A Apreciação Parlamentar do RGGR e do UNILEX
O valor da TGR não é em si mesmo um problema, só o é e será, se na base os sistemas municipais, intermunicipais e multimunicipais não fizerem o esforço que lhes é exigido para mudar o paradigma.
Uma das particularidades do nosso Estado de Direito reside na possibilidade do órgão que detém o poder executivo – Governo – exercer também o poder legislativo, não sendo o mesmo reserva absoluta da Assembleia da República.
Isto permite ao Governo legislar através de Decretos-Lei aprovados em Conselho de Ministros. No entanto, esta legislação emanada do seio do Governo, pode ser apreciada e alterada na casa do poder legislativo por excelência – o Parlamento. A elaboração de legislação desta forma acrescenta vicissitudes que se tornam, mais ou menos, visíveis consoante os Governos têm ou não uma maioria parlamentar de suporte. É o que sucede, presentemente, em relação ao Novo Regime Geral de Gestão de Resíduos (NRGGR) publicado no passado mês de dezembro através de Decreto-Lei do Governo.
Já aqui se escreveu variadas vezes sobre o novo regime de gestão de resíduos (RGGR) e sobre as alterações ao UNILEX das quais resultou a nova legislação. Sabe-se, também, que, no âmbito da apreciação parlamentar em curso da nova legislação foi constituído um grupo de trabalho no seio da Comissão de Ambiente da AR. Ora, estes desenvolvimentos são, novamente, uma oportunidade para assinalar aqui alguns dos pontos de pressão da legislação e abordar o que já se conhece das propostas de alteração entretanto apresentadas (BE e PSD).
Do debate parlamentar de apreciação parlamentar do diploma legal em questão (Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro) resultou claro, como aqui já se escreveu, que o Governo deveria ter encetado um debate público mais alargado em prazo e na forma em relação às alterações que foram efetuadas.
O prazo de transposição de diretivas, ultrapassado diga-se, teria permitido um debate com todos, de forma a projetar as próximas décadas na política relacionada com os resíduos urbanos no país. Essa oportunidade foi perdida, não deixando, contudo, de ser necessária, pois tudo aquilo que se tem feito não deixa de ser paliativo num setor que precisa urgentemente de uma abordagem mais profunda e vigorosa, para que o país possa entrar na vanguarda ambiental neste setor fundamental.
A janela de oportunidade, que esta apreciação parlamentar nos traz, permite introduzir pequenas melhorias, corrigindo e clarificando aqui e ali, pouco mais. Infelizmente, do que já se conhece as propostas dos partidos políticos referidos logra atingir este resultado. Se por um lado o BE assenta toda a sua proposta numa visão maniqueísta da produção de resíduos, em que os maus são as empresas e as industrias produtoras dos bens que a sociedade precisa e que o cidadão é o cândido explorado do capitalismo consumista, propondo-se, com isto, a “incinerar” o princípio ambiental do poluidor-pagador em toda a sua dimensão.
Para o BE o comportamento dos cidadãos encontra-se em estado ótimo e que não tem, também, ele de fazer um esforço de evolução nos seus maus comportamentos relacionados com a separação dos resíduos ou no desperdício alimentar. Neste cenário, e no limite, o pequeno agricultor que colocaria as suas maçãs e peras no mercado seria o responsável pelo facto do cidadão no recato do lar deixar apodrecer a fruta e enviá-la para o contentor do lixo, que por sua vez acabará num aterro qualquer a pagar TGR.
Quanto ao PSD a sua proposta peca, essencialmente, por falta de ambição. Após as críticas duras ao Governo no debate parlamentar, esperar-se-ia, profundas alterações ao Decreto-Lei referido, resumindo-se essencialmente a propor a redução da TGR a pagar.
Já aqui escrevi que o valor da TGR, não é em si mesmo um problema, só o é e será, se na base os sistemas municipais, intermunicipais e multimunicipais não fizerem o esforço que lhes é exigido para mudar o paradigma de recolha de resíduos e de destino final dos mesmos. Se nada mudar, obviamente, que o aumento da TGR é um problema nas contas destas entidades e consequentemente nas tarifas a repercutir nos cidadãos. Mas se e só se tudo ficar como está atualmente e aí nunca meta alguma em matéria de resíduos será alcançada.
Concluo com apenas duas questões que a legislação em discussão nada alterou ou alterou para pior e que até ao momento nenhum grupo parlamentar veio suscitar. Porque é que o valor do produto da TGR financia também a GNR e a PSP? Que parte do produto das coimas das contraordenações, relacionadas com o regime em causa, possa ser receita destas forças policiais na medida do seu trabalho nessa matéria, tudo bem.
Agora que a taxa de resíduos paga pelos municípios e cidadãos financie uma atividade de soberania como é a segurança pública já não se percebe. Porque é que as entidades (mais uma a somar às centenas já existentes) que se pretendem criar para gerir o sistema de reutilização de embalagens está proibida de assim que essas embalagens se tornem resíduos os possam entregar aos sistemas municipais de gestão de resíduos urbanos, que já têm uma rede de recolha, que por muito incipiente que seja se encontra montada, em todo o país? O que se pretende com a descapitalização com os sistemas de gestão de resíduos urbanos?
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