Quando os acionistas se zangam

Um pequeno mal-estar entre acionistas pode transformar-se numa zanga azeda e muito danosa, mas, por mais complicada que seja, há soluções eficazes para resolver a maioria dos problemas.

Quando chega o momento do fundador distribuir a sua posição pelos legítimos herdeiros, a estrutura de comando acionista sofre inevitavelmente uma transformação. Normalmente é uma evolução tranquila e até benéfica porque os herdeiros são irmãos educados nos mesmos princípios, valores e traços distintivos de um ADN familiar que os leva a prosseguir a sua missão de preservar o legado do Pai de forma harmoniosa. Mas não é sempre assim e, muitas vezes, emergem disputas entre irmãos, normalmente mal geridas, prejudicando o próprio valor do património familiar.

À medida que se passa de geração em geração as probabilidades destas disputas aumentam – porque há mais acionistas e a sua união em torno dos valores originais do fundador se fragiliza, porque há ambições ou ciúmes reprimidos, porque os interesses individuais pesam mais… ou por tantas outras razões que a natureza humana e o seu reflexo no comportamento das pessoas como acionistas produzem. E quando o capital abrange diferentes gerações a colisão de perspetivas sobre o negócio é ainda mais muito frequente.

Ao contrário do que se pensa, o ataque aos conflitos, quando eclodem, não pode ser dominado pelas emoções ou por uma discussão que só vai piorar a situação. Há hoje uma certa ciência na gestão de disputas e expomos de seguida as tipologias mais frequentes de fontes de conflito assim como as medidas que têm demonstrado maior eficácia na sua resolução.

Quais são os motivos mais frequentes de conflito acionista?

  1. Estratégia de desenvolvimento da empresa. A empresa precisa, por exemplo, de uma injeção de fundos. Optar por financiamento por capitais próprios pode gerar grandes fricções, uma vez que os acionistas têm de concordar em investir fundos na empresa que caso contrário receberiam como dividendos ou como reforço do valor da sua participação.
  2. Políticas de gestão e informação do negócio. É frequente que os acionistas se queixem de não dispor de informação suficiente sobre o negócio, o seu desempenho ou novos investimentos. A gestão de pessoas é outra área frequentemente criticada ao menor detalhe.
  3. Alegada falta de respeito pelos acionistas minoritários. Apesar de terem garantidos direitos estatutários básicos, os acionistas minoritários expressam muitas vezes desconforto com a ignorância pelos seus direitos ou opiniões, pelo desrespeito da sua posição em Conselho de Administração ou pelo próprio abuso dos seus direitos pelo bloco maioritário.
  4. Incumprimento dos deveres fiduciários. Os acionistas são obrigados a lidar uns com os outros e com a empresa de uma forma aberta e honesta e, nesse contexto, os acionistas maioritários são por vezes acusados de reter informações vitais, de agir em causa própria ou de ter conflito de interesses.
  5. Problemas pessoais e/ou antipatia. Não é raro mergulhar nas causas de uma disputa e descobrir que a questão que está na sua raiz não é nada mais do que um choque de personalidades. Os egos e a relutância em “perder a face” podem agravar problemas de outra ao ponto de provocar altercações dispendiosas e aparentemente intransponíveis.

As medidas mais frequentemente utilizadas e com maior potencial de eficácia

Há sempre a opção de levar o litígio a tribunal, mas estamos a falar numa “bomba atómica” sempre ruinosa para todos e que muitas vezes agrava o problema em vez de o resolver. Felizmente, existem muitas outras soluções . Desde logo o recurso à disposições de um bom Protocolo de Família devem resolver a disputa de forma inequívoca e incontornável. Mas o que fazer se não houver Protocolo, se não tiver sido bem feito e não der solução ao problema? Então consideramos uma ou mais das medidas de que falámos…

  • Aprovar uma resolução para realizar uma Assembleia Geral onde o problema possa ser resolvido. Basicamente, trancar todos os acionistas numa sala até que uma solução para o impasse seja encontrada. Esta pode muitas vezes ser a tática mais barata e eficaz.
  • Pedir a um membro independente e não executivo do Conselho de Administração, externo à empresa, para trazer uma nova perspetiva e ajudar a quebrar o impasse mediando da forma mais eficaz a situação.
  • Em alternativa, procurar uma solução próxima através de um mediador externo objetivo e experiente. Esta figura pode encontrar muitas vezes formas de desanuviar as tensões e levar as partes a uma espécie de resolução. Ninguém consegue exatamente o que quer, mas todos recebem algo com que podem viver.
  • Se algum acionista em particular se revelar inamovível, considerar a opção de comprar a sua participação, seguindo os termos do Protocolo de Família – em geral pode ser um ou mais acionistas ou a própria empresa.
  • No limite e como último recurso, pode ser inevitável considerar a venda da empresa ou, se não for possível encontrar um comprador, requerer ao tribunal a sua dissolução. É evidente que estes passos estão longe de ser ideais e representam mais uma “bomba atómica”, mas se tudo o resto falhar pode ser mais sensato e conveniente do que uma prolongada guerra judicial e é curiosamente menos raro do que parece.

Em conclusão, um pequeno mal-estar entre acionistas ou é logo resolvido no momento ou pode transformar-se numa zanga azeda onde sofrem acionistas e sofre o negócio. Mas, por mais intensa e profunda que seja essa zanga, há de facto soluções eficazes para cortar o nó górdio da maioria delas. E desde que depois das muitas batalhas e discussões ainda subsista um fio de racionalidade entre os acionistas que ficarem, o sol pode voltar a brilhar na sala do Conselho de Administração com um foro acionista unido, motivado e concentrado no que é suposto fazerem e bem.

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