Editorial

Um Governo Remax que não vende uma casa

Na habitação, não há soluções milagrosas, há políticas certas e políticas erradas, e o Governo, tudo indica, vai ajudar a aumentar os problemas.

Portugal tem, como outros países da Europa, um problema na habitação: Pelo menos desde a última década, os preços, de arrendamento e de venda, aceleraram a um ritmo muito superior ao dos rendimentos, facto agravado pela subida dos juros desde há um ano a esta parte. Não há soluções milagrosas, mas há políticas certas e políticas erradas, e o Governo, tudo indica, vai ajudar a aumentar os problemas.

Como se já não bastasse um pacote Mais Habitação que transforma o Estado no centro de tudo — constrói, subarrenda, arrenda, compra e pelo meio ainda está disponível para ser uma espécie de Remax pública –, muda regras, cria instabilidade e desconfiança, a intervenção administrativa no aumento das rendas é mais um medida que só vai agravar os problemas.

Uma intervenção pública pode ser necessária em algum momento — neste caso da habitação, exigia-se mais construção e outra política de território e mobilidade –, mas tem de ser avaliada com particular cuidado porque acaba por beneficiar um grupo em prejuízo de outros. E essa identificação nem sempre é clara, confunde-se e às vezes só anos depois é possível verificar as suas consequências, quando o decisor que tomou a decisão já não está em funções. Num setor como o da habitação, por maioria de razão, os ciclos de avaliação de políticas são longos. Ainda assim, tendo em conta que este Governo está em funções desde final de 2015, já é possível dizer que a estratégia falhou em toda a linha e o Mais Habitação é apenas uma ‘fuga para a frente’, e por isso é que António Costa e a ‘ajudante’ Marina Gonçalves decidiram pôr o Estado no centro dessa política. Mesmo assim, vai falhar outra vez.

Como se isto não fosse suficiente, os sinais políticos que o Governo dá são os de que vai voltar a travar administrativamente o aumento de rendas para 2024. Tal como tinha apontado nos dados provisórios divulgados a 31 de agosto, o INE aponta que a partir de 1 de janeiro de 2024, os senhorios podem aumentar o valor da renda até 6,94%. É aumento que decorre da lei. Mas a lei só serve quando dá jeito, quando não dá, muda-se à medida. O Governo travou o aumento das rendas a 2% em 2023 e, tudo indica, fará o mesmo em 2024.

O Governo fica bem na fotografia junto de inquilinos que, como outros cidadãos, estarão pressionados pela perda de rendimentos. É uma ilusão. E, ao contrário do que se possa supor, não prejudica apenas os ‘malvados’ dos proprietários.

Os atuais inquilinos com contratos a prazo são protegidos agora, mas vão pagar mais tarde, mais caro, esta medida. O Governo ganha tempo político, os inquilinos atuais ganham tempo financeiro. Mas é só isso. O Governo vau mudar, os inquilinos vão pagar, à frente, o que não estão a pagar agora. Porquê? Porque o incentivo que está a ser dado aos proprietários é mesmo o de não disponibilizarem habitações para arrendamento, tal a incerteza e instabilidade criadas.

Isto só pode ter maus resultados, como teve o congelamento de rendas há décadas. O Governo também sabe isto, conhece os números, mas só pensa no curto prazo, no dia de amanhã. E se puder pôr os proprietários — obviamente imunes à inflação, porque como todos sabem o aumento dos preços só chega a inquilinos… — como os maus da fita, a pagar a política social que o Governo não consegue fazer, tanto melhor. Para o Governo. Muito pior para o país, para proprietários e obviamente para inquilinos.

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