Controlo de subvenções estrangeiras que distorcem o mercado interno e o seu impacto no mercado de M&A

  • Nuno Marques
  • 24 Abril 2023

A criação de um mecanismo de notificação prévia de concentrações terá um impacto evidente em todas as transações de M&A, em termos de tempo para a conclusão de transações e em termos da incerteza.

O Regulamento (EU) 2022/2560 do Parlamento Europeu e do conselho, de 14 de dezembro de 2022, relativo a subvenções estrangeiras que distorcem o mercado interno, em tudo aparenta tratar-se de um diploma inovador, que pretende abordar um tema de extrema relevância para o mercado interno da UE, com recurso a mecanismos familiares (i.e. controlo de concentrações à luz do direito da concorrência).

Muito embora a UE tenha há já muito implementado um sistema sofisticado e eficaz de regras relativas a auxílios estatais que visam combater as distorções no mercado interno causadas por subvenções concedidas pelos Estados-Membros, as subvenções de países terceiros não tinham qualquer sistema idêntico, escapando assim às regras aplicáveis aos auxílios estatais de dentro da UE, com potencial de comprometer as condições de concorrência equitativas na UE.

É nessa medida que o Regulamento pretende nivelar as condições de concorrência dentro do mercado interno, ao criar procedimentos de análise oficiosa, notificação prévia de concentrações e de adjudicação de contratos públicos relativamente a entidades que tenham recebido subvenções estrangeiras.

Sem prejuízo do mérito e da intenção do Regulamento, com uma missão tão importante num tema há tanto a necessitar de regulamentação, o mesmo não surge sem levantar algumas preocupações.

Em primeiro lugar, a criação de um mecanismo de notificação prévia de concentrações terá um impacto evidente em todas as transações de M&A, quer em termos de tempo para a conclusão de transações, quer em termos da incerteza gerada pela inclusão de mais uma condição precedente sujeita à decisão da Comissão, a qual poderá proibir a concentração ou aprovar sujeita à adoção de compromissos.

Por outro lado, para além da obrigatoriedade de notificação de futuras operações de concentração, a Comissão deverá também ter a possibilidade de proceder, por sua própria iniciativa, a uma análise das concentrações já realizadas. Esta competência da Comissão gera uma considerável incerteza jurídica quanto a transações passadas, na medida em que fica no poder da Comissão, num extremo, proibir uma concentração já concluída.

Esta preocupação é ainda mais relevante se tivermos em consideração que, muito embora o Regulamento seja aplicável a partir de 12 de julho deste ano, terá efeito sobre as subvenções estrangeiras concedidas desde 12 de julho de 2018.

Lê-se no preâmbulo do Regulamento que “Por razões de segurança jurídica, é conveniente que o período durante o qual a Comissão tem a possibilidade de investigar uma subvenção estrangeira seja limitado a 10 anos a contar da data de concessão dessa subvenção”, no entanto, parece estar a ser ignorado o que implica um período tão extenso como 10 anos, no mercado de M&A.

Tendo em conta que a Comissão, quer à luz das suas competências de análise oficiosa, quer à luz da análise de concentrações passadas, poderá aplicar medidas corretivas tais como o desinvestimento de determinados ativos ou até a exigência de dissolução da concentração em causa pelas empresas, apenas podemos imaginar o impacto destas medidas quando as transportamos para um período de 10 anos de M&A – por exemplo num cenário de uma empresa que recebeu uma subvenção estrangeira há 10 anos, e que já passou por dois ou três investment cycles de fundos de investimento, os quais por sua vez já foram totalmente liquidados.

  • Nuno Marques
  • Of counsel da TELLES

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