Exclusivo Ministério Público recusa realização de perícia médica a Berardo, depois de investigar médica por alegado atestado falso

Ministério Público considera que perícia médica a Joe Berardo é inútil, depois de ignorar dois pedidos da defesa para a realização da mesma. Processo continua fechado à defesa, à revelia da Relação.

O Ministério Público (MP) recusou a realização de uma perícia médica independente a Joe Berardo, pedida pela defesa do ex-empresário, por considerar ser “inútil”, sabe o ECO/Advocatus. Uma recusa que surge num contexto em que, segundo a CNN avançou na terça-feira, uma médica e diretora dos serviços de Psiquiatria do Instituto Português de Oncologia, é suspeita de ter falseado informações clínicas de diagnóstico ao empresário Joe Berardo.

Em causa, um relatório clínico de 2021, a atestar que o comendador sofria de deficit cognitivo – tendo a memória recente afetada. O documento médico aponta ainda outras limitações de memória em relação aos seus atos empresariais, bem como a falta de condições para Joe Berardo se defender.

E, apesar da Justiça suspeitar da veracidade dos atestados médicos realizados pela médica em questão, essa mesma Justiça ignorou durante mais de um ano os pedidos da defesa do arguido para realização de uma perícia independente e, agora, vem recusar essa mesma perícia. Que serviria para ajudar (ou não) na prova relativa ao inquérito que invoca suspeitas de atestados falsos.

A defesa de Joe Berardo terá, inclusive, pedido por duas vezes – no final de 2021 – a realização dessa perícia médica independente, realizada pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, mas nem o MP aceitou, nem o juiz de instrução Carlos Alexandre deu o aval a essa mesma perícia. Contactado pelo ECO; o magistrado remeteu-se ao silêncio. Bem como fonte oficial a PGR que não confirmou nem desmentiu a recusa dessa perícia.

Atestados: o que dizem do estado de saúde de Joe Berardo

Num primeiro momento, o arguido Joe Berardo pediu (em setembro de 2021) uma perícia médica psiquiátrica, colegial e independente, que teria sempre de ser formalmente pedida pelo juiz de instrução ou pelo Ministério Público. Logo nesse requerimento feito pela defesa do empresário madeirense, juntava-se relatórios médicos já feitos que denunciavam uma depressão (do grau maior) e um déficit cognitivo (de grau menor) Este último diagnóstico revelou ter expressão e impacto na memória recente problemas na concentração, na aprendizagem, deficits nas capacidades multitasking e gestão de stress, uma desinibição afetiva ligeira e difícil controlo da impulsividade.

Perante a ausência de resposta por parte da Justiça, cerca de um mês depois, a defesa do arguido voltou a insistir no tema. À data, voltou a não receber resposta. Mas, agora, o ECO sabe que o Ministério Público considera que essa perícia está ferida de inutilidade, recusando-a. O ECO/Advocatus contactou o advogado de Berardo, Paulo Saragoça da Matta, mas sem sucesso.

Salgado já teve quatro recusas da Justiça

Esta recusa de perícia médica a arguidos não é caso único. Em fevereiro deste ano, a Procuradoria-Geral da República (PGR) recusou-se a pedir uma perícia médica, também independente, que comprove a doença de Alzheimer de Ricardo Salgado. Esta foi, aliás, a terceira recusa da Justiça portuguesa, depois de, no ano passado, o Ministério Público (MP) no âmbito da Operação Marquês, ter decidido no mesmo sentido, tal como o juiz do mesmo processo em que Salgado acabou condenado a seis anos de pena de prisão efetiva, também no ano passado.

Mais recentemente, foi a vez da juíza de instrução do processo EDP –– cujos principais arguidos são Manuel Pinho e Ricardo Salgado – ter recusado a realização de uma exame médico, nesta fase de instrução em que o processo se encontra.

A juíza considera que essa perícia seria “manifestamente contrária aos fins da instrução” e que isso não iria interferir com uma eventual pronúncia do arguido para julgamento, segundo pode ler-se no despacho da juíza do Tribunal Central de Instrução Criminal.

“Não sendo invocada a possibilidade de existir uma patologia incapacitante ou anomalia psíquica aquando da prática dos factos (na perspetiva da acusação) é despicienda, nesta fase, a sua ponderação, pois tal importa especialmente à fase de julgamento e, até, de um eventual cumprimento de pena ou da adequação de imposição de uma pena ou uma medida de segurança”, pode ler-se no documento assinado pela magistrada.

Isto depois da defesa de Ricardo Salgado ter pedido o arquivamento do processo EDP no que diz respeito ao antigo presidente do BES, que justificou com o diagnóstico de doença de Alzheimer e com o seu “estado demencial”.

“O quadro clínico de defeito cognitivo que apresenta atualmente, nomeadamente o defeito de memória, limita a sua capacidade para prestar declarações em pleno uso das suas faculdades cognitivas”, pode ler-se no requerimento de abertura de instrução, assinado pelos advogados Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce, que acrescenta: “A situação clínica do arguido impõe o arquivamento do presente processo. A causa de arquivamento deste inquérito quanto ao arguido impõe-se num plano prévio de inviabilidade de exercício pleno do direito de defesa”.

Segundo o requerimento, os advogados juntam vários documentos clínicos e o parecer do neurologista Joaquim Ferreira, que atestou “um diagnóstico final e definitivo”, confirmando que o antigo líder do Grupo Espírito Santo (GES) tem Doença de Alzheimer, “apresentando um agravamento progressivo das limitações cognitivas e motoras”.

Processo continua em segredo, apesar da Relação ter decretado a publicidade

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) continua a vedar o acesso ao processo que envolve Joe Berardo em suspeitas de administração danosa, burla qualificada, fraude fiscal e branqueamento de capitais, está ainda em segredo de Justiça.

Apesar de, formalmente, essa não publicidade do processo ter terminado a 21 de outubro, o Ministério Público (MP) está a vedar o acesso ao processo CGD/Berardo à defesa de Joe Berardo, a cargo do advogado Paulo Saragoça da Matta.

O ECO tentou igualmente ter acesso a esse processo mas a resposta que fonte oficial do DCIAP — onde corre o processo – deu foi a de que essa mesma consulta era impossível,” em virtude de os autos se encontrarem sujeitos a Segredo de Justiça”.

Apesar da acusação insistir que este processo — que investiga a suspeita de crimes alegadamente cometidos por Joe Berardo e o seu advogado (à data), André Luiz Gomes — continua em segredo de Justiça, o mesmo deixou de o estar desde finais de outubro. Conforme comprova a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, datada de 15 de junho do ano passado (2022) que negou o recurso pedido pelo MP para prorrogar o sigilo da investigação.

No recurso do Ministério Público para a Relação de Lisboa era pedido que ao prazo de segredo de justiça de 24 meses acrescessem 62 dias, passando o seu fim a ocorrer no dia 31 de dezembro com a justificação que essa “ampliação” do prazo fazia todo o sentido “na medida em que, por força das contingências decorrentes da situação de pandemia, a investigação sofreu sérios atrasos e não pôde realizar diligências de prova que, de outra forma, já teriam sido concretizadas”.

Mas a Relação respondeu que não concluiu por nenhum atraso nessa mesma investigação, nem tão pouco “que diligências não foram realizadas. Acresce que a regra é hoje a da publicidade do processo, sendo o segredo de justiça a exceção, que só deve ser decretado quando se entenda que a aquela prejudica os direitos dos sujeitos ou participantes processuais. Por conseguinte, não se entende o que pretende o Ministério Público”, diziam os desembargadores, em junho de 2022. Concluindo que o que pretende o MP, “sem ter parado o inquérito, é beneficiar de mais 62 dias de segredo de justiça, o que afronta o espírito da lei”.

Em junho de 2021, Joe Berardo, bem como o seu advogado André Luiz Gomes, foram detidos por suspeitas de burla à Caixa Geral de Depósitos (CGD). Em causa está a “suspeita da prática dos crimes de administração danosa, burla qualificada, fraude fiscal e branqueamento” de capitais, por Joe Berardo e o seu advogado. “A operação da PJ incidiu sobretudo num grupo económico que, entre 2006 e 2009, contratou quatro operações de financiamentos com a CGD, no valor de cerca de 439 milhões de euros.

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