Portugal e Espanha dizem adeus ao carvão. Hídrica, eólica e gás natural no pódio das fontes de energia elétrica

No mix energético nacional domina agora a energia hídrica (36%), seguida da eólica (25%), gás natural (20%), cogeração fóssil (9,9%), biomassa (6,8%) e solar (2,6%).

O carvão já começa a ser uma raridade na Península Ibérica. De acordo com o mais recente relatório da tecnológica Schneider Electric sobre o mercado energético ibérico, tanto em Portugal como em Espanha a produção de eletricidade a partir da queima de carvão “reduziu-se praticamente para zero”, uma tendência que marcou os primeiros seis meses do ano e que se deve principalmente aos “baixos preços do gás e aos elevados preços das emissões de CO2”.

Os dois países já se tinham comprometido a encerrar todas as centrais a carvão nos próximos 3 anos, até 2023, mas o processo acelerou-se já no primeiro semestre de 2020. Em Portugal, apenas 0,5% da produção de eletricidade no país teve como origem o carvão entre janeiro e junho de 2020, de acordo com o boletim de renováveis da APRE. No mix energético nacional domina agora a energia hídrica (36%), seguida da eólica (25%), gás natural (20%), cogeração fóssil (9,9%), biomassa (6,8%) e solar (2,6%).

Olhando especificamente apenas para junho, o carvão desapareceu neste mês do mix enegético português, o gás natural disparou para os 30% da geração, o solar quase duplicou para os 4%, a cogeração fóssil chegou aos 11%, a biomassa aos 7,8% e a hídrica desceu a pique para os 22%, tendo em o menor índice de produtividade hídrica. Há um ano, no primeiro semestre de 2019, 15% da eletricidade produzida em Portugal ainda tinha como origem o carvão e a hídrica não ia além dos 19%.

Em maio, a associação ambientalista Zero deu conta do facto de a central de Sines praticamente não funcionar desde 26 de janeiro. A 14 de março foi a vez da central do Pego, da Trustenergy e da Endesa, desligar as turbinas. Tal não acontecia há 35 anos, desde que a central de Sines entrou em funcionamento no país. A EDP já avisou o Governo que quer encerrar Sines de vez em janeiro de 2021, enquanto a do Pego tem fim previsto para 2023.

De acordo com a APREN, no mês de julho o carvão já voltou entretanto a ser usado para produzir energia elétrica em Portugal, sendo responsável nesse mês por 2,4% da geração. Também no mês passado, as renováveis representaram 44,1 % do total de eletricidade gerada em Portugal Continental. Destaque para a produção de eletricidade solar fotovoltaica, que atingiu em julho um máximo histórico de 150 GWh, em parte, resultante de novos investimentos no setor, que se refletiram na entrada em operação, sob o regime geral de mercado, de 50,7 MW de nova potência nos últimos dois meses.

Mas pode Portugal sobreviver sem carvão e garantir a segurança energética do país apenas com renováveis? O ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, tinha já garantido que o Governo estava a estudar alternativas viáveis ao carvão de Sines e explicou agora quais são. “É muito importante o facto de os lotes neste leilão serem todos no sul do país. No caso de Sines, tínhamos dito que encerraríamos em 2023 com duas obras feitas: as barragens do Tâmega a produzir, e a linha de Ferreira do Alentejo-Tavira, que é desenhada exatamente para transporte de eletricidade de muitos destes projetos de energia solar. Mas essas duas grandes obras não vão estar prontas [até janeiro de 2021]. No caso da linha de alta tensão, nem estará iniciada”, disse Matos Fernandes em entrevista ao Jornal Económico (acesso pago).

Diz o ministro que, para que Sines desligue de vez as suas turbinas e o país prescinda de mais de 1000 MW de capacidade instalada, é necessária “uma reserva estratégica no Alqueva, o ligar à rede, e apressar o mais possível alguns projetos de solar que, entretanto, estão quase prontos, nomeadamente Ourique, para podermos garantir a segurança de abastecimento em janeiro. Vamos ter que, com o apoio técnico, do INESC TEC e da REN, perceber como podemos compensar o sistema para não haja qualquer problema na segurança de abastecimento. Temos que ter a certeza de que não há falhas. Não se pode falhar neste setor”.

Espanha investe de 200 mil milhões nas energias limpas

Do lado de lá da fronteira, em Espanha, o mês de junho marcou a data limite de encerramento para 9 das 14 centrais a carvão, que não tinham realizado investimentos nas melhorias ambientais exigidas pela legislação espanhola. “Assim, depois de junho, Espanha ficou de repente com menos de metade da capacidade instalada de carvão. Segundo o Plano Nacional de Energia e Clima do país, todas as fábricas a carvão deverão ser encerradas antes de 2025. Até lá, as poucas que restarem vão adaptar a produção em função da sua rentabilidade, tal como em Portugal”, refere a análise da Schneider Electric.

Ao mesmo tempo, esta redução para mínimos históricos da produção de energia elétrica com recurso ao carvão está já a ser compensada com uma maior produção através do gás natural, energias renováveis e nuclear. Até 2035 vai decorrer no país vizinho um plano de encerramento faseado das centrais nucleares. De acordo com o relatório da gigante tecnológica, no último ano em Espanha verificou-se um especial crescimento da produção de eletricidade a partir de energia renovável hidroelétrica, eólica e fotovoltaica, à semelhança de Portugal.

 

“Graças aos leilões realizadas pelo Governo espanhol em 2016 e 2017, e a um maior investimento privado, em finais de 2019 já se registava um aumento da capacidade renovável instalada. Ainda assim, para poder chegar aos limites de capacidade instalada definidos no Plano Nacional de Energia e Clima, é necessário que continue a existir um incentivo regulamentar por parte do governo que ajude a fomentar novos projetos”, diz a Schneider Electric. A 23 de junho, o governo espanhol aprovou um decreto real para favorecer as energias renováveis e a reativação económica. Com este novo enquadramento legal espera-se que sejam mobilizados mais de 200 mil milhões de euros de investimento entre 2021 e 2030, focados na redução das emissões, promoção das energias limpas e da eficiência energética, na mobilidade sustentável e nas cidades mais saudáveis.

O mesmo decreto define as bases para a celebração de novos leilões de energia renovável, com algumas mudanças relativamente aos que se realizaram no passado, para abranger todas as tecnologias. Em Portugal, vai decorrer no final de agosto o segundo leilão de solar, que inclui já a possibilidade de incluir projetos de armazenamento de eletricidade. Para o início de 2021 o Governo está já a prever a realização de um leilão para a produção de hidrogénio e mais dois leilões de solar ao longo do próximo ano.

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