Trabalho por turnos é prioridade do BE no Orçamento. Nunca houve tantos portugueses com horários rotativos

A poucos dias da votação na generalidade do OE, o BE entende não haver condições para viabilizar a proposta do Governo. Continuam assim as negociações e o trabalho por turnos mantém-se uma prioridade.

Foi uma das surpresas da proposta de Orçamento do Estado para 2020. Numa altura em que o número de portugueses com horários rotativos está em máximos, o Governo quer estudar o impacto do trabalho por turnos no mercado nacional. O Executivo deixa, assim, a porta aberta às alterações legislativas que tanto têm sido reivindicadas pelas bancadas parlamentares à esquerda, continuando, sabe o ECO, a ser uma das prioridades do Bloco de Esquerda nas negociações com António Costa.

De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística, há cada vez mais portugueses a trabalhar por turnos. No terceiro trimestre de 2019, eram já 835 mil os trabalhadores a fazer este tipo de horário (16,88% da população empregada). Destes, 425,3 mil eram mulheres e 409,8 mil eram homens.

Quase dois em cada dez portugueses trabalham por turnos

Fonte: INE

No total, de julho a setembro do último ano, registaram-se mais 37,9 mil trabalhadores com horários rotativos do que no período homólogo, ou seja, está em causa um aumento de cerca de 4,75%. O salto é ainda significativo se compararmos os dados mais recentes com os mais antigos. No terceiro trimestre de 2011 (ano que inicia a série do INE) eram 638,1 mil os trabalhadores por turnos em Portugal, menos 196,9 mil do que nos primeiros três meses de 2019.

No âmbito da revisão recente do Código do Trabalho, PCP e Bloco de Esquerda apresentaram uma série de propostas sobre o trabalho por turnos e noturno, que iam no sentido não só de limitar o recurso a este regime, mas também de reforçar os direitos dos trabalhadores nesses circunstâncias.

Em cima da mesa estava, por exemplo, a fixação de 35 horas semanais para os trabalhadores por turnos, a criação de um regime específico de reforma antecipada para os mesmos e a garantia de dois fins de semana de descanso a cada seis semanas de trabalho.

O PS juntou-se, contudo, ao PSD e ao CDS para chumbar todas estas alterações legislativas. Na altura, o PS — pela voz da então deputada socialista Wanda Guimarães — atirou esta questão para a contratação coletiva e para a Concertação Social.

Menos de um ano depois, o Executivo de António Costa escolheu agora incluir no Orçamento do Estado uma norma que prevê a análise desse regime, deixando a porta aberta a futuras alterações legislativas.

“Em 2020, o Governo apresenta um estudo sobre a extensão, as características e o impacto do trabalho por turnos em Portugal, tendo em vista o reforço da proteção social dos trabalhadores”, lê-se na proposta apresentada, em dezembro, na Assembleia da República.

“O estudo deve incluir, nomeadamente, os critérios referentes à necessidade de laboração contínua, bem como a fiscalização dos despachos que a determinam, os tempos de descanso entre turnos e mudança de turnos e, ainda, os mecanismos de conciliação com a vida familiar e pessoal, em especial para as famílias com filhos menores”, é sublinhado no mesmo diploma.

Numa altura em que nenhum “sim” ao Orçamento do Estado está garantido (exceto o do PS), este sinal pode ser mesmo um “trunfo” para que o Governo consiga o apoio das bancadas mais à esquerda.

As primeiras reações à proposta do Executivo não foram, no entanto, as mais positivas. A bloquista Catarina Martins defendeu que o documento em questão “não responde aos trabalhadores por turno”, nomeadamente no que diz respeito ao “seu direito ao acesso à reforma mais cedo”, medida que tem sido prioridade do BE nestas negociações, garantiu. Martins disse mesmo que, quando olha para a norma inscrita pelo Executivo, vê “projetos de intenções sem nenhuma capacidade de concretização”.

E a poucos dias da votação na generalidade da proposta orçamental, a mesa nacional do Bloco de Esquerda frisou mesmo que o Orçamento de António Costa “não só ignora injustiças que permanecem como as situações já identificadas de grande desgaste”, nomeadamente a dos trabalhadores por turno.

À saída dessa reunião, Catarina Martins revelou mesmo aos jornalistas que não estão ainda reunidas as condições para que o Bloco de Esquerda aprove ou viabilize a proposta de Orçamento do Estado, ainda que se mantenham disponível para negociar com o Executivo “até ao último minuto”. Ao ECO, fonte do partido confirmou, de resto, que o trabalho por turnos continua a ser uma das prioridades nessa negociação da qual está dependente a viabilização do OE pelo BE.

A proposta de Orçamento do Governo será votada na generalidade a 10 de janeiro. Se for aprovada, passa à discussão na especialidade, no âmbito da qual poderá haver espaço para que as bancadas mais à esquerda consigam maior “capacidade de concretização” de reivindicações como esta relativa aos trabalhos por turnos.

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