Editorial

Um mecanismo à portuguesa… na mutualista Montepio

Já está tudo dito sobre Tomás Correia, mas ainda falta dizer alguma coisa sobre os que permitem que possa voltar a ser eleito para um quarto mandato na Associação Mutualista Montepio Geral.

Hoje é o dia das eleições na Associação Mutualista Montepio Geral, a maior do país e dona do banco Montepio. Mas não só. Também é o dia em que veremos se foram retiradas as devidas lições do que aconteceu no sistema financeiro nacional nos últimos anos e se há mesmo uma tomada de consciência do que foi feito por alguns dos mais altos responsáveis bancários. A vitória de Tomás Correia será a evidência de que, afinal, aprendemos muito pouco.

A esta hora, o resultado das eleições na Associação Mutualista já estará decidido. Confuso? Explico: até ao final da manhã desta quinta-feira, cerca de 42 mil associados já tinham enviado votos por correspondência nas eleições, correspondendo a menos de 10% do universo de associados que podem votar neste ato eleitoral para a maior mutualista do país, apurou o ECO junto de fonte da comissão eleitoral. Durante o dia de hoje, votarão mais quatro a seis mil associados, se tanto, na única urna disponível, no centro da cidade de Lisboa. Portanto, as cartas já estão lançadas, só faltará saber o resultado.

Em primeiro lugar, não deixa de ser surpreendente o reduzido número de votos numas eleições que tiveram, e bem, a devida cobertura mediática. São mais de 650 mil associados, uma associação com mais de três mil milhões de ativos (já foram cinco mil milhões não há muito tempo) e que gere poupanças de milhares e milhares de famílias. O alheamento dos associados perante o volume de informação do que foi feito por Tomás Correia na última década à frente do banco, primeiro, e da associação, depois, não é um bom indicador de responsabilidade dos próprios associados.

Sobre Tomás Correia, já há pouco a dizer para além do que foi dito. Um mecanismo à portuguesa, no qual Tomás Correia terá a oportunidade de se defender. Mas a realidade a ficção não estão assim tão longe. O outro, o mecanismo brasileiro, retratou no Netflix o que se passou na rede de interesses, cumplicidades e corrupção entre o poder político e empresarial, aqui ainda não há série, mas há suspeitas da justiça e do Banco de Portugal, um polvo bem vivo, como lhe chama, e bem, José Manuel Fernandes no Observador (acesso pago). Só não vê quem não quer. Porquê, é outra história. Por isso é que hoje, especialmente hoje, o que está em causa não é o presidente e candidato Tomás Correia, é mesmo o país e em particular os associados que votam, ou podem votar.

Ninguém, em consciência, poderá dizer que desconhece o que está em causa, no mínimo, para não dizer outra coisa, os riscos com a reeleição de Tomás Correia, os resultados destes anos de gestão no banco e na associação (durante anos, acumulou funções), o modelo de financiamento do banco do Montepio em Angola a ‘amigos’ que, assim, foram ao aumento de capital do próprio Montepio. Só boas práticas.

Perante tudo isto, ou, como diz, de forma diplomática, o economista Bagão Félix na entrevista ao ECO24, estes casos judiciais, nomeadamente o processo do Banco de Portugal, “já revelam alguma fraqueza da idoneidade” de Tomás Correia. Arrisco acrescentar que revelam mais qualquer coisa. Hoje, com os resultados previsíveis desta eleição e a vitória de Tomás Correia, quem está em causa são os outros. No fundo, são os que votaram em Tomás Correia e os que não votaram, são todos os que conviveram e convivem com este retrato sem nada dizerem, são todos os que são cúmplices de Tomás Correia nesta campanha eleitoral, os da comissão de honra, os apoiantes. Quem está em causa é o governo que nada fez para garantir um processo eleitoral transparente e é até da supervisão das seguradoras fundos de pensões, que já têm responsabilidade sobre a governação da associação mutualista e assobiou para o ar nas últimas semanas.

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