Herdade da Comporta à venda. Afinal, o que vai comprar o novo dono?

Muito se fala na venda da Herdade da Comporta, mas poucos sabem o que vai realmente ser vendido. Dos 12,5 mil hectares de propriedade, apenas 1,3 mil estão à venda.

Muito se tem falado na venda da Herdade da Comporta mas, o que muitos não sabem, é o que levará para casa o futuro proprietário. Dos 12,5 mil hectares que compõem a propriedade, apenas 1,3 mil estão prontos a ser vendidos, numa área onde estão inseridos dois projetos turísticos iniciados pelo Grupo Espírito Santo (GES), mas suspensos após o colapso do Banco Espírito Santo (BES). Somados a esses terrenos, está ainda uma dívida de 119,4 milhões de euros.

Manuel Espírito Santo adquiriu a Herdade da Comporta à britânica Atlantic Company, tendo a propriedade sido nacionalizada em 1974, mas acabando por voltar para as mãos da família no final dos anos 80. Considerada a maior propriedade privada no país, outrora destino de férias dos Espírito Santo, as dezenas de milhares de hectares da herdade contemplam uma parte com cerca de dez mil hectares agrícolas e florestais, estando a área restante destinada a projetos turísticos e imobiliários.

Após recuperar a propriedade, o objetivo do Grupo Espírito Santo (GES) foi sempre requalificar, de maneira a tornar a Herdade da Comporta um destino turístico único. Integrada na Reserva Natural do Estuário do Sado, a propriedade contempla várias praias e dunas, vinhas, matos, zonas florestais, salinas e 1.100 hectares de arrozais. Nela, está ainda instalada a antiga fábrica do arroz, datada de 1952, tornada pela família no Museu do Arroz e respetivo restaurante.

Em 2004, passou a ser designada oficialmente de “Herdade da Comporta – Actividades Agro Silvícolas e Turísticas, S.A., tendo por missão promover o desenvolvimento de um destino turístico de alta qualidade, sustentável, integrado numa propriedade agrícola que preserva o património ambiental e cultural, constituindo-se um modelo de referência na Europa”, conforme se lê no site oficial.

Projetos turísticos e dívida

Os negócios da Herdade da Comporta são dois: Herdade da Comporta — Actividades Agro Silvícolas e Turísticas, S.A., responsável pela gestão dos arrozais, e a Herdade da Comporta — Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado (FEIIF), criado em 2013, responsável pelos ativos imobiliários que o Grupo Espírito Santo (GES) detinha. Este último é o que está à venda. Gerido pela Gesfimo — Espírito Santo Irmãos, Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A, é detido na maioria pela Rioforte (59%), sociedade do antigo GES, tendo o Novo Banco uma participação de cerca de 15%.

O fundo foi criado há cerca de cinco anos, com o objetivo de arrancar com dois projetos turísticos — Comporta Links e Comporta Dunes. São estes os ativos imobiliários que estão à procura de comprador. O Comporta Links inclui uma área com 365 hectares, no concelho de Alcácer do Sal, onde iriam ser construídos dois hotéis, dois aparthotéis, lotes para moradias, várias unidades de aldeamento turístico e um campo de golfe com 18 buracos. Por sua vez, o Comporta Dunes, em Grândola, visava incluir, numa área de 551 hectares de pinhal e perto da praia: quatro hotéis, um aparthotel, vários lotes para moradias, unidades turísticas e um campo de golfe com 100 hectares.

Por último, o “pacote” inclui ainda alguns “lotes de terrenos não edificáveis, rurais e de floresta”, inseridos no Comporta Dunes, numa área de 460 hectares, somados a uma participação de 50% no capital social e direitos de voto da sociedade DCR&HDC Developments — Atividades Imobiliárias, sociedade detida pelo fundo da Comporta que desenvolve atividade imobiliária.

Contudo, não serão só coisas boas na mala do futuro dono — há três interessados, o consórcio detido pelo milionário francês Claude Berda e a empresária Paula Amorim, a holding Oakvest, controlada pelo empresário inglês Mark Holyoake, e associada à família Carvalho Martins, e a do aristocrata francês Louis-Albert de Broglieo –, também há coisas más. Somado a estes ativos imobiliários está ainda uma dívida à Caixa Geral de Depósitos (CGD), que já ascende aos 119,4 milhões de euros, aos quais se somam mensalmente juros de 850 mil euros. Em incumprimento há mais de dois anos, desse total, 98 milhões dizem respeito a um empréstimo inicial, aos quais se somam mais 19 milhões em juros que ainda estão por pagar. Neste sentido, a única forma de saldar essa dívida é vender os dois projetos turísticos que estão atualmente avaliados em mais de 200 milhões de euros.

Vender para escapar à insolvência

As obras para os dois projetos turísticos arrancaram, mas acabaram por ser suspensas… até hoje. Na base dessa interrupção esteve o colapso do BES, em 2014, no qual a Gesfimo confirmou a “difícil situação financeira” do fundo. Como se lê no Relatório de Gestão de 2017 do fundo, datado de 30 de abril, “a 20 de abril de 2018, em assembleia de participantes realizada para o efeito, [estes] votaram contra uma proposta de aumento de capital do fundo num montante estimado de 43 milhões de euros, não tendo apresentado alternativas que permitam ultrapassar as dificuldades de tesouraria do fundo”.

Neste sentido, continuou a Gesfimo, havendo esta rejeição, “pode perspetivar-se a eventual alienação dos ativos imobiliários mais representativos (…), no sentido de resolver a situação financeira do fundo e regularizar as responsabilidades vencidas, tendo alguns investidores já manifestado o seu interesse na aquisição desses ativo”, lê-se no documento. Estava, assim, tornada pública, a difícil situação financeira que o fundo fechado da Comporta atravessa, abrindo-se portas à venda de ativos imobiliários.

Assim, na sua proposta, a Gesfimo afirmava mesmo que “se não for realizada a venda dos ativos imobiliários, e outros, o Fundo poderá ter de enfrentar uma situação de insolvência, por indisponibilidade de meios financeiros”. No final do ano passado, o fundo imobiliário da Comporta apresentou um resultado líquido negativo de 12,9 milhões de euros, um valor que, apesar de tudo, conseguiu superar o registado no ano anterior (19,6 milhões de euros), de acordo com o relatório de contas.

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