
Riscos em Aviação: Tendências recentes
António Rito Batalha alerta que as alterações climáticas estão mudar as realidades atmosféricas na aviação. A turbulência aumentou nas últimas décadas, os seguros têm de rever modelos de risco.
Até no ramo de aviação o aquecimento global começa a deixar a marca. O fenómeno está a alterar padrões atmosféricos e a intensificar riscos que, embora nem sempre evidentes, têm implicações crescentes em companhias aéreas, seguradoras e resseguradoras. Paralelamente, a sinistralidade registada em 2025 confirma que os grandes sinistros continuam a ser o principal fator de pressão sobre o ramo.
Turbulência em aceleração: reflexo no seguro de Acidentes de Trabalho
A turbulência atmosférica em céu limpo, resultante da variação brusca na velocidade e/ou direção do vento (windshear), tem vindo a aumentar devido ao aquecimento global. Passageiros e tripulação sentem-na em episódios súbitos de instabilidade em voo, mas as consequências podem ir bem além do desconforto.
A ciência confirma esta tendência. Um estudo publicado na revista Geophysical Research Letters projeta que, entre 2050 e 2080, a frequência deste fenómeno poderá duplicar ou até triplicar em várias rotas internacionais, em especial no Atlântico Norte e na Ásia Oriental. Mais recentemente (2023), outro estudo publicado na mesma revista concluiu que a turbulência severa sobre o Atlântico Norte aumentou 55 % entre 1979 e 20201,2, confirmando que o fenómeno já não é apenas futuro: está em crescimento no presente.
Em termos de impacto segurador, a turbulência raramente causa danos relevantes na fuselagem das aeronaves, pelo que o efeito direto nas apólices de casco (hull) é limitado. Mas pode ter consequências importantes no seguro de Acidentes de Trabalho (AT), obrigatório em Portugal: lesões sofridas por tripulações em episódios de turbulência severa podem traduzir-se em indemnizações significativas mais frequentes, com reflexo nas contas das seguradoras e respetivos tratados de resseguro.
2025: grandes sinistros e pressão no mercado segurador
O ano de 2025 registou já dois dos acidentes mais graves da aviação civil recente.
Em 29 de janeiro, um Bombardier CRJ-700 da American Eagle (American Airlines) colidiu com um helicóptero Sikorsky Black Hawk sobre o rio Potomac, em Washington D.C., provocando a morte de 67 pessoas. As estimativas preliminares situam o impacto segurador na ordem das centenas de milhões de dólares.
A 12 de junho, o voo AI171 da Air India caiu pouco após a descolagem de Ahmedabad. Dos 242 ocupantes, apenas um passageiro sobreviveu. As indemnizações esperadas ultrapassam os 200 milhões de dólares, podendo mesmo superar a totalidade dos prémios emitidos anualmente no mercado segurador indiano.
O conjunto destes eventos, somado a precedentes tal como o caso Jeju Air (dezembro de 2024) e a perdas relacionadas com o conflito Rússia–Ucrânia, estão a pressionar o mercado global de re/seguro de aviação. A corretora Howden3 antecipa um possível endurecimento do mercado a partir do quarto trimestre de 2025, com revisões tarifárias e seleções mais rígidas.
Num setor tão global como a aviação, os sinais vindos da ciência — que apontam para um aumento da turbulência atmosférica, com potenciais repercussões nos seguros de Acidentes de Trabalho — e os sinais da sinistralidade recente, em especial nos seguros de cascos, convergem: a gestão do risco vai exigir maior prudência, capacidade de adaptação e vigilância reforçada por parte das seguradoras, resseguradoras e reguladores.
1 Turbulência atmosférica pode triplicar até 2050-2080
2 Aumento da turbulência em 55% entre 1970 e 2000
3 Endurecimento do mercado de aviação no final de 2025 segundo Howden
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