Carlos Alexandre acusado de não acatar decisões do Tribunal da Relação

CSM diz apenas que ainda não tem os factos todos, depois da Relação o acusar de violar o acatamento de decisões dos tribunais superiores. Ivo Rosa tem contra si um processo por esse mesmo motivo.

O Tribunal da Relação de Lisboa acusou o juiz de instrução Carlos Alexandre de não acatar uma decisão de um tribunal superior, ao ter mantido, a 28 de outubro de 2022, o arresto da pensão de Manuel Pinho, arguido no caso EDP. O que aconteceu quinze dias depois dos juízes desembargadores – com graduação superior à de Carlos Alexandre, à data – terem decretado que essa pensão do ex-ministro da Economia deveria ser ‘libertada’.

Questionado pelo ECO, o Conselho Superior da Magistratura (CSM) não quis esclarecer se iria ser aberta uma averiguação disciplinar, à semelhança do que fez com o juiz de instrução Ivo Rosa, em 2022, que tem contra si dois processos disciplinares por esse mesmo motivo. “O CSM não conhece ainda o integral contexto dos factos, estando a acompanhar a situação no âmbito das suas competências”, disse apenas fonte oficial do órgão responsável pela ação disciplinar dos magistrados judiciais.

No acórdão da semana passada do TRL, a que o ECO teve acesso, os juízes dizem que houve uma “violação do dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso pelos tribunais superiores”, previsto no artigo 4º da Lei de Organização do Sistema Judiciário. Esta conclusão está presente na decisão da semana passada, em que o Tribunal da Relação de Lisboa deu razão a uma parte do recurso apresentado pelo antigo ministro da Economia Manuel Pinho no âmbito do processo EDP. Assim, o arguido vai voltar a receber a reforma de 26 mil euros líquidos mensais.

Foram ainda devolvidos ao antigo ministro da economia diversos bens, que tinham sido apreendidos durante uma busca domiciliária, como dois quadros, duas fotografias, um conjunto de garrafas de vinho e uma mesa de flipper. O arresto do valor total da pensão bem como dos bens tinha sido decretado pelo juiz Carlos Alexandre no final do ano passado.

Juiz Carlos AlexandreJOÃO RELVAS/LUSA © 2018 LUSA

Resta agora saber se o CSM vai exercer o seu poder disciplinar da mesma forma que fez com Ivo Rosa, que tem neste momento dois processos disciplinares contra ele, um deles precisamente por ter alegadamente violado o dever de acatamento de decisões de tribunais superiores. Processos esses que o impediram, até agora, de subir a juiz desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa. Ao contrário de Carlos Alexandre – até aqui também juiz de instrução criminal no Ticão, tal como Ivo Rosa – que iniciará funções na Relação, já em setembro deste ano.

Processos disciplinares de Ivo Rosa

Em março, o CSM adiantou que a decisão relativa a um dos processos disciplinares instaurados ao juiz Ivo Rosa deverá ser conhecida até setembro “no máximo”. Num briefing aos jornalistas relativo a um balanço de atividade do CSM, que decorreu na sede deste órgão de gestão e disciplina dos juízes, em Lisboa, o presidente do conselho, Henrique Araújo, disse que “até setembro, no máximo” será conhecida a decisão relativa ao processo disciplinar em fase mais avançada de avaliação pelo CSM instaurado ao juiz Ivo Rosa, que tem dois processos disciplinares a correr neste órgão. As decisões para um e outro processo deverão ser conhecidas “em momentos distintos”, acrescentou Henrique Araújo.

No final de junho de 2022, o CSM concluiu o inquérito que deu origem ao processo disciplinar a Ivo Rosa, tendo disso dado conhecimento ao então juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC). O procedimento disciplinar tem na base o apuramento de factos que poderão configurar “infração do dever de obediência à Constituição e à lei” e “interferência ilegítima na atividade jurisdicional de outro magistrado”.

Ivo Rosa, juiz de instrução do TCICMARIO CRUZ/POOL/LUSA

Em causa estão acórdãos da Relação de Lisboa que revogaram e criticaram a legalidade de decisões tomadas por Ivo Rosa que interferiam e anulavam decisões jurisdicionais de outros magistrados, designadamente Carlos Alexandre, outro dos juízes do TCIC.

Entretanto, Ivo Rosa ficou colocado no Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), no âmbito do movimento judicial ordinário para os Tribunais da Relação, mas a vaga para a promoção do magistrado está dependente deste processo disciplinar e da eventual sanção.

Promoção de Carlos Alexandre a desembargador e candidatura a Procurador Europeu

Depois de, em abril deste ano, ter sido decidida a promoção a desembargador de Carlos Alexandre, que deixará o famoso Ticão no verão, soube-se há duas semanas que o juiz é também um dos candidatos à corrida do cargo de Procurador Europeu. Outro dos candidatos para substituir José Guerra no cargo europeu é o procurador José Ranito, que foi responsável pela acusação à queda do BES.

O processo de candidatura a procurador europeu reunia a 19 de abril apenas dois candidatos, um por cada conselho: o procurador José Ranito, pelo Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), e o juiz Ivo Rosa, pelo CSM. Mas Ivo Rosa acabou por desistir.

O magistrado justificou que foi nomeado como juiz do coletivo para um caso que decorre no Tribunal Penal Internacional, em Haia, e que deverá estender-se até 2024. Assim, caso fosse eleito estaria impedido de iniciar a função de procurador europeu já a partir de julho deste ano.

No dia 22 de maio, o Conselho Superior da Magistratura anunciou que, afinal, não é só Carlos Alexandre o candidato ao cargo de Procurador Europeu. O órgão que tutela os magistrados, fez convite a toda a magistratura. E os candidatos acabaram por ser quatro: não só ao juiz que até aqui esteve no chamado Ticão, mas também a juíza Catarina Vasco Pires, Filipe Vilarinho Marques e Vítor Leitão Ribeiro. Desta feita, os candidatos a este cargo, que será ocupado por José Guerra até julho, são cinco: estes quatro juízes e apenas um procurador, José Ranito, depois do ‘finca pé’ da PGR ao recusar a selecionar mais candidatos.

Em que processo Manuel Pinho é arguido?

O caso EDP está relacionado com os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC) no qual os antigos gestores António Mexia e Manso Neto são suspeitos de corrupção e participação económica em negócio para a manutenção do contrato das rendas excessivas, no qual, segundo o Ministério Público, terão corrompido o ex-ministro da Economia Manuel Pinho e o ex-secretário de Estado da Energia Artur Trindade.

A decisão instrutória pronunciou Manuel Pinho, constituído arguido no verão de 2017, por um crime de corrupção passiva para ato ilícito, outro de corrupção passiva, um crime de branqueamento de capitais e um crime de fraude fiscal. Segundo a investigação do MP, o ex-governante teria um pacto corruptivo com o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES), através do qual teria recebido cerca de cinco milhões de euros para, alegadamente, favorecer os interesses do BES (que era então acionista da EDP), onde havia trabalhado antes de entrar para o governo.

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