Revogação do RNH: que medidas e políticas fiscais se pretendem para o futuro em Portugal?

  • Maria Norton dos Reis
  • 12 Fevereiro 2024

É essencial que Portugal garanta que as políticas adotadas servem os interesses nacionais, não esquecendo as que têm contribuído significativamente para o desenvolvimento económico nacional.

O ano de 2023 terminou com dois grandes pacotes de medidas fiscais: o Mais Habitação e o Orçamento de Estado (OE) para 2024.

Como ponto comum aos dois conjuntos de medidas, que visam colmatar a crise na habitação, destacamos a revogação do estatuto dos Residentes Não Habituais (RNH), a qual marca um significativo ponto de viragem na política fiscal portuguesa.

Sem prejuízo da referida revogação, foi criado um regime transitório, permitindo que os inscritos como RNH até 1 de Janeiro de 2024 continuem a usufruir do regime durante o período a que tinham direito. Permitindo, ainda, que o regime seja aplicado àqueles que até ao final de 2024 se tornem residentes fiscais em território Português e que tenham iniciado o seu processo de mudança para Portugal ainda em 2023.

Este “início de mudança” para Portugal reconduz-se a 6 situações especificamente tipificadas na lei, das quais destacamos a celebração de um contrato de arrendamento até 10.10.2023 e a assinatura de uma promessa ou contrato de trabalho até 31.12.2023.

No OE 2024 foi também criado um novo regime semelhante ao RNH, no qual os respectivos beneficiários estarão igualmente sujeitos a tributação à taxa fixa de 20% em IRS pelo período de 10 anos. Porém, o campo de aplicação deste regime é mais reduzido, já que apenas poderão beneficiar dele contribuintes cujos rendimentos provenham de carreiras como as de docente de ensino superior, investigação científica, postos de trabalho qualificados e membros dos órgãos sociais de ‘startups’.

Por último, o já conhecido regime dos ex-residentes mantém-se em vigor, no entanto, com ligeiras alterações: os contribuintes que se tornem residentes fiscais em Portugal até 2026 continuam a poder beneficiar da exclusão da tributação de metade dos seus rendimentos de trabalho dependente e independente durante um período de 5 anos. Contudo, a exclusão da tributação passa a ser aplicável apenas até ao limite de rendimentos de €250.000.

Ora, apesar da criação de um novo regime e da manutenção do ex-residentes, a grande alteração deste OE é a revogação do RNH. Este regime foi implementado em 2009 e foi um importante instrumento de atração de capital, tendo sido objeto de inspiração para os equivalentes atuais regimes existentes noutros países europeus.

De um modo geral, o OE para 2024, sobretudo no que à revogação do estatuto do RNH diz respeito, parece ter sido redigido sem uma análise critica feita com a devida profundidade quanto ao efetivo impacto em Portugal deste regime e/ou revisão dos seus aspetos legais, o que está em linha com aquilo a que assistimos quanto a certos pacotes legislativos anteriores: uma falta de estratégia das medidas fiscais e uma desconexão com a realidade nacional. Como resposta à crise da habitação revoga-se um regime que visa a atração de investimento tão necessário no nosso país sem que se estabeleça uma relação causa-efeito entre as situações de crise identificadas e a fruição do regime e, sobretudo, ignorando os ganhos que a vinda dos beneficiários do referido regime para território nacional nos trouxeram.

É essencial que Portugal garanta que as políticas adotadas servem os interesses nacionais, não esquecendo as que têm contribuído significativamente para o desenvolvimento económico nacional, e assegure a capacidade de competir com países concorrentes para onde se virarão certamente aqueles que, com o fim deste regime, perdem o interesse pelo nosso país e deixarão de aqui investir.

  • Maria Norton dos Reis
  • Associada coordenadora da Pares Advogados

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