Os sócios das sociedades são os únicos a pagar impostos por rendimentos que não recebem
Com toda a frontalidade, nós as sociedades de advogados, cada vez mais não nos sentimos representados na nossa Ordem, que parece já não querer ser de todos os Advogados...
Exm.ª Senhora Ministra da Justiça,
Exm.ºs Colegas,
Permitam-me que comece por agradecer a disponibilidade da Ministra da Justiça para abrir o nosso XIII Encontro Nacional. Muito obrigado S.ª Ministra, é importante tê-la aqui, até pela comparação com o passado.
Este nosso Encontro vai ter 4 importantes Painéis, com temas dos mais relevantes nos momentos atuais.
Já tivemos a oportunidade de discutir as novas tecnologias e a introdução de ferramentas de IA na advocacia, a grande dificuldade de procura e retenção de talentos nas novas gerações, os problemas fiscais das sociedades de advogados ou as novas formas de trabalho que todas estamos a vivenciar, entre muitos outros temas.
Este ano trouxemos dois assuntos bem atuais, como as consequências das recentes alterações legislativas nas sociedades de advogados, entre as quais, as alterações ao regime das sociedades de profissionais, a introdução das novas sociedades multidisciplinares, a alteração radical dos atos próprios dos advogados ou do regime de estágios. Tudo alterações que estão a provocar uma profunda reflexão das nossas Associadas, senão mesmo já algumas alterações na sua forma de atuar no mercado. Também trazemos para o debate o pacote de transparência que o Governo anunciou, em especial a introdução da regulamentação do regime do loby, com as possíveis implicações nas sociedades de advogados, principalmente em conjunto com a diminuição dos nossos atos próprios e a criação de sociedades multidisciplinares.
Tudo relevantes alterações que pecam pela pouca discussão com que foram brutalmente introduzidas na lei, no final do ano passado, ao arrepio de uma discussão profícua e séria entre os que a vão aplicar. Urge repensar estas alterações, para o que a ASAP fica disponível.
Pena que entre tantas alterações não se tenha também avançado para a tão desejada alteração do sistema fiscal das sociedades de advogados, abandonando um sistema retrógrado, desfasado da realidade e iníquo, pelas profundas desigualdades que potencia e pela concorrência desleal que permite, agora ainda mais agudizado com as sociedades multidisciplinares, mais umas sociedades de profissionais a quem este sistema não se aplica! Não se pode pretender tratar as sociedades de advogados como empresas para algumas mudanças de regimes dos advogados, mas impedir que elas possam aceder ao sistema fiscal geral das empresas! Os sócios das sociedades de advogados são os únicos obrigados a pagar impostos por rendimentos que não recebem! É necessário acabar com esta situação!
Vamos hoje ainda discutir dois outros temas igualmente relevantes: a advocacia societária no feminino, uma realidade crescente dos dias de hoje que está a mudar a advocacia para melhor, bem como, o tema da comparação entre a advocacia em prática individual e a integrada em sociedade, havendo obviamente lugar para as duas, mas sendo manifestamente diferentes. Sei bem do que falo, pois eu próprio exerci advocacia ao longo da minha vida profissional nessas duas formas.
S.ª Ministra, pode olhar para a ASAP e para as sociedades de advogados como parceiros na construção da advocacia do futuro. Outros têm-se afirmado como um permanente problema. Nós queremos antes fazer parte da solução!
É o momento para repensar o regime do acesso ao Direito, direito constitucional fundamental, onde os advogados são uma peça essencial na defesa do Estado de Direito. Mas o modelo que vigora é manifestamente pernicioso, incapaz de garantir uma assistência jurídica de qualidade, aprisiona a Ordem e funcionaliza a profissão, que devia ser essencialmente livre e independente. Existem soluções em outras jurisdições que as sociedades de advogados gostavam de ver discutidas. Garantir o acesso ao Direito é uma missão de serviço público do Advogado, não pode ser transformada na garantia do rendimento mínimo do Advogado!
Infelizmente a nossa Ordem tem-se comportado, neste e noutros assuntos relevantes, com um voz mais sindical do que de uma verdadeira Associação Pública de todos os Advogados, não potenciando a discussão de modelos alternativos, nem elevando a dignidade da profissão.
Com toda a frontalidade, nós as sociedades de advogados, cada vez mais não nos sentimos representados na nossa Ordem, que parece já não querer ser de todos os Advogados…
Só as associadas da ASAP representam mais de 6 mil advogados, com dedicação a tempo inteiro à advocacia. Dando ainda emprego direto e indireto a outros tantos. São responsáveis por um volume de negócios já não negligenciável para o nosso PIB.
As sociedades de advogados em Portugal estão na vanguarda dos serviços jurídicos, investindo nas pessoas e na tecnologia, assegurando o Estado de Direito, exportando serviços para o Mundo lusófono, acompanhando as empresas portuguesas na sua expansão. Não nos vemos menos que as melhores do Mundo Anglo-saxónico ou do resto da Europa, antes estamos a par das melhores práticas internacionais, procurando sempre um serviço de excelência ao Cliente e ajudando ao desenvolvimento da economia portuguesa.
Não podemos ser ignoradas nem pela nossa Ordem, nem pelo nosso Governo!
Infelizmente a ASAP está arredada de importantes discussões sobre o futuro da advocacia e do sistema de Justiça. Não fomos chamados, por exemplo, para a Comissão criada para discutir o futuro da nossa previdência. Espero que depois não nos venham bater à porta para pagarmos uma solução na qual não acharam por bem ouvir-nos…
S.ª Ministra, o Seu cargo nunca foi fácil e cada vez é mais difícil nos dias que correm, com problemas cada vez mais sérios, fruto da apatia do passado sobre o setor da Justiça que deixou crescer os problemas sem os resolver.
Neste momento de grandes desafios, queremos aqui deixar-lhe uma palavra de apoio, especialmente quando outros que o deveriam fazer o não fazem: a ASAP está disponível para ajudar na procura de soluções, a bem de uma melhor Justiça e de um melhor desenvolvimento económico do país. Connosco pode contar!
Nota: Esta opinião consiste no discurso de abertura de José Luís Moreira da Silva, no encontro anual da ASAP.
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