
A guerra tarifária dos EUA como resposta à perseguição da UE das BigTech?
Não se pode negar o ambiente competitivo entre os blocos ocidentais e que o poder de mercado das BigTech prejudica a capacidade competitiva das empresas tecnológicas europeias a nível mundial.
O Presidente dos EUA, Donald Trump, disse que a União Europeia “não tem sido justa” nas suas práticas comerciais e chamou o bloco de “hostil e abusivo”. E, seguidamente, os EUA subiram as tarifas alfandegárias em 20% para os produtos importados da UE. Ursula von der Leyen já prometeu retaliar os EUA com contramedidas. “Extraordinary times,” clamou a presidente da Comissão Europeia, “call for extraordinary measures”.
Nem sempre é clara a motivação para uma guerra tarifária. Tradicionalmente, são formas de protecionismo e de aumento de receita. Mas os EUA têm invocado adicionalmente a perseguição que as empresas tecnológicas têm sofrido às mãos da Comissão Europeia, como autoridade de concorrência. Não surpreende que, já em 2025, Mark Zuckerberg, presidente do conglomerado Meta, tenha apelado a que Donald Trump influenciasse a UE de modo a que esta deixasse de multar as empresas de tecnologia norte-americanas.
É verdade que, para usar um termo da época, os processos de antitrust têm sido um autêntico calvário para as BigTech norte-americanas. Só nos últimos anos, a Comissão Europeia aplicou, no total, mais de 10 mil milhões de euros a empresas norte-americanas, nos processos Google/Android, Google Shopping, App Store da Apple, Google AdSense, Intel ou Facebook Marketplace.
Existem ainda outras ferramentas na toolbox da UE. De pendor protecionista, o Regulamento que analisa os investimentos diretos estrangeiros na União pretende controlar as subvenções, concedidas por governos de países terceiros, que podem distorcer a concorrência e o mercado interno. Outro exemplo é dado pelos Regulamentos de Serviços e de Mercados Digitais, que pretendem garantir mercados digitais abertos e equitativos, através do controlo das plataformas online de grande dimensão que sejam qualificáveis como gatekeepers.
Na UE, o direito da concorrência tem vindo a ser considerado a solução fácil e disponível para disciplinar a esfera digital, tipicamente sub-regulada. Daqui resulta um desajuste face à sua vocação de assegurar o bem-estar do consumidor, apesar deste conceito já muito ter evoluído desde a escola de Chicago, nos anos 1970. O antigo consenso neoclássico, limitado ao bem-estar dos consumidores, já não é viável em face dos desafios colocados pelos modernos mercados digitais com que se deparam as autoridades de concorrência.
Não se pode negar o ambiente competitivo entre os blocos ocidentais e que o poder de mercado das BigTech prejudica a capacidade competitiva das empresas tecnológicas europeias a nível mundial. Como adverte Mario Draghi, no seu relatório sobre a competitividade da UE, o bloco europeu corre o risco de perder a revolução da inteligência artificial, a não ser que auxilie as suas empresas a competir. Reconhecendo esta lacuna ao nível da inovação digital, a Comissão Europeia lançou a “Bússola para a Competitividade”.
É indiscutível que o enforcement acrescido das autoridades de concorrência sobre as BigTech choca de frente com o agudizar das tensões geopolíticas e com a agressividade dos EUA que pretende defender as suas empresas tecnológicas, nomeadamente através das tarifas alfandegárias. Mas a suposta defesa das empresas tecnológicas americanas como razão para aumentar as tarifas é só mais uma, a juntar ao rol de outras motivações, como o controlo de fronteiras e do tráfico de droga, défices tarifários, a venda do TikTok ou as ambições territoriais do Presidente dos EUA.
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