Via verde para fracassar

  • Inês Azevedo
  • 14:00

Da experiência que temos com o processamento de vistos de residência, os consulados não têm capacidade para os agendamentos, nem a AIMA/ UCFE tem capacidade para a emissão dos pareceres no prazo.

O Protocolo de Cooperação para a Migração Laboral Regulada assinado no dia 1 de abril entre a Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas (DGACCP), a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), o Instituto do Emprego e Formação Profissional, a Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros (UCFE) do Sistema de Segurança Interna e a Confederação Empresarial de Portugal, a Confederação dos Agricultores de Portugal, a Confederação de Comércio e Serviços de Portugal, a Confederação do Turismo de Portugal e a Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário tem como grande objetivo agilizar a contratação de trabalhadores estrangeiros.

Em véspera de “época alta”, designadamente, no turismo e na agricultura, estas entidades pretendem agilizar a emissão de vistos de trabalho, assegurando simultaneamente a legalidade e a segurança dos movimentos migratórios, tornando assim o processo mais célere.

O Protocolo também apelidado de “Via verde para as migrações” entrou em vigor passado dia 15 de abril mas logo após o nascimento estava condenado a fracassar, tendo o Sindicato dos Trabalhadores Consulares alertado para o facto de não existirem recursos humanos para executar e cumprir o Protocolo.

O procedimento começa com um pedido de visto enviado pela entidade empregadora por e-mail à Direção-Geral dos Assuntos Consulares com a documentação necessária: contrato de trabalho válido, seguro de viagem, seguro de saúde, Plano de formação profissional e aprendizagem da língua portuguesa e comprovativo de alojamento adequado.

Os pedidos de visto são depois enviados para agendamento do atendimento no posto consular na jurisdição do país de residência do requerente. Após entrevista do candidato e análise dos documentos originais, a AIMA e UCFE emitem os seus pareceres. O posto consular, com base nos pareceres, deve tomar a decisão de concessão do visto no prazo de 20 dias a partir do dia em que o candidato foi entrevistado.

Da experiência que temos com o processamento de vistos de residência, os consulados não têm capacidade para os agendamentos, nem a AIMA/ UCFE tem capacidade para a emissão dos pareceres dentro deste ambicioso período de tempo.

Curiosamente, dois dias depois, a 17 de Abril foi publicada a Resolução da Assembleia da República n.º 76/2025 que recomenda ao Governo a expansão e reforço da rede consular portuguesa tendo em consideração a população emigrante. Contudo, em ponto algum desta Resolução é feita uma referência à necessidade de um estudo detalhado sobre as necessidades de expansão da rede consular considerando a evolução crescente da população estrangeira em Portugal, que é mais de 10% nos últimos 6 anos (os últimos dados oficiais atualizados são de 2023).

É publicada uma Resolução que não analisa os últimos relatórios estatísticos gritantes quanto ao crescimento da população estrangeira em Portugal, nem as notícias diárias de serviços sem capacidade de atendimento e que não ouve o Sindicado dos serviços visados pela Resolução.

Portugal é historicamente um país de emigrantes e os consulados foram criados para resolver os problemas das comunidades portuguesas que vivem no estrangeiro. Contudo, esta realidade está rapidamente a mudar e os serviços públicos não podem continuar sem ver a mudança da nova realidade demográfica que representa mais de um milhão de estrangeiros que escolheu o nosso país para viver.

Sendo a instrução dos pedidos de vistos uma competência dos serviços consulares — e o primeiro passo no processo de mudança de um cidadão estrangeiro para Portugal — é imperativa a reforma dos serviços consulares em coordenação com a reforma da AIMA antes de se celebrar um protocolo para “inglês ver” em véspera de eleições.

  • Inês Azevedo
  • Advogada e managing partner da Ethikos Legal Portugal

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