Operação Fizz. Carlos Silva: “Com todo o respeito, não iria contratar alguém que tinha acabado de conhecer”
O banqueiro Carlos Silva foi ouvido na segunda de quatro sessões no âmbito da Operação Fizz. Afirma que a relação com Paulo Blanco era apenas institucional.
Chegando ao fim da segunda de quatro sessões em que será ouvido no âmbito da Operação Fizz, Carlos Silva, presidente do Banco Privado Atlântico (BPA), mantém as suas declarações de que Paulo Blanco insistiria em travar contacto consigo por razões que lhe são desconhecidas, apesar de os e-mails enviados pelo advogado para o banqueiro serem recorrentes, de a linguagem utilizada ser informal e de sugerir, além de proximidade, o tratamento de assuntos entre os dois por outros meios.
Confrontado com mais e-mails e questões da sua eventual relação com Paulo Blanco, pelo presidente do coletivo de juízes Alfredo Costa, Carlos Silva diz que nunca os rececionou, nem os abriu, nem sabia de que assuntos se tratavam. “Portanto, o Dr. Paulo Blanco andava a corresponder-se com uma pessoa que não lhe ligava minimamente”, reitera o juiz, perguntando de seguida: “Quando diz que não tomou conhecimento destes e-mails quer dizer o quê?”.
O banqueiro é peremptório: estes e-mails, dos quais constam até minutas de contratos e procuração de clientes em anexo, não chegaram a ele. “Não os leu, portanto, não sabia de nada”, deduz o juiz. A resposta é afirmativa.
Quando interrogado sobre se, ainda assim, sabia que assuntos estavam por detrás daqueles e-mails, a resposta volta a ser um não. “Havia muitos amuos [de Paulo Blanco]. Como advogado do estado angolano, ele queria prestar os seus serviços, estabelecer relações. Ele era advogado do estado angolano, era normal que quisesse intensificar as suas relações”, esclarece o banqueiro.
Diria que era uma relação institucional boa [com Paulo Blanco]. Só.
Alfredo Costa: Se do outro lado a recetividade é baixa, não vale a pena insistir. Mas o Dr. Paulo Blanco está sempre a insistir, é isso que não consigo perceber… O Dr. Carlos Silva é o primeiro a dizer que ele passou de lhe tratar por “senhor presidente” para “caro amigo”.
Carlos Silva: Como advogado ele queria prestar os seus serviços. Tínhamos uma relação formal boa, diria. Uma relação institucional boa.
Alfredo Costa: E uma relação de amizade?
Carlos Silva: Diria que era uma relação institucional boa. Só.
Alfredo Costa: Mas como é que chegaria a este ponto?
Carlos Silva: Não sei. Só mesmo quem escreve é que pode responder…
O banqueiro garantiu ainda que no almoço no Ritz que terá tido com Paulo Blanco e Orlando Figueira que nenhum contrato terá sido discutido. Segundo a versão de Paulo Blanco, terá sido mais ou menos nessa altura em que o alegado contrato entre Orlando Figueira e o BPA Angola ficou alinhavado. “Com todo o respeito, não iria contratar alguém que tinha acabado de conhecer e de quem nem tinha o contacto de telefone”, esclarece Carlos Silva.
Na primeira sessão, prestada ontem, Carlos Silva contou como terá conhecido Orlando Figueira, aquando de uma visita a Portugal, no dia em que foi chamado a prestar declarações no DCIAP ao procurador Rosário Teixeira no âmbito do caso BANIF. O advogado Paulo Blanco também estaria presente. No fim do encontro, é apresentado a Orlando Figueira e um almoço foi marcado entre os quatro, no Ritz, uns dias mais tarde, ao qual Rosário Teixeira não pôde comparecer. Apesar dos dois encontros, Carlos Silva frisou, no entanto, que os dois não mantinham contacto e que não tinha “sequer o telefone de Orlando Figueira”.
Quando confrontado pelo MP com e-mails de Paulo Blanco, o banqueiro disse não recordar-se de os ter visto, e avisou logo o coletivo de juízes de que “a primeira regra de disciplina de um gestor é: e-mails são com uma assistente, a disciplina é ver os e-mails das pessoas com quem o gestor do banco interage”.
Nas anteriores sessões de julgamento, os arguidos Orlando Figueira e Paulo Blanco defendem que nos “bastidores” da celebração de contrato com a Primagest, que levou Orlando Figueira a abandonar a magistratura, estaria o banqueiro Carlos Silva. Para o tribunal, os contornos deste contrato são fundamentais para perceber se o magistrado foi corrompido ou não para arquivar processos que tinha em mãos quando trabalhava no DCIAP.
Em 2011, alegadamente, o banqueiro contratou o procurador português Orlando Figueira para este sair do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e ir trabalhar para uma empresa do grupo Banco Privado Atlântico, que dirigia. Mas o magistrado, hoje arguido no caso Operação Fizz, começou por ser contratado pelo Banco Comercial Português, do qual Carlos Silva também era acionista. Segundo a acusação, estes contratos eram fictícios e serviam apenas para justificar o pagamento de luvas ao procurador, por este ter arquivado investigações que tinha em mãos nas quais o vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, figurava como suspeito.
Orlando Figueira, principal arguido do processo, é acusado de ter sido corrompido pelo ex vice-presidente angolano, Manuel Vicente, e alega que os 760 mil euros que recebeu nas suas contas resultaram de um contrato de trabalho que assinou com Carlos Silva e não de uma verba para arquivar inquéritos do DCIAP em que Vicente era visado, designadamente na aquisição de um imóvel de luxo no edifício Estoril-Sol.
No início da 20.ª sessão de julgamento, em fevereiro, o presidente do coletivo, Alfredo Costa, que julga o processo Operação Fizz, considerara imprescindível ouvir presencialmente Carlos Silva, e recusara que este fosse inquirido no consulado de Portugal em Angola.
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