Anacom obriga Altice a permitir acesso à rede de fibra ótica em 612 freguesias

Regulador analisou vários mercados relacionados com internet fixa e prepara-se para impor à Altice que permita aos concorrentes acederem à sua rede de fibra em 612 freguesias. Mas não só.

João Cadete de Matos, presidente da Anacom, e Luís Gaspar, diretor-geral de regulação, apresentaram esta quarta-feira as imposições de partilha de infraestruturas que vão ser aplicadas ao grupo AlticeHugo Amaral/ECO

A três meses e meio de terminar oficialmente o mandato, o presidente da Anacom desvendou esta quarta-feira três decisões preliminares envolvendo a Altice e empresas associadas. A intenção de João Cadete de Matos é forçar o grupo que controla a Meo a partilhar infraestruturas com os concorrentes, por ter “poder de mercado significativo”, na ótica do regulador.

Ao abrigo de uma uma dessas decisões, a Altice, a Meo, a Fastiber e a Fibroglobal (esta última adquirida pela Fastiber no ano passado) vão ser obrigadas a ter ofertas grossistas de acesso a fibra ótica em 612 freguesias do país com “preços justos e razoáveis”, que permitam que as outras operadoras desenhem as suas próprias ofertas “de uma forma rentável”.

Nas 612 freguesias em causa (ver mapa abaixo), a Altice e empresas relacionadas têm “uma rede de fibra ótica com mais de 15% de cobertura” e mais de 50% de quota de mercado. O presidente da Anacom revelou aos jornalistas esta quarta-feira que, das mais de seis centenas de freguesias abrangidas, 46% são freguesias em que a rede é gerida pela Fibroglobal, e a lista abrange 90% das freguesias onde esta empresa grossista está presente.

Mas não é tudo. O grupo Altice também vai continuar a estar sujeito à obrigação de disponibilizar ofertas de referência de acesso a postes e a condutas “em todo o território nacional”, para que os “operadores alternativos” possam usar estas infraestruturas para “construírem redes próprias”, o que tem sido “relevante para o desenvolvimento de redes de internet de elevada capacidade no país”, explica o regulador das comunicações. Pelo contrário, vão ser abandonadas as obrigações relacionadas com a rede de cabo, que a Anacom entende ter “vindo a perder relevância”.

Antes destas decisões, a Anacom levou a cabo uma análise a nove “mercados relevantes” relacionados com internet fixa. Em alguns deles, detetou que “a Meo ou as empresas do grupo Altice são identificadas como empresas com poder de mercado significativo”. “Isso significa que a empresa detém uma posição económica que lhe permite agir, em larga medida, de forma independente dos seus concorrentes, dos seus clientes e dos consumidores em geral, com potencial prejuízo dos mesmos”, explica num comunicado que resume os três “sentidos prováveis de decisão” aprovados a 26 de abril, mas só agora conhecidos.

Os sentidos prováveis de decisão da Anacom, que geralmente recebem aprovação final, vão ser “submetidos a audiência prévia das entidades interessadas e ao procedimento geral de consulta pelo prazo de 30 dias úteis”, com o presidente da Anacom a prever que se materializem ainda este ano.

Face a estas decisões preliminares, o ECO contactou fonte oficial da Altice Portugal no sentido de obter uma reação. “Sem prejuízo de estarmos a analisar os documentos em detalhe, com vista a preparar a nossa pronúncia dentro do prazo previsto, sublinhamos que qualquer intervenção regulatória não poderá deixar de ser adequada e proporcional, e ter presente quer a promoção do investimento, quer a necessidade de garantir a previsibilidade regulatória”, sublinha a empresa.

E defende: “Relembramos o forte investimento privado que temos vindo a realizar em todo o país, no que concerne à modernização das infraestruturas de comunicações, o qual, nos últimos anos, rondou os 500 milhões de euros/ano e permitiu a construção daquela que é hoje uma das maiores redes de fibra ótica da Europa, disponível para ser utilizada por todos os operadores, e garantindo a igualdade de acesso e oportunidades a todos os Portugueses, sem qualquer discriminação territorial.”

A decisão da Anacom de regular a rede de fibra ótica da Altice contrasta com o que o regulador decidiu em 2016. Na altura, a fibra estava em crescimento, mas o cabo ainda era o tipo de acesso mais comum. A 23 de dezembro desse ano, a Anacom informou ter decidido não impor regulação no acesso à rede de fibra ótica da Meo, uma opção que mereceu críticas do então presidente executivo da Vodafone, Mário Vaz: “É lamentável que uma vez mais a Anacom tome uma não decisão. A fatura já está a ser paga pelas populações, penalizadas pela falta de concorrência, traduzida na menor inovação, num pior serviço e ofertas mais caras”, disse o gestor.

Confrontado com este facto, João Cadete de Matos, presidente da Anacom reconheceu que a visão de que as operadoras concorrentes iriam construir as suas redes de fibra usando as condutas e os postes da Meo não se materializou: “Aquilo que foi decidido na altura foi uma aposta do ponto de vista de regulação no acesso às infraestruturas — às condutas e aos postes — e a ideia de que, dessa forma, haveria condições para o investimento em todo o território, que todos os operadores tivessem redes próprias. Isso não aconteceu, por uma questão de rendibilidade desse investimento”, admitiu.

Mapa das 612 freguesias abrangidas pela decisão

Fonte: Anacom

Na conferência de imprensa desta quarta-feira, os responsáveis da Anacom também avançaram informação adicional sobre o dossiê das chamadas “zonas brancas”, as regiões do país que não têm cobertura de rede e que, já tendo sido identificadas em detalhe, serão alvo de investimento público com o apoio de fundos europeus. O Governo chegou a prever avançar com os concursos públicos até final de 2022 e, ultimamente, durante o primeiro trimestre. Mas, segundo explicou o regulador, as interações com a Comissão Europeia ajudam a explicar os atrasos que têm ocorrido.

“A Comissão Europeia teve de definir as regras e a concretização do que eram estas áreas alvo do concurso”, disse Cadete de Matos, referindo que a “intenção da parte do Governo” e a de acelerar este processo. “Mas, como se pretende obter fundos europeus, temos de aguardar pela clarificação das regras”, sinalizou.

O dossiê das “zonas brancas” difere das decisões anunciadas esta quarta-feira sobre a fibra ótica da Altice, principalmente, porque o primeiro abrange zonas onde não há rede, enquanto as decisões mais recentes abrangem zonas do país onde já há fibra. O objetivo é, por isso, o de promover a concorrência, enquanto as “zonas brancas” visam ajudar a universalizar o acesso.

(Notícia atualizada a 4 de maio, às 10h51, com reação da Altice Portugal)

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