Ruby chegou com anos de avanço à escola
Estudou numa sala de aula esvaziada pelo preconceito. A primeira criança negra a andar numa escola de brancos nos EUA esteve em Lisboa e garantiu que ainda há muito por fazer pela igualdade.
Ruby sabia que aquele não era um primeiro dia de aulas qualquer. Aos seis anos de idade, levada por quatro polícias federais para a sua nova escola primária, enraiveceu multidões e fez história como a primeira criança afro-americana a inscrever-se na William Frantz Elementary – até então frequentada exclusivamente por alunos brancos.

“Quando nos aproximámos da escola, vi protestos. Em Nova Orleães, nós temos uma festa chamada Mardi Gras, o Carnaval. Aos meus olhos de criança, aquelas multidões pareciam um Carnaval, uma parada”, recorda, mais de cinco décadas depois, Ruby Bridges, em Lisboa para a conferência “Em que pé anda a igualdade” promovida pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, no Teatro São Carlos.
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A 14 de novembro de 1960, Bridges tornava-se, assim, num símbolo da luta pelo direitos civis e pela educação integrada e igual para todas as crianças. Nesse dia, conheceu muito pouco da sua nova escola, mas viu passar, pela janela do gabinete do diretor, muitos pais que lhe apontavam o dedo em fúria e arrastavam os filhos. Mais de 500 crianças foram retiradas em protesto da William Frantz Elementary.
Numa sala de aula que se manteve sem colegas durante todo o seu primeiro ano, Ruby aprendeu a contar, ler, pintar e cantar com a senhora Henry, a única professora que não se recusou a trabalhar com ela. “Tudo o que encontrei foi uma escola vazia. Eu pensei que a minha mãe me tivesse trazido cedo demais. De facto, com anos e anos de avanço”, sublinha a ativista. “Éramos só eu e ela [a professora]. Ela parecia-se com eles, com aqueles que protestavam, mas não era ela como eles”, acrescenta.

Uma lição para toda a vida
Insultada e segregada, Ruby Bridges diz ter aprendido, aos seis anos, a lição mais valiosa da sua vida: a de que não se pode julgar ninguém pela cor da sua pele. Mais tarde, fruto da luta dessa mesma professora, Ruby conheceu cinco crianças, cujos pais insistiram em levar à escola, apesar dos protestos. “Um desses miúdos disse-me que não podia brincar comigo, porque a mãe lhe tinha dito para não o fazer”, insiste a americana, que aponta esse momento como o seu primeiro contacto consciente com o racismo. “Nenhum dos nossos bebés nasce a saber o que é odiar o outro. Foi a mãe daquele miúdo que lhe disse que não podia brincar comigo”, lamenta.
Aos 64 anos, Ruby quer “ensinar às crianças que o racismo não tem lugar nos seus corações”. Nos últimos 20 anos, Bridges fez dessa a sua missão, viajando pelos Estados Unidos para falar com milhares de professores e alunos e sensibilizá-los para este tema.
Em 2011, Bridges foi, por isso, convidada por Barack Obama a visitar a Casa Branca. Perante o quadro de Norman Rockwell que imortalizou o seu primeiro dia de aulas nessa escola do Louisiana, o então presidente dos Estados Unidos reconheceu o seu papel na evolução da história dos direitos civis americanos.
“O racismo e o mal vêm em todas as cores e tonalidades”, explicou Ruby Bridges, durante a conferência. A ativista garante tentar estar sempre à altura do privilégio que, nos anos 60, lhe puseram sobre os ombros. “Os meus pais não eram ativistas. Só queriam o melhor para os seus filhos”, termina.
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