Associações pedem adiamento da nova contribuição sobre os plásticos

Indústria dos plásticos, hotelaria e restauração e Deco Proteste pedem adiamento da aplicação da nova contribuição sobre as embalagens de plástico de uso único para refeições. Ambientalistas aplaudem.

As embalagens de plástico ou multimaterial com plástico, que sirvam para uso único em refeições prontas a consumir (nos regimes de take-away, drive-in e entrega) estão a partir desta sexta-feira sujeitas a uma taxa de 30 cêntimos, uma medida que tinha sido anunciada para janeiro e adiada devido à pandemia de Covid-19. A taxa passa a ser cobrada com o objetivo de reduzir o consumo destes produtos na União Europeia, alinhado com a Estratégia Europeia para os Plásticos, numa iniciativa apoiada pelos ambientalistas. No entanto, as entidades envolvidas, desde a indústria dos plásticos até à indústria hoteleira, levantam questões em relação à aplicabilidade da medida e pedem o adiamento da entrada em vigor.

“Uma contribuição desta natureza é, do ponto de vista financeiro e de tesouraria, incomportável, mais ainda num momento particularmente difícil que as empresas atravessam”, afirma Nuno Aguiar, diretor técnico da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos (APIP). Isto porque os produtores têm de adiantar as contribuições ao Estado, embora estas vão sendo repercutidas ao longo de toda a cadeia, até acabarem por ser suportadas pelo consumidor final. “Estar a cobrar 30 cêntimos por embalagem quando algumas são vendidas pelo produtor/importador aos seus clientes, na sua maioria distribuidores, a rondar os 10 cêntimos, é estar a pedir às empresas que numa encomenda de 5.000 euros paguem 20.000 euros”, explica. “Não há tesouraria que resista nem seguro de crédito que comporte, levando certamente muitas empresas a encerrar ou a diminuir a sua atividade, com as consequentes repercussões económicas”, conclui.

Mas há mais problemas que a APIP identifica na implementação da portaria: além do peso financeiro que representa para os produtores, “esta regulamentação levanta diversos constrangimentos em matéria regulatória e operacional”, indica Nuno Aguiar. Um deles é que continuam a persistir “muitas dúvidas” nos diversos agentes da cadeia de valor no que toca às embalagens e produtos que estão abrangidos pela contribuição. Apesar de os produtores e importadores serem os sujeitos passivos alvo da contribuição, isto é, aqueles que a adiantam ao Estado, estes não conhecem o destino final das embalagens, do qual depende a aplicação da contribuição. “Esta é uma das maiores dificuldades de aplicação”, sublinha a APIP.

Outra das críticas da indústria dos plásticos à portaria é que a medida define prazos diferentes para entrada em vigor no que diz respeito aos materiais de plástico (1 de julho de 2022) e os de alumínio (1 de janeiro de 2023). Na ótica da APIP, a portaria “deveria considerar os mesmos prazos de entrada em vigor para todos os materiais, colocando no mesmo patamar os materiais e as indústrias que concorrem para a mesma aplicação, constituindo-se atualmente como uma medida discriminatória”.

“Atendendo aos diversos constrangimentos legislativos e operacionais que esta medida acarreta, apelamos à sensibilidade da área governativa, para que esta regulamentação possa ser revogada ou adiada, alinhando os prazos da entrada em vigor com o material alumínio, e revista de uma forma holística e com uma visão sistémica, não só mitigando os constrangimentos acima referenciados, como também potenciando a concretização dos objetivos ambientais (redução e reutilização) que estiveram na base da proposta desta medida”, defende a APIP.

Neste sentido, a associação apela ao adiamento da implementação da medida para 1 de janeiro de 2023 e para uma revisão do valor da contribuição, acrescentando que se desconhece o racional que esteve na base da definição do valor de 30 cêntimos.

Um entendimento semelhante ao da APIP é expressado pela Associação da hotelaria, restauração e similares de Portugal (AHRESP) e pela Deco Proteste que, num comunicado conjunto emitido esta sexta-feira, “assinalam as dúvidas que ainda persistem sobre esta contribuição, que consideram pouco adequada e desenquadrada do atual panorama económico e social, com a pressão inflacionista que afeta empresas e cidadãos”, pedindo, assim, o adiamento da cobrança.

“Tendo em conta que este encargo será suportado pelos consumidores finais, seria importante considerar o momento difícil que todos vivemos com um aumento generalizado de preços”, indica Rita Rodrigues, diretora de comunicação e relações institucionais da Deco Proteste, na referida nota.

O presidente da AHRESP, Carlos Moura, diz-se “muito preocupado com os critérios de aplicação desta contribuição”, desde logo “por não considerarem a quantidade e tipo de plástico incorporado no produto, mas também pela inexequibilidade de aplicação da medida em várias atividades económicas”. A AHRESP afirma ainda que aguarda esclarecimento por parte da Autoridade Tributária sobre qual a taxa de IVA a aplicar à contribuição.

Ambientalistas aplaudem taxa com algumas reservas

As associações ambientalistas ouvidas pelo ECO/Capital Verde olham com bons olhos para esta nova taxa cobrada sobre a utilização de embalagens únicas de plástico, reconhecendo que este novo incentivo poderá ser suficiente para alterar os hábitos dos consumidores. Ainda assim, a Zero considera que a medida fica aquém por não haver uma resposta dos estabelecimentos nem uma cobrança mais abrangente.

“É uma medida coxa por ser só ser só sobre um material, mas dá um sinal claro para os consumidores perceberam que devem procurar alternativas”, diz a Susana Pinheiro, vice-presidente da associação ambientalista, frisando que os consumidores “são sensíveis aos custos das coisas” e que “estas ferramentas são eficazes para alterar a prática no consumo”. No entanto, “não é ideal porque era importante que houvesse uma solução dos próprios estabelecimentos e uma taxa que abrangesse todas as embalagens descartáveis. Mas é um caminho”.

A mesma responsável deixa ainda a nota de que poderá haver um risco de “migração” para outros materiais, como o alumínio, uma vez que a cobrança sobre embalagens de utilização única deste tipo de material só deverá arrancar a 1 de janeiro de 2023. Será, então, nessa altura que se assistirá a uma “redução significativa” destes resíduos. Por agora, diz a responsável, “não se prevê grandes ganhos”.

Já a Quercus acredita que as atividades de takeaway e entrega ao domicílio, “que tiveram uma crescente utilização durante a pandemia”, poderão ver um ligeiro abrandamento na atividade uma vez que os consumidores poderão optar por comer as refeições no próprio local ou a levar os seus próprios recipientes. No entanto, o principal custo ficará dependente do consumidor final. “Este é um tipo de consumo que está firmado e bem aceite pelo consumidor, pelo que se prevê uma simples alteração de tipo de embalagem utilizada, de utilização única para reutilizável”, argumenta fonte oficial da Quercus ao ECO/Capital Verde. Desta forma, acredita, “as empresas serão estimuladas a produzir e comercializar as embalagens reutilizáveis para não pagarem o contributo sobre as embalagens de utilização única”.

No final, o grande beneficiário desta nova cobrança será o ambiente, não só através da redução da produção de resíduos, como também pela “redução da deposição em aterro e a incineração e a contaminação ilegal e acidental no meio natural” deste tipo de embalagens de plástico, explica a Quercus.

A APIP, por seu lado, defende que as várias medidas restritivas que têm vindo a ser definidas para os materiais plásticos, ao longo dos últimos tempos, não apresentam estudos de avaliação de impacto destas medidas (ambiental, económico e social), “algo que deve acontecer em toda e qualquer medida legislativa desta natureza”.

Do ponto de vista ambiental, importa sobretudo realizar a análise de ciclo de vida, a fim de determinar a pegada ecológica das diversas opções, “sob pena de estarmos a avançar para soluções menos sustentáveis e com maiores impactes para o ambiente”, diz Nuno Aguiar. Uma consequência negativa da portaria pode ser, aponta, o aumento das importações de materiais alternativos provindos maioritariamente de países asiáticos, que podem ter uma maior pegada de carbono.

“A indústria continuará a procurar inovar quer ao nível dos seus processos quer dos seus produtos, o que requer investimentos e o devido tempo para que se possa adaptar aos diversos contextos legislativos”, conclui.

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