Os gigantes digitais começam finalmente a pagar aos media

O aperto legislativo de Bruxelas começa a fazer efeito: Em França a Google chegou a acordo com os jornais e, no Reino Unido, o Facebook decidiu pagar para licenciar artigos de imprensa.

É o primeiro resultado relevante da diretiva dos direitos de autor aprovada pela União Europeia em 2019: a Google vai pagar aos publishers franceses perto de 150 milhões de euros em três anos para garantir que não existem processos contra ela pela utilização das notícias no seu motor de pesquisa. O acordo é complexo e inclui diversas alíneas, mas vai inevitavelmente servir de referência para o resto da União Europeia.

Tal como tinha escrito aqui há dois meses, era uma questão de semanas até a Google chegar a um acordo para pagar o que é devido. Tudo isto foi motivado pela transposição que o governo francês fez da diretiva dos direitos de autor (que motivou inclusivamente uma sentença judicial contra o gigante americano), e era importante para a empresa que este acordo não ficasse diretamente associado a uma leitura da lei. Por isso criou-se um subterfúgio relacionado com novas formas de promover informação de qualidade – mas o que interessa aos publishers serão os milhões que vão entrar anualmente nos seus cofres. E é importante entender que tudo isto decorre na lógica de apoio que a Google tem demonstrado para com os publishers, o que lhe tem garantido menos anticorpos na indústria do que por exemplo o Facebook. Resta agora que os restantes países da União saibam buscar inspiração na legislação francesa para que as empresas jornalísticas tenham acesso aos mesmos direitos. E o caminho fica aberto para que haja mais justiça na gestão dos conteúdos digitais.

No Reino Unido, que está prestes a abandonar a União, as leis digitais são também filhas das originadas em Bruxelas, tendo algumas até sido adaptadas numa forma mais restritiva. O regulador digital britânico já tinha anunciado que iria intervir no domínio do mercado de publicidade digital por parte do Facebook e da Google, e agora a empresa de Zuckerberg antecipou-se para tentar acalmar mais ímpetos legislativos.

A rede social vai pagar vários milhões de libras por ano a um grupo de publishers, licenciando os seus artigos para aparecerem na nova área de notícias que vai surgir em janeiro. Guardian, Mirror, Independent, Economist e todos os líderes regionais já lá estão, e outros querem agora entrar. Como de costume, a rede social vai aproveitar uma empresa externa para fazer a curadoria dos artigos selecionados, mantendo ao mesmo tempo uma seleção algorítmica de artigos adaptada a cada utilizador – o que continuará a fomentar a sua gigantesca máquina algorítmica e, a longo prazo, piorar a relação entre títulos e meios de comunicação.

São obviamente boas notícias para os meios de comunicação credíveis. Mas isso não pode ser confundido como um modelo de negócio ou sequer uma estratégia. Antes que os média se habituem demasiado a subsídios, devem aproveitar a adesão dos leitores motivada pelo covid-19 e seguir o caminho da fidelização. Isso implica ouvir e corresponder a necessidades dos seus utilizadores, e infelizmente a experiência tem demonstrado que a maioria dos média raramente se disponibiliza a escutá-los. E os governos têm de fazer a sua parte, regulamentando devidamente onde podem. Portugal, que ainda não transpôs a diretiva, terá muito a aprender com este caso francês.

Ler mais: Embora tenha sido escrito antes da diretiva dos direitos de autor, este Digital Dominance é uma coleção de ensaios que funciona como base de informação para a forma como os gigantes digitais impactam a economia, a política e as sociedades onde atuam.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Os gigantes digitais começam finalmente a pagar aos media

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião