Transparência fiscal, vantagem ou desvantagem na era ESG?
O mundo está a trilhar um caminho de transparência e sustentabilidade, incluindo em matéria fiscal. As empresas que não o seguirem serão penalizadas por isso.
Com a assinatura do Acordo de Paris em 2015 e a divulgação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 2030 das Nações Unidas, o movimento ESG (Environmental, Social, Governance) ganhou um novo fôlego e atraiu ainda mais atenção da comunidade.
Durante muito tempo, os impostos ficaram à margem do movimento ESG, estando o foco nas matérias ambientais (E) e nas matérias sociais (S). Contudo, após as Nações Unidas terem identificado os impostos como um recurso fundamental dos Estados para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 2030, a matéria fiscal passou a ocupar também um lugar à mesa.
O paradigma do reporte fiscal enquanto pura obrigação declarativa, destinado somente às administrações fiscais, está a transformar-se rapidamente. Enquanto parte de um reporte não financeiro mais alargado, o reporte passou a ser uma oportunidade para as empresas demonstrarem o seu papel e missão na sociedade, criando um nexo cada vez maior entre a responsabilidade da Gestão e a transparência das suas estratégias, incluindo a fiscal, pedra basilar da confiança dos investidores e do público em geral.
Mais do que nunca, há uma enorme pressão pública para as empresas divulgarem de forma transparente as suas práticas fiscais e a sua contribuição para as comunidades onde desenvolvem a sua atividade. Esta transparência em matéria fiscal é cada vez mais exigida e valorizada por investidores, media, trabalhadores, pela sociedade civil, bem como por diversos outros stakeholders. Veja-se, por exemplo, um estudo recente de Harvard[1], que reporta que empresas com melhores registos de ESG superaram os seus concorrentes, tanto quando os mercados começaram a cair em resultado da pandemia Covid-19, como quando estes começaram a recuperar.
De forma a responder a este crescente clamor público, e garantir uniformidade de critérios no reporte, a GRI (Global Reporting Initiative) desenvolveu o primeiro padrão global de reporte de transparência em matéria fiscal, a GRI 207. Esta organização pretende apoiar na divulgação transparente dos impactos das empresas ao nível económico, ambiental, social e de governança através da disponibilização de um conjunto de normas de sustentabilidade. Estas normas são atualmente utilizadas, por mais de 10.000 entidades, em mais de 100 países, enquanto estrutura de reporte de informação não financeira.
Concretamente, a GRI 207 vem trazer comparabilidade entre as empresas e suporte à divulgação pública, país a país, da carga fiscal associada às jurisdições onde as empresas desenvolvem a sua atividade, exigindo ainda um extenso reporte de informações, tais como a política/estratégia fiscal da empresa, a sua posição em termos de riscos fiscais e gestão dos mesmos, impostos suportados e retidos em nome das autoridades fiscais.
Embora o reporte desta informação não financeira de acordo com as normas GRI seja em si voluntário, as empresas que comuniquem ao mercado que aquele é efetuado de acordo com o standard GRI terão de incluir a informação exigida pela GRI 207 nos relatórios a apresentar após 1 de janeiro de 2021, se os impostos forem considerados um tema material, sob pena de não poderem continuar a fazer essa referência.
Para além da GRI 207, existem outros standards. Por exemplo, no final de 2020, o Fórum Económico Mundial divulgou um Livro Branco relativamente a métricas comuns em matéria de sustentabilidade, tendo feito dos impostos uma componente principal destas divulgações e incluindo um reporte fiscal abrangente numa ótica de carga fiscal total (total tax contribution).
Na União Europeia (UE) foi apresentada a Diretiva 2021/2101 que respeita à divulgação de informações relativas ao imposto sobre o rendimento, numa lógica país a país, que deverá entrar em vigor em 2024. Adicionalmente, mais recentemente foi apresentada uma proposta de Diretiva para a comunicação de informações sobre a sustentabilidade das empresas, que vem alterar a atual Diretiva para o reporte de informação não financeira e que se espera inclua métricas sobre transparência fiscal e planeamento fiscal não agressivo.
A International Financial Reporting Standards (IFRS) Foundation anunciou a criação do International Sustainability Standards Board (ISSB) também com a intenção de criar normas para reporte de sustentabilidade.
Os reguladores começam também a impor requisitos nesta matéria, como é o caso da SEC que se encontra neste momento a avaliar a criação de requisitos de reporte em matéria de sustentabilidade.
Por sua vez, existem também cada vez mais agências de notação de risco a incluir nas suas avaliações a divulgação das matérias fiscais, como é o caso do conhecido e conceituado Dow Jones Sustainability Index (DJSI).
Em suma, as exigências de reporte em matéria fiscal, obrigatórias à data, são insuficientes para compreender a verdadeira carga fiscal suportada pelas empresas e a sua posição fiscal global.
O mundo está a trilhar um caminho de transparência e sustentabilidade, incluindo em matéria fiscal, pelo que as empresas que não o seguirem poderão não apenas ser penalizadas pelos seus clientes, fornecedores e comunidade em geral onde atuem, mas também por agências de notação de risco, bancos ou investidores. Assim, as empresas deverão começar a antecipar-se e a preparar-se uma vez que é hoje claro que a divulgação de informação transparente em matéria fiscal veio para ficar.
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