Inovação. Das algas aos portos, no oceano há um mar de oportunidades

Nos oceanos há muito por explorar, contam ao ECO especialistas em inovação na economia do mar. Das áreas mais tradicionais às mais recentes, há vários desenvolvimentos aos quais estar atento.

O primeiro evento da Conferência dos Oceanos decorreu durante o passado fim-de-semana, e foi dedicado à inovação. O Youth Innovation Summit juntou soluções de empreendedores para responder aos problemas dos oceanos e o ECO/Capital Verde quis saber, junto de alguns especialistas em inovação na economia do mar, quais as grandes apostas que estão a ser feitas nesta área.

Grandes investidores precisam de grandes investimentos. E a oportunidade para grandes investimentos nos oceanos está só a começar”, afirma Suzanne Johnson, conselheira financeira para a Ocean Stewardship Coalition. É que, conta Johnson, o 14.º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável, que consiste em conservar e usar de forma sustentável os oceanos, é o menos financiado destes objetivos das Nações Unidas – estima-se que sejam necessários 174,52 mil milhões de dólares por ano até 2030 para o concretizar mas, antes da pandemia, só tinham sido investidos menos de 10 mil milhões de dólares.

De momento, as três áreas da economia azul que se prevê representarem o maior valor acrescentado em 2030, de acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), são o turismo marítimo e costeiro (26% do valor acrescentado total), o petróleo e gás obtido no mar (21%) e, finalmente, as atividades portuárias (16%). Mas, embora estas áreas mantenham interesse económico, há outras emergentes, como a recolha de dados, a energia eólica offshore e o hidrogénio verde, ou até as algas marinhas, que estão a captar cada vez mais interesse e a pedir inovação.

Recolha de dados

Quando se fala de inovação nos oceanos, o especialista em Inovação nos Oceanos do Fórum Económico Mundial, Ronald Tardiff, que veio a Portugal para participar no Youth Innovation Forum, vê como essencial investir em todo o tipo de dispositivos que permita uma melhor recolha de dados sobre os oceanos, os quais “muitas vezes não estão disponíveis”. É necessária mais informação sobre tudo, desde biodiversidade, temperatura, densidade, até à salubridade das águas, de forma a atuar adequadamente. Isto é um desafio porque, em ambiente marinho, os aparelhos de avaliação estão sujeitos a condições muito mais severas do que à superfície.

O co-fundador e CEO da Beta-i, Pedro Rocha Vieira, concorda que o investimento na observação, sensorização e monitorização para recolha de dados é “prioritário”, acrescentando que é necessária a digitalização da economia do mar, através por exemplo da criação de um “gémeo digital” do oceano, com o auxílio de inteligência artificial.

Algas – a versatilidade de um novo recurso

“As algas marinhas têm atraído uma atenção incrível, estão a tomar o centro do palco”, diz Tardiff. Estas são úteis para restaurar os oceanos, para mitigar as alterações climáticas, para substituírem componentes de produtos de plástico, farmacêuticos ou cosméticos. Suzanne Johnson classifica as algas como um “recurso promissor” porque “crescem rapidamente, criam milhões de empregos, podem ser uma importante fonte de alimento e absorvem carbono”.

Turismo ainda domina

Globalmente, o valor de mercado dos recursos marinhos e costeiros e respetivas indústrias está estimado nos 3 biliões de dólares anuais, o equivalente a 5% do produto interno bruto mundial, dizem os dados do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP, na sigla em inglês). “O principal setor relacionado com a economia azul é o turismo e a necessidade que este seja mais sustentável vai requerer inovação”, sublinha Pedro Rocha Vieira. Suzanne Johnson vê o ecoturismo como uma tendência a que os investidores estão atentos. A esta área associa-se a resiliência costeira, continua Marvão, pois cerca de 80% da população vive em cidades que estão ameaçadas pelas alterações climatéricas e pelo aumento do nível do mar.

Na energia, dos fósseis ao verde

“Espero que tenhamos menos investimento em petróleo e gás offshore e mais em energias renováveis, já que estão a acontecer desenvolvimentos muito interessantes ao nível da energia das marés, por exemplo”, diz Tardiff. Ainda nas estimativas da OCDE, as eólicas offshore, uma alternativa limpa, aparecem em sexto lugar em termos de valor acrescentado até 2030, com um peso de 8% no total. Suzanne Johnson avalia que existe, de momento, “boa” tecnologia e um “bom” volume de investimento para esta área, mas “os portos que suportam as eólicas offshore carecem de mais investimento”.

Nos portos, a energia também é tema

No que diz respeito aos portos, Tardiff indica que a inovação se baseia sobretudo no encontro das várias indústrias que se encontram neste local – retalho alimentar, petróleo e gás, entre outras – que vão partilhando desenvolvimentos. Johnson indica que, embora mais de 80% do comércio mundial seja transportado a bordo de navios, a grande maioria destes usa combustíveis poluentes, pelo que a descarbonização destas frotas está de momento em foco. A tecnologia necessária para a mudança existe, mas precisa de escala, de uma forma que os primeiros a adotar não sejam prejudicados, defende.

O hidrogénio verde e azul têm nos portos o local para proliferarem, acrescenta Tardiff. Trata-se de dar um novo propósito às infraestruturas portuárias, onde estas tecnologias cabem que nem uma luva, diz.

Em Portugal, está em marcha a Atlantic Smart Ports Blue Acceleration Network, desenvolvida pela Beta-i, que pretende tornar os portos mais verdes e inteligentes, com fontes de energia limpa, instalações portuárias para energia offshore e melhor gestão de resíduos.

Aquacultura e pescas

“As pescas e aquacultura são negócios importantes para a dieta global e um sustento para pessoas que vivem em áreas costeiras”, relembra Suzanne Johnson, que atira ainda dois números: prevê-se um crescimento de 20% na procura por peixe, globalmente, até 2030, e um crescimento de 7 a 20% na economia ligada à aquacultura.

Em Portugal, Pedro Rocha Vieira destaca o exemplo da Oceano Fresco, uma startup de marisco sustentável que “tem conseguido levantar rondas de investimento consideráveis”. Esta utiliza técnicas de aquacultura inovadoras para o cultivo de espécies bivalves, tendo como objetivo aliar a regeneração da natureza com a forma como se come e cultiva.

Ao mesmo tempo, é preciso ter em mente onde é que a maior parte da inovação é necessária: nos países em desenvolvimento, ressalva Tardiff. Por isso, a acessibilidade económica das soluções tanto ao nível da pesca como de outras áreas relacionadas com o oceano “terá de ser uma preocupação transversal a qualquer desenvolvimento que se procure”, defende.

Todavia, “alguns dos desafios que temos não precisam necessariamente de inovação, que não é a única solução”, alerta Tardiff. A título de exemplo, o problema da sobrepesca precisava sobretudo de um compromisso que determinasse o fim dos subsídios perversos, um acordo que demorou 20 anos a ser conseguido, mas que foi o mais eficaz, mais do que qualquer inovação tecnológica, aponta.

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