“Já te disse, falaremos disso mais tarde!”. Escutas que envolvem Costa foram anexadas ao processo como prova

O Ministério Público determinou que existem mais de 20 escutas telefónicas que ligam Costa aos factos sob investigação e essas "ligações" são um dos principais meios de prova.

O Ministério Público determinou que existem mais de 20 escutas telefónicas que ligam António Costa aos factos sob investigação e essas “ligações” são um dos principais meios de prova, avança o Observador. Estas escutas, que ocorreram entre 11 de novembro de 2020 e este ano, não foram realizadas diretamente ao telefone do primeiro-ministro, mas resultam de conhecimento fortuito uma vez que Costa falou com sujeitos sob escuta.

E são agora essas escutas que fazem parte da certidão extraída pelo DCIAP e validada pela PGR e que foi terça-feira enviada para o Supremo Tribunal de Justiça, para que António Costa seja investigado em processo autónomo.

Segundo explica o Observador, as chamadas foram feitas entre Costa e os principais arguidos do caso, como Vítor Escária, Diogo Larceda Machado, João Galamba e João Matos Fernandes. Com o ex-ministro do Ambiente, o primeiro-ministro terá conversado sobre as declarações de impacte ambiental, um dos pontos em investigação, tanto enquanto Matos Fernandes pertencia ao Governo e depois disso.

António Costa afirmou desconhecer as escutas, tendo sublinhado ao Observador que não cometa “processos judiciais, muito menos que desconheço em absoluto”.

Ainda assim, para os investigadores do caso, as conversas entre Costa e Matos Fernandes indiciam que houve fugas de informação. Isto porque os visados combinaram, em momentos diferentes, encontros para falar sobre procedimentos administrativos relacionados com a exploração do lítio e do hidrogénio. Ou seja, não abordaram estes temas via telefone. “Já te disse, falaremos disso mais tarde!“, chegou a exaltar-se uma vez Costa perante a insistência de Matos Fernandes.

Segundo o Observador, existem duas escutas de conversas do primeiro-ministro que foram preservadas, por não terem relevância para a investigação. Um delas com Marcelo Rebelo de Sousa e outra com Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República.

O caso que acabou a resultar na demissão de António Costa

Já passava das 9 horas quando, na terça-feira, surgiam os primeiros alertas das buscas à residência oficial do primeiro-ministro na comunicação social, e de diversas buscas e detenções de ex e atuais figuras próximas do Governo, levadas a cabo pela PSP. Em causa estão negócios relacionados com a área de energia. O que provocou um “terramoto” político em Portugal e culminou no pedido de demissão do primeiro-ministro, António Costa.

As suspeitas do Ministério Público (MP) neste processo recaem sobre atuais membros do Governo – como João Galamba -, mas também sobre antigos governantes e não só. Em causa estarão alegadas “irregularidades” em investimentos em projetos de exploração do lítio, hidrogénio e da construção de um data center, que podem ter superado os 1.000 milhões de euros.

Existem três frentes sobre as quais incidem esta investigação: duas concessões de lítio – um das minas do Romano, em Montalegre, e outra na mina do Barroso, em Boticas; um projeto de hidrogénio, em Sines; e um projeto de centro de dados da Start Campus em Sines.

Reuniões informais, almoços e jantares, foram alguns dos encontros que despertaram a atenção do Ministério Público. Os protagonistas? Esses são vários, mas entre os principais e únicos detidos, até agora, estão Diogo Lacerda Machado, um grande amigo de Costa; Vítor Escária, chefe de gabinete do primeiro-ministro; Nuno Mascarenhas, presidente da Câmara de Sines; Afonso Salema e Rui de Oliveira Neves, respetivamente, CEO e administrador da Start Campus. João Galamba, ministro das Infraestruturas, não foi detido mas é arguido no processo, tal como João Tiago Silveira, advogado da Morais Leitão.

Para o MP, entre Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária existiram diversas “reuniões suspeitas” na residência oficial do primeiro-ministro. Mas não só. Segundo o mandado de detenção, a que o ECO teve acesso, estas reuniões, ou “encontros”, também eram marcados nos escritórios da Start Campus, em Lisboa, ou em momentos esporádicos, como jantares e almoços, que eram pagos por Afonso Salema e/ou Rui de Oliveira Neves, da Start Campus e sócio da Morais Leitão. Nestes encontros também estavam presentes Galamba e Nuno Lacasta, presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), que, segundo o DCIAP, “almoçavam e jantavam sem pagar nada”.

A Start Campus, da qual fazem parte da administração dois dos visados e detidos no processo, tem sede em Sines e dedica-se a energias renováveis e à construção de ecossistemas verdes, tais como a exploração de hidrogénio. A empresa está a finalizar a construção do primeiro de nove edifícios alimentados a 100% por energias renováveis a instalar até 2028 em Sines. A Start Campus é controlada pelos fundos Davidson Kempner e Pioneer Point Partners, onde neste último Diogo Lacerda Machado é consultor.

Ou seja, o MP acredita que o amigo de Costa foi contratado pelos investidores da Start Campus e depois diretamente pela empresa, através do CEO Afonso Salema, para “aproveitar” a relação que tinha como o primeiro-ministro e com Vítor Escária. O objetivo era pressionar o Governo e entidades como o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas e o autarca de Sines para acelerar e dar seguimento a assuntos de interesse da Start Campus, como o megaprojeto para a construção de um grande centro de armazenamento de dados digitais.

O projeto Sines 4.0 é um dos quatro negócios ligados ao setor da energia investigados neste inquérito. Ligado a ele está a exploração das duas minas de lítio e o projeto de hidrogénio em Sines.

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