As 5 revelações do relatório secreto de Costa Pinto sobre o BES

O relatório que avalia a supervisão do Banco de Portugal na queda do BES é secreto. Enquanto Parlamento quer levantar confidencialidade do documento, audição de Costa Pinto trouxe revelações.

O Parlamento vai pedir ao Supremo Tribunal de Justiça para levantar a confidencialidade do relatório que avalia a atuação do Banco de Portugal antes da queda do BES. O documento continua a ser secreto para quase todos, mas a audição de João Costa Pinto (autor do relatório) na comissão de inquérito ao Novo Banco desvendou alguns segredos.

BdP não foi “enérgico” com problemas do BES

Foi uma das principais conclusões do relatório elaborado por Costa Pinto: uma intervenção “enérgica” do Banco de Portugal teria evitado ou minimizado os problemas do BES. “A supervisão não atuou em tempo útil nem com a energia com que devia ter atuado” antes do colapso do BES, disse Costa Pinto aos deputados, recorrendo ao relatório que ajudou a elaborar: “Chegou à conclusão, em momentos distintos, que uma atuação mais enérgica poderia ter evitado ou minimizado problemas”

Avisos sobre limites de grandes riscos foram ignorados

O relatório concluiu que “houve tolerância da supervisão em relação à ultrapassagem do limite de grandes riscos”, disse Costa Pinto. “É verdade. É inegável”. “Havia uma ultrapassagem sistemática dos limites dos grandes riscos, que era – na altura – de 20% dos fundos próprios [hoje é de 25%]. Havia a perceção de que a parte não financeira dependia da parte financeira. Ou seja, as empresas da parte não financeira não geravam cash flow suficiente para fazer face ao seu endividamento”, explicou o economista.

“Francamente, não sei precisar qual o momento exato em que a supervisão do BdP terá tido conhecimento. Mas havia a perceção que as dificuldades financeiras do GES na parte não financeira não eram conjunturais, mas sim estruturais”. Esta situação veio agravar-se depois da crise financeira de 2008.

Técnicos avisaram para complexidade do GES em 2011

“Salvo erro, em 2011”, contou Costa Pinto aos deputados, foi produzida uma nota interna em que os técnicos do Banco de Portugal manifestaram preocupações quanto à complexa estrutura do GES e que dificultava o seu acompanhamento para fins de supervisão. Isto mesmo vem no relatório secreto.

“Os técnicos que subscreveram essa nota chamaram à atenção para as dificuldades de acompanhamento do GES da parte da supervisão devido à extrema complexidade da estrutura do grupo e ao facto de a holding mãe, que era ao nível do qual se analisava as contas consolidadas, ter sede no Luxemburgo. (…) Essa holding podia tomar a decisão de abrir filiais em paraísos fiscais, fugindo ao controlo da supervisão do Banco de Portugal”, contou.

Que seguimento foi dado a esta nota? A comissão não teve “indicações de que essa nota tem subido ao conselho de administração”, sendo que “essa nota terá sido entregue pelo diretor de supervisão ao vice-governador e não terá tido consequências”, segundo Costa Pinto.

Salgado podia ter sido afastado mais cedo

Segundo Costa Pinto, e esta foi outra das conclusões do relatório secreto, Ricardo Salgado poderia ter sido afastado da gestão do BES mais cedo. Salgado só veio a sair a 20 de junho de 2014, quando o banco foi resolvido cerca de mês e meio depois, a 4 de agosto. “A comissão, no seu entendimento, achou que havia dois dispositivos da legislação da altura que teria permitido intervenção mais robusta no âmbito do ring fencing”, começou por dizer o antigo vice-governador.

“Os artigos 33.º e 141.º do Regime Geral das Instituições de Crédito (RGIC) davam instrumentos ao Banco de Portugal para intervir na administração do BES numa gradação que podia ir desde a substituição de administradores até à nomeação de administradores”.

Os problemas em Angola e a garantia soberana

Sobre o BES Angola, Costa Pinto adiantou que o Banco de Portugal só começou a olhar com preocupação para os problemas com o banco angolano pouco tempo antes de terem surgido notícias nos jornais a darem conta que se havia perdido o rasto a mais de 5.000 milhões de dólares emprestados a beneficiários finais desconhecidos.

“O BES Angola sempre deu lucros e, portanto, nunca foi verdadeiramente uma preocupação da supervisão. E bem? Não, mal! Porque a exposição ao BES Angola, num mercado com aquelas características, era suficiente em termos materiais para ter alertado a supervisão e iniciado uma atuação em tempo útil”, frisou.

Costa Pinto lembrou que as contas do BES Angola eram certificadas sem reservas pela KPMG Angola, pois havia uma garantia soberana irrevogável do Estado angolano no valor de 5.700 milhões de dólares que cobria estas perdas. E, nessa medida, as contas do BES em Portugal foram certificadas pelo auditor sem reservas. “A KPMG foi mais longe: quando foi questionada sobre o Banco de Portugal porque que não informou em tempo útil sobre os problemas, a partir do momento em que havia a garantia pública, nos não tinha de dizer nada”.

Costa Pinto classificou a garantia soberana de Angola “como uma das questões importantes mais mal explicadas de todo este processo”. Luanda veio a retirar essa garantia já depois da resolução do BES, em agosto de 2014.

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