Almofada financeira é o truque de Leão para combater Covid-19 sem aumentar dívida em 2021

Após vários anos a encher os depósitos públicos, o Executivo vai usar este dinheiro para financiar o Estado em tempos de pandemia e limitar o agravamento do endividamento.

O problema do elevado endividamento nacional tem levado o atual Governo a empenhar-se, há vários anos, na diminuição deste fardo. A pandemia levou, no entanto, a uma inversão na tendência, com a dívida portuguesa a atingir um máximo histórico em 2020. Já no próximo ano, o ministro das Finanças João Leão espera voltar a conseguir retomar a trajetória de redução, apesar de continuar a precisar de financiar o combate à pandemia. Como? O truque está na recuperação da economia e na almofada financeira.

“Em 2021 espera-se que o rácio da divida pública retorne à trajetória descendente dos anos anteriores a 2020. Nesse sentido, prevê-se uma redução do rácio de -3,9 [pontos percentuais] para 130,9% do PIB“, explica o ministério das Finanças na proposta de Orçamento do Estado para 2021, entregue esta segunda-feira ao Parlamento.

A dívida de 134,8% prevista em 2020 é um recorde para Portugal e deve-se tanto às necessidades do Estado de financiar o défice de 4,3% (causado pelo aumento das despesas com medidas de combate à pandemia e a quebra nas receitas públicas) como ao efeito da recessão esperada de 8,5% já que este indicador é medido através de um rácio face ao PIB. Em 2021, a lógica é a mesma, mas o efeito é o contrário: a expectativa do Governo é que a economia cresça 5,4%, o que faz com a dívida seja menos pesada. Assim, “o principal contributo [para a quebra do rácio da dívida] será dado pela retoma do crescimento nominal do PIB”.

Além deste, há um segundo contributo, que é dado “pela redução dos depósitos das administrações públicas em cerca de 1,7 p.p. do PIB”. É nos depósitos das administrações públicas que está a almofada financeira do Estado — que tem sido enchida desde a última crise financeira — e que será agora usada para travar o agravamento da dívida.

Dívida inferior a 100% do PIB só em 2032

Fonte: Proposta de Orçamento do Estado para 2021

A estratégia de gestão da dívida tem passado por manter os cofres cheios para fazer face a uma eventualidade. Tem sido assim desde que Portugal teve de recorrer a ajuda externa para evitar a bancarrota exatamente por ter os cofres quase vazios. No final do ano passado, Portugal tinha 12,7% da totalidade da dívida guardado em depósitos, o que lhe concedeu o título de país União Europeia (UE) com almofada financeira mais robusta.

Desde então, Portugal já reforçou essa poupança, segundo mostram os dados do Banco de Portugal. A dívida do país na ótima de Maastricht situava-se em 267,1 mil milhões de euros em agosto, mas líquida de depósitos era apenas de 242,6 mil milhões de euros. A diferença é de 10 mil milhões de euros face ao final do ano passado, sendo que, neste intervalo de tempo, o Tesouro gastou quase o mesmo montante para reembolsar investidores que detinham obrigações do Tesouro (OT) que atingiram a maturidade.

No final de 2020, o saldo da dívida direta do Estado deverá atingir 270,3 mil milhões de euros, aumentando 19,3 mil milhões de euros face ao final de 2019. Já em dezembro de 2021, as Finanças perspetivam que o saldo da dívida direta do Estado cresça mais 17 mil milhões e atinja 287,3 mil milhões de euros, desacelerando o ritmo de crescimento (6,3%) verificado no final do ano anterior (7,7%).

A variação anual de 17 mil milhões de euros esperada em 2021 resultará essencialmente do aumento do saldo vivo de OT (15,2 mil milhões de euros), uma vez que o montante do desembolso do remanescente dos fundos disponibilizados a Portugal no âmbito do SURE (2,9 mil milhões de euros) é equiparado ao montante de amortizações de Obrigações do Tesouro Rendimento Variável (3,5 mil milhões de euros). O saldo da dívida de retalho deverá registar um novo aumento em valor (cerca de 973 milhões de euros), mantendo-se relativamente estável em proporção do total da dívida”, acrescenta.

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