Os trabalhos complementares nas empreitadas de obras públicas

  • Nelma Pires
  • 27 Maio 2024

O que se pretende acautelar é que adjudicação ao mesmo empreiteiro não comprometa a necessidade de assegurar a permutabilidade ou interoperabilidade com equipamentos, serviços ou instalações.

A existência e a adjudicação de trabalhos complementares são uma realidade dos contratos de empreitada de obras públicas. Todos o sabemos. E todos sabem como a sua execução impacta o contrato celebrado pelo acréscimo de custos e prazo da obra. Por isso é com atenção que se deve olhar para este regime.

O regime dos trabalhos complementares foi sendo sucessivamente alterado nas diversas modificações ao Código dos Contratos Públicos, mas a verdade é que algumas dessas alterações corresponderam a questões de terminologia, ficando, por isso, “aquém” do desejado e do necessário. Só com a alteração introduzida pela Lei n.º 30/2021 de 21 de maio, e posteriormente complementada pelo Decreto-Lei n.º 78/2022, de 7 de novembro, é que se assistiu à desejada e verdadeira transposição da Diretiva Comunitária 2014/24/EU, em concreto, a alínea b) do n.º 1, do artigo 72.º para o ordenamento jurídico nacional, contribuindo, desta forma, para o quadro “menos complexo” que hoje vigora.

O atual n.º 1 do artigo 370.º apela finalmente à necessidade de execução destes trabalhos, para a realização do contrato. Determina expressamente o normativo que são trabalhos complementares aqueles cuja espécie ou quantidade não esteja prevista no contrato e cuja realização se revele necessária para a sua execução. A exigida necessidade de execução para a concretização do contrato é fundamental para acautelar e controlar os custos da despesa pública. Não nos esqueçamos que os trabalhos complementares convocam a admissibilidade da adjudicação de trabalhos adicionais ao mesmo empreiteiro sem procedimento concursal prévio. É, portanto, a exigência e a confirmação desta necessidade dos trabalhos que dá efetiva e verdadeira garantia ao princípio da concorrência e confere transparência e controlo, simultaneamente, às decisões das entidades adjudicantes desses trabalhos.

Esta exigência convive com os requisitos exigidos pelo n.º 2 do artigo 370.º, que são cumulativos, sendo de louvar a nova redação conferida às alíneas a) e b) do preceito.

Por um lado, destacam-se as razões económicas – e não apenas as técnicas como um dos requisitos de admissibilidade dos trabalhos complementares, como forma de assegurar a permutabilidade ou interoperabilidade com equipamentos, serviços ou instalações existentes – E, por outro, assegura-se que a não adjudicação destes trabalhos complementares no âmbito do contrato em execução seja “altamente inconveniente” ou que “provoque um aumento considerável de custos para o dono da obra”. No fundo, o que se pretende acautelar é que adjudicação ao mesmo empreiteiro não comprometa a necessidade de assegurar a permutabilidade ou interoperabilidade com equipamentos, serviços ou instalações existentes, que poderia, naturalmente, ficar prejudicada com a adjudicação a outro empreiteiro. O mesmo se diga em relação aos custos com o lançamento de um novo procedimento.

É na ponderação de todos estes fatores e de forma a evitar o mais possível a interferência na dinâmica da obra, que o legislador exige o preenchimento destes requisitos cumulativos, acrescidos da exigência de que o percentual dos trabalhos complementares adjudicados “não exceda de forma acumulada, 50% do preço contratual inicial”.

Por fim, é de destaque, ainda, o cuidado dos donos de obras públicas neste tipo de decisão, e na obrigação de remessa ao Tribunal de Contas, dos aditamentos aos contratos e respetiva fundamentação, para efeitos de fiscalização concomitante.

  • Nelma Pires
  • Associada da Miranda & Associados

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