Prova dos 9. TAP paga mesmo mais que outras companhias aéreas?

Ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, diz que empresa paga mais que as congéneres. Os sindicatos rejeitam. Veja as contas.

A TAP prepara-se para receber mais de três mil milhões de euros em ajudas de Estado, que serão acompanhadas de um duro plano de reestruturação. Governo e empresa dizem não ter alternativa se não cortar custos operacionais e com pessoal, enquanto os sindicatos discordam da estratégia.

Foi neste cenário que o ministro da Economia trouxe a público uma questão que, de tempos a tempos, regressa: os salários na TAP. Pedro Siza Vieira defendia, na semana passada, que algumas remunerações são mais elevadas que as das pares. E dias depois, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, clarificava, dizendo que especificamente os pilotos é que têm ordenados desproporcionais.

Numa altura em que se discute o plano de reestruturação — que até 2025 prevê a saída de dois mil trabalhadores (além dos 730 que já saíram) e cortes salariais de 25% acima dos 900 euros mensais –, a questão é: será que os trabalhadores da TAP ganham assim tão bem? O ECO fez as contas e a prova dos 9 às afirmações do ministro.

A afirmação

As remunerações que são pagas a muitos dos trabalhadores [da TAP] são superiores ao que as suas congéneres e concorrentes suportam“, disse o ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira, esta quarta-feira na conferência de imprensa que se seguiu à reunião da concertação social. “Todas as companhias aéreas tem de fazer este esforço porque neste momento não há passageiros“.

Os factos

O Governo tem defendido que a TAP está sobredimensionada, com demasiados trabalhadores e muitos custos, especialmente para o impacto da pandemia no negócio. Era assim que se justificava a necessidade de despedir e cortar salários. Siza Vieira exemplificava com a alemã Lufthansa, que está a implementar reduções nos rendimentos de cerca de 45% e a despedir 27% dos trabalhadores. Mas em que circunstâncias chegaram à pandemia?

A companhia área alemã contava, no ano passado, com 37.721 trabalhadores, com os quais teve um custo de 3.049 milhões de euros, o que representa cerca de 80,8 mil euros por pessoa. O relatório anual da Lufthansa indica mesmo que os gastos com pessoal caíram 3% no ano passado, “devido principalmente a menores pagamentos de bónus e menores custos com reformas”. Se o indicador usado for o peso deste indicador face ao volume de negócios, então é cerca de 19%.

Em sentido contrário, a TAP viu os custos com pessoal aumentarem (7%) em 2019, devido a “novas contratações de colaboradores para fazer face ao crescimento de atividade com a expansão da frota, novas rotas e mais frequências, bem como aos aumentos salariais acordados com os sindicatos em 2018”. As 9.006 pessoas nos quadros de pessoal da TAP no final do ano passado custaram 678,6 milhões de euros à empresa, o que representa cerca de 75,3 mil euros por pessoa ou 21% do volume de negócios anual.

Olhando para o mesmo indicador dos custos com pessoal face ao volume de negócios, no caso do grupo dono da espanhola Iberia situa-se em 22% e nos franco-holandeses da Air France/KLM sobe para 30%.

Se olharmos para as low cost, não é comparável, e olhando para as congéneres então não é verdade“, diz André Teives, presidente do Sindicato de Técnicos de Handling e representante da plataforma dos sindicatos de pessoal de terra, sobre as declarações do ministro. Admite que uma empresa como a Ryanair possa pagar salários mais baixos, mas sublinha que o negócio é diferente. “A nossa principal concorrente, a Iberia, paga mais que a TAP. Não sei em que dados o ministro se baseia”, acrescenta.

O ministério da Economia não respondeu às questões do ECO até à publicação deste artigo. Mas Pedro Nuno Santos deu, em entrevista à SIC, dados mais concretos. “Os salários [da TAP estão] acima dos de algumas concorrentes, como a Iberia”, disse o ministro, apontando para diferenças salariais de 18% até 85% nos vencimentos de tripulantes da TAP em comparação com os da Iberia. E, recorrendo às suas notas, apresentou alguns valores brutos anuais que são pagos a alguns dos trabalhadores da companhia que agora é controlada pelo Estado:

  • Oficial Piloto com 1 ano na TAP – até 80 mil euros/ano
  • Comandante com 10 anos na TAP – até 185 mil euros/ano
  • Comandante com 20 anos na TAP – até 241 mil euros/ano
  • Comandante com 30 anos na TAP – até 260 mil euros/ano

O ECO tentou confirmar esta informação junto do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC), mas não foi possível. O Sindicato de Técnicos de Handling considera que estes valores estão fora da realidade, enquanto a Comissão de Trabalhadores da TAP diz não agregar esta informação.

Ainda assim, a coordenadora Cristina Carrilho, admite que há disparidades entre, por exemplo, pilotos ou técnicos não qualificados. “Se há a ideia que os pilotos são dos que mais ganham, é preciso dizer que os trabalhadores da manutenção são dos que menos ganham na Europa“, refuta. “Há quem vá para fora e ganhe, em 15 dias, o mesmo que num mês cá”, acrescenta Carrilho.

A Prova dos 9

Feitas as contas… É difícil tirar a Prova dos 9. Considerando os custos suportados pela TAP com o pessoal, dividindo por cada trabalhador, o valor das remunerações fica aquém dos obtidos pelos trabalhadores de outras companhias aéreas de “bandeira” de outros países europeus. E a mesma conclusão pode tirar-se quando se considerar o peso dos salários nas receitas.

Ou seja, à luz dos dados públicos, não seria correta a afirmação de Siza Vieira, mas é preciso ter em atenção que o ministro salientou que “muitos dos trabalhadores” da TAP auferem estes salários superiores aos de outras companhias, não todos. Tendo em conta os valores avançados por Pedro Nuno Santos, bem como a comparação destes com a Iberia, poderia dizer-se que sim, que a TAP paga mais, mas apenas em relação à congénere espanhola.

Tendo em conta que esta informação não é pública nem lá fora, nem pela TAP, torna-se impossível fazer a avaliação justa da afirmação em si. Assim, tendo em conta esta dificuldade em comparar diretamente os vencimentos as mesmas profissões nas diferentes companhias aéreas (que têm uma forte componente associada a remuneração variável), a resposta tem de ser: depende.

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