As eleições e o futuro da democracia portuguesa

No dia 10 de Março, há uma escolha entre a continuidade do que foi o mau funcionamento do governo e a mudança para uma proposta que traz consigo uma esperança num futuro melhor.

Portugal é uma democracia consolidada que vai a votos no próximo dia 10 de Março. A grande vantagem do sistema democrático, como Popper sublinhou, é que permite desalojar quem está no poder sem verter sangue e mudar para uma proposta concorrente.

Por isso estas eleições são uma boa oportunidade para comprovar na prática o argumento de Popper de que uma mudança em Portugal consolida a democracia e de que a continuação dos mesmos de sempre apenas a atrofia.

Além da sua função de desalojar governantes incompetentes, o sistema democrático assenta na soberania do povo, em que todos se encontram nas mesmas circunstâncias independentemente do interesse que tenham pelas eleições, e na aceitação pela comunidade das suas regras. É este o sistema democrático que vai agora a votos e que tem como base mais profunda e essencial a liberdade que existe em Portugal, como a Freedom House bem avalia.

Reunidas que estão as condições necessárias para a sua realização, as eleições do próximo dia 10 deveriam centrar-se na discussão de propostas alternativas para que os eleitores pudessem escolher a que percepcionassem como melhor de acordo com a sua ideia para o país. Infelizmente não é assim que funciona a democracia.

Discute-se pouco as propostas alternativas e muito os candidatos e as tácticas pré e pós-eleitorais. A responsabilidade por esta forma de funcionamento da democracia é partilhada por partidos políticos, pela comunicação social, que tem a função de transmitir a discussão sobre as propostas aos eleitores, e pelos próprios eleitores, que se dividem entre os que não se ralam com as eleições, os que não se ralam com as propostas e os que estão realmente preocupados em discutir soluções para o futuro de Portugal (infelizmente, uma minoria).

Discute-se pouco as propostas alternativas e muito os candidatos e as tácticas pré e pós-eleitorais. A responsabilidade por esta forma de funcionamento da democracia é partilhada por partidos políticos, pela comunicação social, que tem a função de transmitir a discussão sobre as propostas aos eleitores, e pelos próprios eleitores, que se dividem entre os que não se ralam com as eleições, os que não se ralam com as propostas e os que estão realmente preocupados em discutir soluções para o futuro de Portugal (infelizmente, uma minoria).

Churchill disse: “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita …. De facto, tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, à exceção de todas as outras formas que têm sido experimentadas de tempos a tempos…“. A frase, já muita citada, aplica-se muito bem ao funcionamento do sistema democrático.

Para além da campanha estar desfocada do mais importante são várias as deficiências identificadas no sistema democrático em Portugal. O Índice da Democracia, publicado pela Economist Intelligence Unit, indica o mau funcionamento do governo, a baixa participação política e a reduzida cultura política como os principais problemas com que Portugal se defronta e que o colocam afastado da média dos restantes países da Europa Ocidental.

Os três problemas estão certamente ligados entre si e alimentam-se mutuamente. Em Portugal foi o mau funcionamento do governo que levou a estas eleições. O actual primeiro-ministro demitiu-se por estar envolvido e rodeado de incompetência, diversos escândalos, ilegalidades e abusos de poder.

A reduzida cultura política é outro factor que não permite que, mesmo entre os que se interessam por política, haja uma discussão séria sobre as propostas. Esta lacuna é ainda agravada pelo facto de a discussão séria interessar pouco a quem deixa o governo porque funciona mal. São os que querem a mudança que têm mais interesse em comparar propostas.

Há excepções, claro está, mas são raras, e é a falta de cultura democrática que permite que as propostas sejam substituídas por discursos “políticos” em que a mentira está frequentemente presente. O caso mais evidente em Portugal é o corte de salários, de apoios sociais, de pensões e o aumento de impostos que os socialistas continuam a dizer ter sido feito com a “troika”, quando na realidade começaram com o próprio Partido Socialista. Passados 13 anos desde que os socialistas cortaram salários, pensões e apoios sociais, e que aumentaram impostos, ainda continuam a dizer que não o fizeram e a acusar os adversários de o ter feito.

A impunidade na mentira continua porque quem tem de esclarecer a verdade ou é interpretado como estando a mentir, como acontece com os adversários visados pelo PS, ou então porque não o faz convenientemente e com a insistência necessária. E é lamentável que muitas vezes a mentira tenha passado impune com a conivência de alguns jornalistas (não todos), cujo papel deveria ser noticiar para que a população conhecesse a verdade.

A impunidade na mentira continua porque quem tem de esclarecer a verdade ou é interpretado como estando a mentir, como acontece com os adversários visados pelo PS, ou então porque não o faz convenientemente e com a insistência necessária. E é lamentável que muitas vezes a mentira tenha passado impune com a conivência de alguns jornalistas (não todos), cujo papel deveria ser noticiar para que a população conhecesse a verdade.

Esta forma de fazer política, o mau funcionamento do governo e a reduzida cultura política levam ao terceiro problema, a baixa participação das pessoas e o nivelamento por baixo da exigência com o funcionamento do sistema democrático. Como soubemos esta semana pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, 80% dos portugueses que podem votar não confia nos partidos nem nos políticos, e metade das pessoas não vota habitualmente, sendo que nas eleições para o Parlamento da UE são menos de 30% os que escolhem partidos.

Neste contexto, é natural que muitos eleitores se afastem ou se sintam defraudados e escolham para o seu voto os partidos que são contra o “sistema”, sem reconhecerem que é o próprio sistema, que não é mais do que a democracia, mesmo com o seu deficiente funcionamento, que lhes dá um instrumento para repor a verdade.

Os partidos que beneficiam com o protesto são os que contestam a democracia representativa e querem acabar com ela ou querem mudar o “sistema”. PCP, Chega, Bloco de Esquerda e Livre são contestatários de forma diferente, mas todos apelam à “pureza” dos seus valores como motivação para mudar as regras do jogo democrático.

Num caso apelam a uma quarta república que permita “limpar Portugal” e nos outros pretendem impor um sistema que aparentemente é democrático, a democracia directa, mas que, tal como o voto com o braço no ar, não preenche as condições necessárias para o funcionamento de democracia – as suas regras não são consensuais nem aceites pela comunidade – e presta-se facilmente a ser instrumentalizado pela manipulação dos sentimentos dos eleitores, limitando a sua soberania individual.

Se retiramos o PAN, que é uma espécie de partido assexuado que não tem conteúdo definido fixo e vai navegando as ondas da conveniência, sobram PSD, CDS, PS e IL, os partidos que não querem um sistema diferente da democracia representativa e que aceitam as suas regras baseadas na livre e soberana participação de todos os portugueses.

São as propostas destes quatro partidos que estarão em causa no dia 10 de Março. É uma escolha entre a continuidade do que foi o mau funcionamento do governo e a convocação antecipada de eleições, e a mudança para uma proposta que traz consigo uma esperança num futuro melhor para a democracia portuguesa.

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