O Alentejo renovável
Os consumidores domésticos de eletricidade subiram 12,2% entre 1994 e 2015 no Alto Alentejo e 21,95% no Alentejo Central.
Exemplo 1: O Festival de Cannes recebeu o filme Farpões, Baldios de Marta Mateus, que nasceu em 1984 em Estremoz. O filme documenta a sua relação com as pessoas mais velhas, analfabetas muitas, que tinham vivido em casas sem luz e sem água, partilhando uma sardinha por dez pessoas ou azeite já usado para barrar o pão, a luta pela sobrevivências, as ocupações, as searas em fogo nos dias de sol abrasador, numa paisagem que hoje fascina uma população urbana que se desloca em busca de um monte para os fins de semana sem stress, o que tem fomentado um turismo rural e hoteleiro crescente.
Estes contrastes ainda fazem a memória de um território envelhecido, a perder população, com limitada capacidade de renovação demográfica e a consumir cada vez mais recursos para o apoio social e de saúde. Neste deve e haver, o peso dos fatores como a redução da população ativa não configuram um destino mas a superação de um momento na história da região.
Exemplos de dar a volta e fazer coisas fora da caixa não faltam. O Alto Alentejo é berço de uma das maiores empresas familiares portuguesas com um negócio que nada tem a ver com os recursos naturais da região mas com as suas capacidades humanas. Nos anos 40 e 50, a zona fronteiriça de Campo Maior compunha os seus rendimentos no trabalho agrícola com o contrabando fronteiriço, atividade secular na região. Um dos principais negócios era o comércio de café e foi este que esteve na base da criação da Delta Cafés de Rui Nabeiro. Começou em 1961 com a sua própria marca de cafés num pequeno armazém com 50 metros quadrados e duas bolas de torra de 30 kg de capacidade. Hoje é líder de mercado em Portugal, batendo as várias multinacionais que o tentaram destronar. Assim se fez um império do café no Alentejo.
Sinais fortes
Na Quinta do Quetzal, na Vidigueira, nasceu em 2016 um centro de arte promovida por um casal de milionários holandeses, mecenas e donos de uma das maiores coleções privadas de arte, Cees e Inge de Bruin-Heijn, em que se junta a paixão pela arte contemporânea e pelo vinho. Em pleno Alentejo passam obras que já foram emprestadas ao MoMA, em Nova Iorque, à Tate, em Londres, ao Reina Sofia, em Madrid, ao Hermitage de São Petersburgo, ou à Fundação de Serralves no Porto.
Na mesma altura, em julho de 2016, a empresa brasileira Embraer, que tem polos industriais em Portugal — as OGMA em Alverca e a Embraer em Évora –, fez o voo inaugural do novo avião de carga KC-390 para a Força Aérea Portuguesa. Considerado o maior projeto aeronáutico alguma vez feito em Portugal, contou com o desenvolvimento do produto no centro de engenharia CEIIA, composto por 170 engenheiros portugueses. O KC-390 é um avião que poderá ser usado para o transporte e lançamento de cargas e tropas, reabastecimento aéreo, busca e resgate e combate a incêndios florestais. As exportações de componentes para jatos já ocupam três unidades fabris da Embraer em Évora.
Estas novas intensidades que percorrem o Alentejo dão o tom de esperança que os grandes números por vezes escondem, mas não resolvem todos os problemas. A densidade populacional é inferior à do país, com o número de ativos por idosos a ser mais baixa. O peso das pensões da segurança social e da Caixa Geral de Aposentações em percentagem da população residente é de 52,5% para a NUTS Alto Alentejo e 46,6% para a NUTS Alentejo Central e 38,2% em Portugal. Mas há polos de atratividade como Évora e Vendas Novas que conseguiram ganhar população nos últimos 20 anos tal como Viana do Alentejo, que trazem novos tipos de atividades industriais ou novos projetos agrícolas.
A redução da população ativa, a baixa taxa de empregabilidade e um dinamismo empresarial inferior à média nacional não são, contudo, um destino mas um momento na história da região. Neste espaço há dinâmicas diferentes na duas NUTS III com a do Alentejo Central, que tem como centro Évora, a ter um maior dinamismo industrial e económico.
O Alentejo Central destaca-se por uma maior dinâmica empresarial com cerca de 20 mil empresas em que se incluem tanto empresas de micro e pequena dimensão como um conjunto de empresas de grande dimensão no contexto regional em setores mais dinâmicos a indústria automóvel, a indústria de componentes eletrónicos, a cortiça e derivados, as rochas ornamentais e o setor agroalimentar e os emergentes tecnologias de informação e comunicação (TIC) e a aeronáutica.
A redução da população ativa, a baixa taxa de empregabilidade e um dinamismo empresarial inferior à média nacional não são contudo um destino mas um momento na história da região. Neste espaço há dinâmicas diferentes na duas NUTS III com a do Alentejo Central, que tem como centro Évora, a ter um maior dinamismo industrial e económico.
O Alentejo Central destaca-se por uma maior dinâmica empresarial, com cerca de 20 mil empresas em que se incluem tanto empresas de micro e pequena dimensão como um conjunto de empresas de grande dimensão no contexto regional em setores mais dinâmicos a indústria automóvel, a indústria de componentes eletrónicos, a cortiça e derivados, as rochas ornamentais e o setor agroalimentar e os emergentes tecnologias de informação e comunicação (TIC) e a aeronáutica.
Uma viagem pelas fileiras económicas
No Alto Alentejo, os vários estudos apontam o setor agrícola e o do turismo como atividades importantes para o desenvolvimento sustentável do território e a valorização do mundo rural que, no caso agrícola, abrange a produção, extração, transformação, comercialização e distribuição, de culturas temporárias como as culturas forrageiras e as culturas cerealíferas, o olival, a bovinicultura e dos pequenos ruminantes (sobretudo, ovinos), o Cavalo lusitano (que beneficia da localização na sub-região da Coudelaria de Alter) e o touro bravo.
A revolução do Alqueva
O Alentejo é composto por um complexo agroflorestal que inclui agricultura de regadio, economia de montado e agroindústrias e que hoje se baseia na disponibilidade de água em infraestruturas de regadio, como o Alqueva, que permite a expansão da produção tradicional (vinha, olival, arroz, pastagens e forragens), das atividades pecuárias (bovinos, suínos e ovinos) e florestais (montado de sobro e azinho e pinheiro), mas também a evolução para culturas de maior valor acrescentado (plantas aromáticas e medicinais, fruticultura, horticultura, etc.).
Em termos hídricos, a Central Hidroelétrica de Alqueva — que resulta do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva (EFMA) — tem uma potência instalada de 520 MW. A albufeira de Alqueva, o maior lago artificial da Europa, estende-se por 83 Km ao longo dos concelhos de Moura, Portel, Mourão, Reguengos de Monsaraz e Alandroal, ocupando uma área de 250 Km2. O EFMA é um projeto centrado na barragem de Alqueva, a maior reserva estratégica de água da Europa cria uma área de regadio atual de 119.139 ha.
Turismo: da caça e da natureza
O turismo cinegético é um dos recursos turísticos económicos do Alentejo, que Alto Alentejo tinha em 2014, 609 Zonas de Caça (364 associativas, 54 municipais e 191 turísticas), com destaque para os municípios de Nisa, Portalegre, Marvão e Castelo de Vide. Esta região alentejana dispõe de várias áreas naturais que beneficiam de proteção especial como o Parque Natural da Serra de São Mamede (PNSSM), seis Zonas de Proteção Especial e quatro Sítios de Interesse Comunitário.
No Alto Alentejo, a água está fortemente associada aos rios e às albufeiras existentes (sobretudo, Montargil, Maranhão e Caia) interessantes para ao desenvolvimento de atividades de turismo náutico e que são procuradas por equipas profissionais de remo e canoagem, sobretudo do norte da Europa, para efetuarem os seus estágios na época de inverno. Os recursos termais [Termas da Fadagosa (Nisa) e Cabeço de Vide (Fronteira)] são a vertente de turismo de saúde na composição da oferta turística da região.
Mas existem outros recursos como a fileira do Cavalo Lusitano, passando pela Judiaria de Castelo de Vide e pelo Parque Natural da Serra de S. Mamede, até ao Museu da Tapeçaria de Portalegre e às Fortificações de Elvas, classificadas pela UNESCO como Património da Humanidade (casos emblemáticos de um território heterogéneo enriquecido), tendo em vista consolidar e ampliar fluxos de visitação com motivações porventura distintas mas complementares para quem pretenda aumentar o tempo de permanência no Alto Alentejo.
O papel das infra estruturas
“Vir para a Europa fazia parte da estratégia. Évora foi onde encontrámos uma logística fácil para escoar as nossas exportações tanto pelo porto de Sines, como de Setúbal ou Lisboa”, explicou recentemente Paulo Marchioto, presidente da Embraer, ao Jornal de Negócios. Este gestor brasileiro mostra a importância das infraestruturas para os investimentos, que pode vir a ser reforçada com os corredores central rodoferroviário Lisboa–Madrid e o ferroviário Sines-Évora-Elvas/Caia–Badajoz — e, eventualmente, a alta velocidade. Atualmente, o transporte de passageiros é feito pelos serviços regionais e intercidades da CP-Comboios de Portugal. Estes serviços asseguram ligações a Lisboa e ao Algarve, mas não a Espanha. Já em termos de transporte de cargas a estrutura ferroviária é um pouco mais eficiente, estando a ligação à Europa assegurada pela entrada em Badajoz.
Ao nível dos eixos rodoviários de ligação do Alentejo com o território nacional envolvente, revela-se de importância regional, no contexto da estratégia de desenvolvimento territorial, a constituição do corredor rodoviário do Litoral Alentejano, a construção dos troços em falta no IP2, a infra -estruturação completa do corredor de ligação interior do Baixo Alentejo ao Algarve (IC 27), bem como a qualificação das ligações à Lezíria do Tejo (através do IC 13) e ao Médio Tejo (através do IC 9).
A construção da Barragem do Crato-Pisão, armazenando os caudais da ribeira de Seda, com uma bacia que se estende das encostas do sistema montanhoso da serra de São Mamede à povoação do Crato.
A energia: do consumo à produção
Os consumidores domésticos de eletricidade subiram 12,2% entre 1994 e 2015 no Alto Alentejo e 21,95% no Alentejo Central. Na indústria e na agricultura o número de utilizadores baixou cerca de 65% no Alto Alentejo e 77% no Alentejo Central. No entanto, o consumo em termos de quilowatt/hora subiu 3,4 vezes no Alto Alentejo e 3,6 vezes no Alentejo Central entre 1994 e 2015.
Os resultados da Matriz Energética elaborada pela Agência Regional de Energia do Norte Alentejano e Tejo (AREANATejo) alertavam para a tendência de aumento dos consumos dos setores industriais e dos serviços, o que aconselha a intervenções de diversificação de fontes e na eficiência energética. A abordagem proposta — e que está a ser gradualmente materializada –, combina intervenções de eficiência energética (edifícios públicos, sistemas de iluminação pública, sistemas inteligentes, …) com o aproveitamento e valorização de recursos energéticos endógenos, na base da instalação de unidades de produção (bioenergia, fotovoltaica, hídrica, …), visando criar um território autossustentável em termos de energia e de carbono.
As condições de clima e de paisagem do Alto Alentejo favorecem o aproveitamento de recursos endógenos para a produção em escala de energias renováveis (solar, eólica, hídrica, geotérmica e biomassa). Essas condições favoráveis poderão contribuir para atrair investimento e dinamizar negócios nas fileiras da energia e do ambiente, com destaque para valorização energética da biomassa que tem efeitos na redução da dependência dos combustíveis fósseis e contribui para atenuar os níveis de emissão de carbono.
A constituição no futuro do Centro Internacional de Energías Renovables y Eficiencia Energética, em Badajoz, deverá motivar o empenhamento dos Centros de conhecimento da Região (nomeadamente, Universidade de Évora e Politécnicos de Beja e Portalegre) a prosseguirem a sua investigação aplicada no domínio das energias renováveis, podendo adquirir maior protagonismo face à proximidade geográfica de Badajoz e à cooperação já existente com a Universidade de Extremadura – Espanha. No campo das energias renováveis, o Alentejo tem uma potência instalada com maior expressão na hídrica e fotovoltaica, uma importante capacidade científica instalada e despontam algumas empresas inovadoras na área das tecnologias de concentração solar.
A energia solar fotovoltaica corresponde apenas a 2,4% do total de potência instalada renovável em Portugal. A Hyperion, presidido por João Talone, tem planeadas cinco centrais solares em Ferreira do Alentejo, Moura (duas), Évora e Sousel, num total de 150 megawatts e num investimento total de 130 milhões de euros. A Expoentfokus prevê cinco centrais solares fotovoltaicas com uma potência total de 130 megawatts num investimento total entre os 100 e os 120 milhões de euros.
O crescimento das várias indústrias regionais do norte Alentejo, o desenvolvimento de infraestruturas capazes de atrair investimento e o consequente aumento das necessidades energéticas desta região são uma realidade incontornável e necessária de acautelar. A intenção de investimento é real mas, para que se torne realidade, é necessário que a energia chegue ao promotor e, para isso, é preciso o compromisso de todos os agentes.
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