Tribunal condena Anacom e ameaça anular leilão do 5G

A Anacom foi condenada em dezembro a readmitir uma empresa ao concurso para fazer a plataforma do leilão do 5G. Mas a venda foi adiante e, se a Justiça mantiver sentença, processo pode ficar ameaçado.

O leilão do 5G está novamente envolto em polémica, depois de uma decisão judicial agora conhecida ameaçar anular todo o processo. Em causa está o concurso público lançado pela Anacom há um ano para escolher a empresa que ficaria responsável por desenvolver a plataforma para o leilão.

A ANO – Sistemas de Informática e Serviços, uma empresa que tinha concorrido ao referido procedimento, não concordou com a decisão do júri de excluir a sua proposta. Por isso, decidiu avançar contra a Anacom num processo interposto no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, na expectativa de ser readmitida.

O tribunal concordou. A sentença, a que o ECO teve acesso, foi proferida em dezembro de 2020 e, nela, a juíza Clara Ambrósio dá razão ao argumento da ANO de que não havia lugar à exclusão da sua proposta. Desta feita, julgou “procedente o pedido de anulação do ato de exclusão” da proposta da ANO e condenou a Anacom “a admitir os atos administrativos devidos no tocante à posição jurídica” da ANO no concurso público em questão.

Mesmo assim, a Anacom decidiu dar continuidade ao leilão. A operação dura há 54 dias e o valor das frequências na fase principal aproxima-se dos 270 milhões de euros. Uma fase inicial destinada aos “novos entrantes” já foi mesmo concluída, sabendo-se que a Másmóvil terá sido uma das vencedoras.

Facto é que, à data da decisão, o concurso público já tinha terminado há muito. Foi em março de 2020 que o presidente da Anacom, João Cadete de Matos decidiu adjudicar o desenvolvimento da plataforma eletrónica do leilão à Ubiwhere, uma empresa portuguesa de tecnologia com sede em Aveiro, liderada por Rui Arnaldo Costa e Nuno Ribeiro. A adjudicação do projeto foi feita por 119,8 mil euros mais IVA.

Esta, por sua vez, também já tinha estado nas notícias por causa do leilão do 5G. A Ubiwhere foi acusada pela Altice Portugal, concorrente no leilão, de ter ligações à Vodafone. No entanto, como o ECO noticiou em novembro, a empresa também tinha ainda ligações à própria Altice, tendo garantido publicamente ser “idónea” para desenvolver o referido software.

Face a tudo isto, a decisão do tribunal nortenho lança mais uma dose de incerteza sobre o leilão de frequências do 5G, numa altura em que têm sido sucessivos os pedidos de suspensão por parte das operadoras envolvidas, para além das muitas críticas contra o regulamento. A notícia desta sentença foi avançada primeiro pelo jornal i.

Anacom “discorda” e recorre da decisão

Contactada pelo ECO, a Anacom confirmou ter recorrido da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.

“Nos termos previstos na lei e no exercício de um direito que lhe assiste, a Anacom apresentou recurso da decisão do tribunal administrativo de primeira instância, por discordar da mesma, pelo que, não tendo ainda a referida sentença transitado em julgado, não cabe, na presente data, proceder à execução da mesma”, afirmou fonte oficial.

No entanto, não é claro como poderá ser desatado este nó se a Justiça decidir manter a condenação, obrigando a Anacom a reabrir o concurso público. O desenvolvimento de um novo software poderia levar meses e a anulação do leilão em curso poderia abrir margem a forte litigância pelas operadoras, nomeadamente os “novos entrantes” que já compraram as frequências numa primeira fase, bem como a indemnizações.

Para já, a Anacom está confiante de que a sentença não vai afetar a venda das licenças para a quinta geração de rede móvel de comunicações. Fonte oficial do regulador das comunicações indica que, “se o tribunal de recurso mantiver a sentença de primeira instância, a Anacom analisará o acórdão que vier a ser proferido e, em função do teor do mesmo, avaliará a situação em concreto de entre as diversas alternativas legalmente previstas”.

Questionada, em concreto, se existe risco de o leilão vir a ser anulado, o regulador respondeu: “O atual leilão de 5G foi promovido para concretização do interesse público inerente ao mesmo, pelo que a Anacom assegurará, com base no quadro legal em vigor, a concretização do mesmo — donde o atual processo contencioso não afetará a tramitação e o resultado do procedimento do leilão”.

Redundância do leilão é o e-mail

A sentença da juíza Clara Ambrósio lança ainda alguma luz sobre o conteúdo das propostas apresentadas à Anacom e até sobre a própria plataforma em que decorre, atualmente, a venda das licenças do 5G.

Um dos aspetos centrais da litigância desencadeada pela ANO prende-se com uma exigência do caderno de encargos, relacionada com a estipulação de um mecanismo de redundância para que o leilão não tenha de parar em caso de falha na plataforma eletrónica.

Ora, a presumível inexistência de um sistema redundante esteve na base da exclusão da candidatura da ANO, mas também da vencedora Ubiwhere numa fase inicial. De facto, de acordo com a sentença, a adjudicação do contrato de desenvolvimento da plataforma foi atribuída a uma terceira concorrente, a OMIP (existia ainda uma quarta concorrente, a alemã Specure, mas a sua proposta foi excluída por vir em inglês, violando as regras do concurso).

O júri do concurso público defendeu, numa primeira fase, que a proposta da Ubiwhere não previa um verdadeiro mecanismo de redundância — se a plataforma falhasse, a opção seria continuar o leilão por carta ou retomar o mesmo num outro dia.

Porém, numa segunda análise, após requerimento da própria, o júri terá mudado de ideias, considerando que a proposta da Ubiwhere contemplava, na verdade, um sistema de redundância válido: o email. Será este, por isso, o atual mecanismo de redundância do leilão do 5G.

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