
Banco bom e banco mau ou banco péssimo e banco mau?
Os primeiros tempos do NB foram marcados pela expectativa duma venda em meados de 2015. Uma promessa do anterior Governo em linha com a embusteada da saída limpa.
Os últimos anos do universo do BES foram marcados por má gestão, gestão danosa e gestão fraudulenta. A escalada desta trágica gestão foi também o resultado de uma passiva e deficiente supervisão bancária. No dia em que o país conhecer o relatório da auditoria que avaliou as decisões e atuação do Banco de Portugal (BdP) na supervisão do BES, perceberá que muitas responsabilidades não foram sacadas e que alguns responsáveis passaram impunes.
Com o BES incapaz de cumprir os rácios mínimos de capital para continuar a operar, o governador do BdP anunciou no início de agosto de 2014 a criação do Novo Banco (NB). Uma capitalização de 4.900 milhões de euros através do Fundo de Resolução (FdR), na decorrência do processo de resolução. Garantiu que o património “bom” do BES passaria para a nova instituição bancária, mas sem ativos tóxicos.
O ex-primeiro ministro Passos Coelho manifestou o apoio do Governo e acrescentou que a solução encontrada oferecia as maiores garantias de que os contribuintes não seriam chamados a cobrir as perdas da má gestão do BES. Logo de seguida, a ex-ministra das Finanças Maria Luís Albuquerque veio garantir que os contribuintes não teriam de suportar quaisquer custos.
Infelizmente, a curta vida do NB mostra que assim não foi. Acumula cerca de 6.000 milhões de euros de prejuízos ao fim de cinco anos, em grande parte devido ao registo de 6.000 milhões de euros de imparidades dos ativos herdados do BES!
É aqui que surge a pergunta que todos os portugueses querem ver respondida: por que razões estes ativos tóxicos não ficaram no banco “mau”? Quem decidiu passar estes ativos tóxicos para o NB? Que créditos são estes? Como foram concedidos? Quem são os beneficiários reais?
Os primeiros tempos do NB foram marcados pela expectativa duma venda em meados de 2015. Uma promessa do anterior Governo em linha com a embusteada da saída limpa. Apesar das propostas em cima da mesa, em agosto desse ano o anterior governo desistiu do processo de venda, adiando com isso uma mais que necessária injeção de capital.
Estávamos em pré-campanha para as eleições legislativas e a eventual venda do NB obrigaria Passos Coelho, Maria Luís Albuquerque e Paulo Portas a contarem a verdade das contas do NB e a assumirem responsabilidades na resolução desastrosa do BES. Por razões de agenda eleitoral, decidiram adiar o processo de venda, renovando a garantia que os contribuintes não seriam chamados a cobrir prejuízos.
Foi na altura que o BdP anunciou que o FdR tinha acabado de contratar Sérgio Monteiro, ex-secretário de Estado do anterior governo, para liderar a venda do NB. Uma decisão articulada com a Associação Portuguesa de Bancos e tomada dias antes da tomada de posse do atual governo! A cumplicidade de Passos Coelho, Maria Luís Albuquerque, Paulo Portas e Assunção Cristas e Carlos Costa na resolução do BES e no adiamento da venda do NB levaram o governador a concertar apressadamente a contratação de Sérgio Monteiro, uma vez que uma inesperada nova maioria parlamentar estava prestes a formar governo e isso estava fora dos prognósticos dos ex-governantes e do governador. Não esquecer que Sérgio Monteiro recebeu 458.000 euros pelo serviço e gastou ao BdP perto de 16 milhões de euros em assessorias e afins.
Em dezembro desse ano, por força do adiamento do processo de venda, o NB estava descapitalizado e prestes a incumprir os rácios regulatórios mínimos, isto é, à beira da insolvência, colocando em causa os depósitos e a estabilidade do setor financeiro. Em resposta, o BdP socorreu-se duma desastrosa operação de recapitalização interna através da retransmissão para o BES de direitos de obrigacionistas seniores no valor de 2.000 milhões de euros que, entretanto, tinham sido transmitidos para o NB por altura do seu balanço inicial. Esta operação lesou investidores e causou danos reputacionais ao nosso país.
Nos 21 meses seguintes e até à sua venda, o NB foi acumulando prejuízos e encontrava-se novamente com necessidades de capital, sob pena de caminhar vertiginosamente para a insolvência. A venda do banco era inadiável. Se a venda falhasse o NB teria de ser liquidado, com impacto incomensurável nas contas e na credibilidade do Estado e do sistema financeiro, para além da criação duma nova geração de lesados. A nacionalização não tinha cobertura da legislação europeia e levaria à injeção imediata de 5.000 milhões de euros no capital do banco, para além do empréstimo de 3.900 milhões de euros já concedido ao FdR por altura da constituição do NB.
Foi, portanto, no mandato deste Governo que o NB foi vendido ao concorrente escolhido pelo BdP, com base no processo negocial conduzido por Sérgio Monteiro. A venda do banco importou uma capitalização de 1.000 milhões de euros por parte da Lone Star e à criação dum mecanismo de capital contingente (MCC) que obriga o FdR (entidade pública financiada pelos bancos) a capitalizar o NB sempre que as perdas as perdas relativas aos ativos submetidos ao MCC representem uma descida dos rácios de capital abaixo dos níveis exigidos. Perante os prejuízos de 2018, o NB vai pedir dinheiro ao FdR. Por sua vez, o FdR terá de pedir emprestado ao Estado, que será ressarcido pelas contribuições que os bancos pagam anualmente para o FdR.
Na apresentação dos resultados de 2018, o presidente da administração optou por dividir a instituição financeira em “NB recorrente”, aquele que centraliza 78% dos ativos, e “NB legado”, onde estão os ativos tóxicos que têm gerado brutais imparidades. Não foi uma separação inocente. Por um lado, permitiu à administração anunciar que o “NB recorrente” obteve um resultado positivo. Mas por outro lado, a administração veio reconhecer que o NB incorpora um banco “bom” e um banco “mau”.
Há um banco “mau” no NB que deveria ter ficado no BES.
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