futuro, o gestor diz que ainda não pode fazer o disclosure dos números para este ano, mas revela ambição. “A nossa visão é conseguir, e é difícil, manter o nível de crescimento que temos tido nos primeiros quatro anos, ou seja, crescermos a uma média de 250 milhões euros por ano e manter este ritmo doravante. É difícil, obviamente, porque são números muito robustos, mas é a ambição”.
Questionado sobre o potencial impacto de novos players virem ‘caçar fortunas’ no private banking em Portugal, nomeadamente com as possíveis entrada do Union Bancaire Privée, do Julius Baer ou do IndoSuez, Bernardo Meyrelles admite maior concorrência, mas salienta os aspetos positivos.
“Fico feliz exatamente de saber que o nosso banco tomou esta decisão de entrar há quatro anos e comprovar que foi mais uma decisão certa. Provavelmente, viram que tivemos bons resultados, que fomos os últimos a chegar e que ninguém mais saiu dos que já cá estavam e isso pode ter feito despertar algumas decisões de entrada”, explica. “Por um lado é bom porque também vai dar mais visibilidade a este tipo de bancos e abre-se maior pressão para conseguir captar muitos das fortunas que ainda estão residentes nos bancos de retalho”.
Em Zurique, Giorgio Pradelli diz que o grupo está muito satisfeito com a operação em Portugal, país que vê hoje como destino de atração de riqueza. “Acho que para nós também com Miami e Brasil isso pode funcionar muito bem, gostaríamos de aproveitar mais isso”.
“A minha pergunta é sempre: o que precisamos para duplicar o negócio?”, refere. “Esse é um pouco o espírito e o facto de novos players estarem a olhar para o mercado é uma indicação de que obviamente o mercado é atrativo”.
Admite, no entanto, que “obviamente não é um mercado fácil e há muita concorrência, mas se olharmos para outras franquias, acho que alcançamos certo tamanho num prazo relativamente curto, um período de tempo muito mais curto do que outros concorrentes”.
Sublinha, que “isso não significa que queremos parar, vamos tentar dobrar, precisamos fazer as coisas da maneira certa, mas sim, existem oportunidades”.
Polarização na banca
Tanto Pradelli como Meyrelles falam de forma prolongada sobre dois aspetos que têm sido cruciais para atrair e reter clientes.
“Um é o serviço, o serviço de topo e o serviço a 360º”, diz o CEO. “Por vezes, gosto de nos comparar com as marcas de luxo, porque os nossos clientes são os clientes que fizeram de Bernard Arnault o homem mais rico da Europa, e estão habituados a este tipo de experiência”.
A banca de retalho será cada vez mais direcionada para as máquinas e as infraestruturas e agora, com a Inteligência Artificial, grande parte da interação será automatizada e sem humanos.
“E eu vejo que nos serviços financeiros haverá cada vez mais polarização”, vinca. “A banca de retalho será cada vez mais direcionada para as máquinas e as infraestruturas e agora, com a Inteligência Artificial, grande parte da interação será automatizada e sem humanos”.
A tecnologia será também extremamente importante para o EFG, esclarece, mas adianta que em cima da tecnologia os clientes continuarão a querer a experiência e ter uma pessoa ou uma equipa de pessoas dedicadas às suas necessidades financeiras. O segundo fator é o que Pradelli chama de conteúdo, desenhado para ajudar essa equipa de 706 Client Relationship Officers (CRO, os tais “bankers”) que o banco tem espalhada por mais de 40 escritórios a nível global a oferecer soluções para os clientes.
Esse conteúdo resume-se a quatro soluções. O investiment solutions para clientes com elevado património líquido investirem os seus ativos. Para desenvolver essas soluções, o banco tem uma vasta equipa de analistas, também a nível global, liderada a partir de Londres pelo chief investment officer, Mozamil Azal.
“Em segundo lugar, aquilo a que chamamos soluções de património e planeamento de património para famílias abastadas e empresários dinâmicos que tendem a pensar em termos de gerações e na estruturação do património”, refere Pradelli. A terceira solução é a de crédito, especialmente para clientes que querem comprar ativos – como imobiliário – em diferentes jurisdições, enquanto a quarta é uma plataforma de trading para os investidores que optem por gerir o portefólio.
“Bem posicionados” para comprar
O ‘bolo’ da banca privada suíça é dominado pelo UBS, especialmente depois de ter integrado o Credit Suisse quando este colapsou em março de 2023. Segundo dados obtidos pelo ECO, o UBS no final de junho deste ano tinha 4.038 mil milhões de francos suíços sob gestão. Num segundo patamar surge o Julius Baer com 474 mil milhões, o Pictec com 268 mil milhões e o J. Safra Sarasin com 205 mil milhões.
O objetivo do EFG é crescer de forma sustentável e isso tem sido feito de forma orgânica, explica GIorio Pradelli, dando como exemplo o negócio em Portugal. “Mas, por outro lado, no passado e esperemos no futuro, as aquisições são uma forma importante, se forem bem efetuadas, de crescer também”, considera. “Venho do corporate, gosto de fusões e aquisições, penso que demonstrámos, com a integração do BSI, que somos capazes de integrar e é muito importante podermos criar valor após uma aquisição.”
“Por isso, para nós, as aquisições são importantes e temos critérios claros e os critérios geográficos. Só para sermos claros, tal como no caso do BSI, é importante adquirir empresas onde estamos presentes para aumentar a massa crítica de sinergias e continuar a crescer”, adianta. “Penso que estamos muito bem posicionados”, salienta.
Em Portugal, no entanto, a via de crescimento deverá continuar a ser orgânica. Bernardo Meyrelles diz que se houvesse algum alvo apetecível já o teriam visto. “Penso que não há nada que possa valer o esforço. Para adquirir são necessários muitos recursos e tem de valer a pena”, conclui.
*O jornalista viajou a Zurique a convite do EFG.
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De Atenas para Lisboa via Zurique. Banco privado EFG quer manter ritmo e captar 250 milhões ao ano em Portugal
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