Só 16% dos contratos assinados no âmbito da JMJ têm utilização futura

Entidade liderada por José Tavares recomenda ainda ao Governo e à Assembleia da República que, em situações futuras, não aprovem regimes especiais de contratação que penalizem a concorrência.

Dos 432 contratos assinados para a realização da Jornada Mundial da Juventude apenas 71 “consubstanciam investimentos, permitindo utilizações futuras para outras finalidades”, conclui uma auditoria do Tribunal de Contas (TdC). Contas feitas, estes contratos ascendem a cerca de 34 milhões de euros e representam 16,4% do total dos contratos assinados por entidades públicas e privadas para acolher o evento na capital. A entidade liderada por José Tavares recomenda ainda ao Governo e à Assembleia da República que, em situações futuras, não aprovem regimes especiais de contratação que penalizem a concorrência.

Em causa está o relatório intitulado “Contratos celebrados no âmbito da Jornada Mundial da Juventude 2023”, divulgado esta sexta-feira e que analisa os contratos que “ficaram sujeitos a fiscalização concomitante e dispensados de fiscalização prévia” pelo Tribunal de Contas.

Para o efeito, foram reportados ao tribunal “432 contratos, respetivas modificações objetivas“, cujo montante global ascende a cerca de 64,13 milhões de euros. Destes, apenas “cerca de 71 representam investimentos para o futuro, na medida em que se traduziram na execução de obras de caráter permanente e na aquisição de equipamentos ou bens que permitem posteriores utilizações” e cujo valor contratual corresponde a 34.063.546,85 euros.

Contas feitas estes 71 contratos correspondem a aproximadamente 16,4% e foram assinados pela Câmara Municipal de Lisboa, Câmara Municipal de Oeiras, Câmara de Loures, EMEL, entre outras entidades. Já se se analisar o montante global destes contratos, o valor corresponde a quase metade dos cerca de 64,13 milhões de euros previstos no total dos 432 contratos assinados.

Entre os investimentos futuros, o TdC destaca, por exemplo, “a construção/adaptação de infraestruturas, a recuperação e a requalificação de espaços e a valorização ambiental e de fruição pública da zona ribeirinha”, que irá permitir criar o “futuro Parque Verde” ou as obras feitas em “instalações escolares e desportivas”.

O relatório da entidade lidera por José Tavares nota ainda que para fiscalização concomitante “foram comunicados 403 contratos, no valor global de 30.776.328,18 euros”. Além disso, o tribunal nota que “o município de Lisboa reportou o maior número de contratos (102) e a SGPCM [Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros] o maior montante contratado (5.065.528,33 euros).

Por tipo de procedimento escolhido, o tribunal sinaliza ainda que “prevaleceu o ajuste direto, com 55,05% do valor adjudicado”. Já se a análise tiver em conta também os contratos assinados por consulta prévia e ajuste direto simplificado a fasquia aumenta para 63,46%.

TdC critica regime especial de contratação criado pelo Governo

No que diz respeito aos três contratos auditados, o custo final do altar-palco acabou por ficar mais barato do que o previsto. “O custo final da empreitada foi de 2.959.128,05€, representando um decréscimo de 0,70% do preço contratual modificado e 30,21% do valor contratado inicialmente“, lê-se no documento. De recordar que a construção desta infraestrutura foi inicialmente adjudicada por ajuste direto à Mota-Engil por cerca de 4,24 milhões de euros, mas o contrato acabou por ser revisto, depois de várias críticas.

Não obstante, o TdC nota que “2 dos subempreiteiros” contratados pela Mota-Engil para esta obra “não comprovaram deter a habilitação legal necessária para executar os trabalhos para os quais foram subcontratados”, pelo que entre as três recomendações que emite insta a Lisboa Ocidental, SRU-Sociedade de Reabilitação Urbana a que, “enquanto dono da obra, acautele, nos contratos de subcontratação, que os empreiteiros subcontratados dispõem das habilitações legais necessárias”.

Também o valor da preparação dos terrenos da Zona Ribeirinha da Bobadela, que foi adjudicada mediante consulta prévia à Alves Ribeiro, foi revisto em baixa: “O custo final foi de 3.937.860,47 euros, representando um decréscimo de 8,10% do valor contratado inicialmente”. Por sua vez, a cobertura do altar-palco acabou por ficar por cerca de 1,10 milhões de euros, isto é, 3,85% mais cara do que valor contratado inicialmente.

O TdC critica ainda a alteração à Lei de Execução Orçamental de 2022 e 2023 que permitiu várias exceções às regras da contratação pública nas despesas relacionadas com a JMJ, referindo que “um volume significativo de dinheiro público foi subtraído à concorrência“, uma vez que se não tivessem sido aprovadas “cada um destes contratos teria que ter sido precedido de concurso público ou limitado por prévia qualificação”.

“Tendo em conta que a realização da JMJ2023 em Lisboa foi anunciada pelo Vaticano em 27.01.2019, não são inteiramente razoáveis as razões invocadas naquele regime especial permissivo para o ajuste direto“, acrescenta o tribunal, que recomenda ainda ao Governo e à Assembleia da República que em futuras situações semelhantes “diligenciem atempadamente” a sua organização e não aprovem “regimes especiais que derroguem os procedimentos que salvaguardam a concorrência”.

Não obstante, e dado que “passou a existir uma situação de urgência, o legislador poderia ter optado por um regime menos restritivo da concorrência, por exemplo, poderia ter optado pela consulta prévia com convite a, pelo menos, 5 entidades”, dado que apesar de não ser “um procedimento concorrencial, sempre permitiria a obtenção de mais propostas para escolha da melhor e assim também ficaria melhor assegurado o interesse público”.

Por último, o organismo recomenda ainda às Câmaras Municipais de Lisboa e Loures e à Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros (SGPCM) “que, quando interpelados pelo Tribunal de Contas, remetam a documentação/contratos, respondam com rigor e remetam todos os elementos solicitados”, acusando estas entidades de ocultarem 17 contratos — dois quais 14 da autarquia liderada por Carlos Moedas, 2 do município liderado por Ricardo Leão e um da SGPCM — num montante global de 972.204,94 euros, isto apesar de as respetivas entidades os terem publicado no Portal Base.

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